Vai de Uber? Aspectos legais

Uber. Em todo o Brasil a discussão em torno da legalidade do aplicativo Uber tem se intensificado. Taxistas protestam contra a Uber alegando a sua ilegalidade. Consumidores cada dia aderem ao serviço que vem transformando a ideia de transporte privado de passageiros.

Afinal, a Uber é legal? Vejamos….

 

O que é a Uber?

A Uber é uma empresa de tecnologia que desenvolveu um aplicativo que conecta provedores e usuários de serviço de transporte privado.

Na prática, o usuário se cadastra no aplicativo. O aciona quando precisar se deslocar para algum local. O programa rastreia o motorista parceiro mais próximo e envia para o cliente a placa do carro que fará o transporte, a foto do motorista e a avaliação do motorista e veículo feita por outros usuários.

Envia ainda uma expectativa da distância do trajeto e do valor a ser cobrado.

O motorista por sua vez para se cadastrar à Uber deve possuir um carro novo ou seminovo de luxo (ar condicionado etc), entre outros requisitos. Do valor que o motorista recebe do cliente parte é repassado para a Uber.

Ao final do transporte, o cliente avalia motorista e veículo.

 

Os taxis possuem exclusividade para o serviço de transporte público individual de passageiros?

Sim. De acordo com o art. 2º da lei 12468/2011, que regulamenta a profissão de taxista:

Art. 2º – Constitui atividade privativa de taxista a utilização de a utilização de veículo automotor, próprio ou de terceiros, para o transporte público individual remunerado de passageiros, cuja capacidade será de, no máximo, 7 (sete) passageiro.

A legislação, ora em destaque, é bem clara quanto à exclusividade dos taxistas para operarem o serviço público de transporte de passageiros.

A referida lei dispõe acerca de vários requisitos que devem ser cumpridos pelos motoristas, destacando seus deveres e direitos, sobretudo, dos taxistas empregados.

 

Uber é LEGAL?

Inicialmente, é importante, classificar o serviço que a UBER oferece, para só então responder à questão proposta.

No Brasil, a lei 12587/2012 instituiu as diretrizes da política nacional de mobilidade urbana. Estabelecendo, dentro da competência da União para legislar sobre transportes (art. 22, incisos IX e XI), além de vários aspectos relacionados à temática, diversos conceitos e classificações importantes para os serviços de transportes.

O art. 3º da referida lei classifica os serviços de transporte da seguinte forma:

– Quanto ao objeto:

. De passageiros

. De cargas

– Quanto à característica do serviço

. Coletivo

. Individual

– Quanto à natureza do serviço

. Público

. Privado

Essa classificação disposta na lei é bastante relevante, à medida que permite a perfeita caracterização de determinado serviço de transporte dentro do que estabelece as diretrizes nacionais de mobilidade.

Partindo da classificação citada, é possível alocar o serviço da UBER da seguinte forma: Transporte de passageiros individual privado.

Assim, percebe-se que a legislação abarca a atividade exercida pelos motoristas parceiros da UBER.

 

Uber x Taxi – Qual o motivo do conflito?

A lei 12587/2012 regulamentou o transporte público individual, mas não o fez com relação ao transporte privado individual. O conceito foi assim estabelecido:

Art. 4º (…)

VIII – transporte público individual: serviço remunerado de transporte de passageiros aberto ao público, por intermédio de veículos de aluguel, para a realização de viagens individualizadas;

À primeira vista, neste conceito se enquadraria tanto o serviço de taxi como os do Uber. Contudo, é forçoso salientar que o serviço prestado pelo Uber não possui natureza de serviço público, vez que não possui regramento jurídico próprio de serviço público e não se reveste de essencialidade.

Neste ponto, vou até mais fundo, o próprio serviço prestado pelo taxi deixou, do ponto de vista legal (à luz da lei 12587/2012), de ser considerado serviço público e passou a ser um serviço de utilidade pública. Senão vejamos o art. 12 da lei:

Art. 12.  Os serviços de utilidade pública de transporte individual de passageiros deverão ser organizados, disciplinados e fiscalizados pelo poder público municipal, com base nos requisitos mínimos de segurança, de conforto, de higiene, de qualidade dos serviços e de fixação prévia dos valores máximos das tarifas a serem cobradas.

