Projeto de lei de iniciativa popular. A iniciativa popular, o plebiscito e o referendo são instrumentos previstos na Constituição Federal de 88 (CF/88) para possibilitar a participação direta do cidadão nos rumos do país (democracia direta).
Neste artigo vou me ater apenas à iniciativa popular, que consiste na apresentação de projeto de lei formulado e apoiado pela população à Câmara dos Deputados.
O projeto deve ser subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional. Distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles (CF, art. 61, § 2.º, e Lei 9.709/1998, art. 13).
Normalmente, ONGS, associações e movimentos populares encabeçam a discussão em torno de um tema. Elas se encarregam de colher as assinaturas necessárias e tocam o restante do procedimento até a entrega do projeto à Câmara.
O projeto de lei de iniciativa popular deve voltar-se a um só assunto. Uma vez protocolado na Câmara, não poderá ser rejeitado por vício de forma. A própria Câmara dos Deputados providenciará a correção de eventuais impropriedades de técnica legislativa ou de redação (Lei 9.709/1998, art. 13, §§ 1.º e 2.º).
Alguns exemplos exitosos de projeto de lei de iniciativa popular: a Lei Complementar 135/2010, também conhecida como Lei da Ficha Limpa (coletou mais 1.600.000 assinaturas em todo o país); a Lei 11.124/2005, que instituiu o Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social; a Lei 9.840/1999 de combate à compra de votos; e a Lei 8.930/ 1994, que alterou a lei dos crimes hediondos (caso Daniella Perez, atriz da rede Globo de Televisão, brutalmente assassinada).
Caminho do projeto de lei de iniciativa popular
Não é tranquilo o caminho pelo qual o projeto de lei de iniciativa popular deve passar. Além de todos os requisitos já citados ligados ao quantitativo de assinaturas e à sua distribuição em todo o território nacional, outro problema deve ser enfrentado.
Ao chegar na Câmara dos Deputados o projeto segue o curso normal de qualquer outro projeto de lei. Mesmo sendo um projeto de lei que carrega uma qualidade especial, a de ser oriunda da vontade direta do povo e não da vontade indireta, como as que são confeccionadas pelos parlamentares.
Ao final deste artigo, apresente as disposições do regimento interno da Câmara dos Deputados que regula a iniciativa popular de projetos de lei.
Esse caminho normal faz com que esses projetos passem muito tempo tramitando até a sua sanção o que acaba por descaracterizar o instituto da iniciativa popular que, normalmente, se manifesta quando há urgência na resolução de uma questão não enfrentada pelo Legislativo.
Tomemos como exemplo, a lei 11124 de 2005, acima citada, que tramitou na Câmara dos Deputados por 13 (treze) anos.
A iniciativa popular de fato clama por uma revisão para se adaptar às novas tecnologias ligadas à internet e, visando à garantia de que o projeto terá uma atenção especial dos parlamentares, uma vez que é fruto da mobilização de parcela considerável dos cidadãos brasileiros.
Projeto de lei de iniciativa popular e a PEC 8/2016
Visando a estabelecer um tratamento especial ao projeto de lei de iniciativa popular, tramita no Senado Federal a PEC 8/2016. Esta proposta de emenda à Constituição tem por objetivo aplicar aos projetos de lei de iniciativa popular o célere rito de tramitação das medidas provisórias.
A PEC 8/2016 acrescentaria o §3º ao art. 61 da CF/88 e teria a seguinte redação:
3º. Se o projeto de lei de iniciativa popular não for apreciado em até quarenta e cinco dias contados de sua apresentação ao Congresso Nacional, entrará em regime de urgência, subsequentemente, em cada uma das Casas do Congresso Nacional, ficando sobrestadas, até que se ultime a votação, todas as demais deliberações legislativas da Casa em que estiver tramitando, com exceção daquelas que tenham prazo constitucional determinado.
Na prática, caso a PEC seja promulgada, o Congresso seria obrigado a apreciar o projeto imediatamente e, caso não o faça no prazo de até 45 dias, não poderia analisar nenhum outro projeto até que se finalize a sua votação.
A proposta é muito interessante e visa garantir que o verdadeiro detentor do Poder tenha garantida a efetividade de um dos mais importantes instrumentos da democracia direta previstos na CF/88.
Art. 1º.(…)
Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. (grifo nosso)
O Senador Reguffe, do Distrito Federal, na justificativa da PEC 8/2016, muito bem salienta que “é insustentável que o titular de todo o Poder em nossa República – o povo brasileiro – tenha menos prerrogativas que o seu representante, no caso, o Presidente da República”.
O Senador faz referência ao fato de que as medidas provisórias, emanados pelo Presidente da República, caso não apreciadas em 45 dias, possuem força para trancar a pauta de discussões do Congresso. Enquanto não apreciadas o Congresso não pode analisar outras medidas.
Já os projetos de lei de iniciativa popular ficam à mercê dos interesses político-partidários dos parlamentares no poder.
Projeto de lei de iniciativa popular e a PLS 267/2016
A lei 9709/98 regulamenta o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular. Esta lei dispõe acerca dos conceitos, requisitos e procedimentos desses institutos.
O PLS 267/2016 visa alterar a referida norma, com o intuito de desburocratizar o procedimento referente ao projeto de lei de iniciativa popular.
Visa a possibilitar a utilização da internet para coleta de assinaturas que serão validadas pela justiça eleitoral. Prevê ainda, que a justiça eleitoral mantenha lista atualizada de anteprojetos de lei de iniciativa popular na internet, para que aqueles, que assim desejarem, possam assinar eletronicamente os projetos de interesse.
O referido PLS se harmoniza perfeitamente com os princípios constitucionais garantidores da participação popular.
É notória a crise de representatividade vivenciada no nosso país. Onde os cidadãos não conseguem enxergar nas ações dos seus representantes o reflexo da vontade popular, do interesse público.
Clique aqui para acessar o artigo “O Princípio da Supremacia do Interesse Público e a Crise de Representatividade”.
Nessa linha, torna-se necessário o fortalecimento dos instrumentos da democracia direta para assegurar ao cidadão a atendimento aos seus anseios, razão maior da existência do Estado.
Disposições do Regimento Interno da Câmara dos Deputados que regulam a iniciativa popular:
Art. 252. A iniciativa popular pode ser exercida pela apresentação à Câmara dos Deputados de projeto de lei subscrito por, no mínimo, um centésimo do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três milésimos dos eleitores de cada um deles, obedecidas as seguintes condições:
I – a assinatura de cada eleitor deverá ser acompanhada de seu nome completo e legível, endereço e dados identificadores de seu título eleitoral;
II – as listas de assinatura serão organizadas por Município e por Estado, Território e Distrito Federal, em formulário padronizado pela Mesa da Câmara;
III – será lícito a entidade da sociedade civil patrocinar a apresentação de projeto de lei de iniciativa popular, responsabilizando-se inclusive pela coleta das assinaturas;
IV – o projeto será instruído com documento hábil da Justiça Eleitoral quanto ao contingente de eleitores alistados em cada unidade da Federação, aceitando-se, para esse fim, os dados referentes ao ano anterior, se não disponíveis outros mais recentes;
V – o projeto será protocolizado perante a Secretaria-Geral da Mesa, que verificará se foram cumpridas as exigências constitucionais para sua apresentação;
VI – o projeto de lei de iniciativa popular terá a mesma tramitação dos demais, integrando a numeração geral das proposições;
VII – nas Comissões ou em Plenário, transformado em Comissão Geral, poderá usar da palavra para discutir o projeto de lei, pelo prazo de vinte minutos, o primeiro signatário, ou quem este tiver indicado quando da apresentação do projeto;
VIII – cada projeto de lei deverá circunscrever-se a um único assunto, podendo, caso contrário, ser desdobrado
pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania em proposições autônomas, para tramitação em separado;
IX – não se rejeitará, liminarmente, projeto de lei de iniciativa popular por vícios de linguagem, lapsos ou imperfeições de técnica legislativa, incumbindo à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania escoimá-lo dos vícios formais para sua regular tramitação;
X – a Mesa designará Deputado para exercer, em relação ao projeto de lei de iniciativa popular, os poderes ou atribuições conferidos por este Regimento ao Autor de proposição, devendo a escolha recair sobre quem tenha sido, com a sua anuência, previamente indicado com essa finalidade pelo primeiro signatário do projeto.
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O voto facultativo e a PEC 61/2016
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