Art. 12-A.  O direito à exploração de serviços de táxi poderá ser outorgado a qualquer interessado que satisfaça os requisitos exigidos pelo poder público local.

1o É permitida a transferência da outorga a terceiros que atendam aos requisitos exigidos em legislação municipal.

2o Em caso de falecimento do outorgado, o direito à exploração do serviço será transferido a seus sucessores legítimos, nos termos dos arts. 1.829 e seguintes do Título II do Livro V da Parte Especial da Lei no10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil).

3o As transferências de que tratam os §§ 1oe 2o dar-se-ão pelo prazo da outorga e são condicionadas à prévia anuência do poder público municipal e ao atendimento dos requisitos fixados para a outorga.

A legislação faz expressa referência ao serviço de taxi como serviço de transporte público individual e apresenta a sua regulamentação como serviço de utilidade pública.

O que diferencia, portanto, o serviço de transporte público individual (realizado pelo taxi) do transporte privado individual (realizado pelo Uber), segundo o Professor Daniel Sarmento:

O primeiro configura serviço de utilidade pública, que, conquanto pertencente à esfera da atividade econômica “stricto sensu”, se sujeito a intensa regulamentação estatal. Enquanto o segundo é atividade econômica comum, também sujeito à regulação estatal, embora em menor intensidade.

A discussão que surge nesse cenário: De um lado os taxistas que se insurgem contra os motoristas parceiros da Uber, sob a alegação de que o serviço é de exclusividade dos taxistas.

E de outro os motoristas parceiros da Uber que querem exercer o direito à realização de uma atividade econômica não regulamentada. Com base nos princípios da livre iniciativa e da livre concorrência, garantidos constitucionalmente.

Como não há legislação que regulamente as atividade da Uber, em tese, não existe ilegalidade no seu exercício. Atualmente, tanto taxis como motoristas da Uber podem, sob o prisma legal, atuar.

Relembremos as lições básicas do princípio da legalidade aplicável à esfera privada: “O que não está proibido por lei, é permitido fazer”. (clique aqui para ler artigo completo sobre os princípios da administração pública).

 

Posicionamento dos Tribunais

No município de São Paulo foi editada lei que proibia as atividades da Uber. O texto da lei vedava a utilização de carros particulares para transporte remunerado.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) declarou inconstitucional a lei municipal 16279/2015, por entender que lei contrariava o livre exercício de atividade econômica, a livre concorrência e o direito de escolha do consumidor, corolários da livre iniciativa.

Noutra linha, o município estaria invadindo competência da União para legislar acerca de transporte, conforme mencionado anteriormente.

O Supremo Tribunal Federal (STF), recentemente, NEGOU pedido liminar em que se discutia a decisão do Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB) que suspendeu lei municipal da capital João Pessoa que vedava o transporte individual de passageiros que não fosse realizado por taxi.

Nota-se uma clara tendência dos tribunais pátrios ao entendimento pela inconstitucionalidade de leis municipais ou estaduais que proíbam as atividades da Uber. É necessário levar em conta que o próprio marco civil da internet também alberga as suas atividades.

 

Considerações Finais

Para amenizar tantos conflitos entre Uber e Taxi é necessária urgentemente a regulamentação do transporte privado individual de passageiros.

Igualmente importante que os nossos legisladores busquem a satisfação do que é interesse público e não apenas interesse de classes específicas.

O Ministério Público do Trabalho tem participado de várias discussões neste sentido e até montou grupo para analisar se existe vínculo de emprego entre a Uber e seus motoristas parceiros.

Aguardemos a regulamentação, enquanto isso. Vai de taxi? Vai de Uber? O consumidor vai escolher o que melhor lhe atende. Tudo legal.

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Direito à vida e à saúde

Breves considerações acerca do atendimento médico de urgência

Não há uma hierarquia definida, do ponto de vista constitucional, dos direitos fundamentais do cidadão. Contudo, é inegável que o direito à vida merece especial atenção e destaque. Afinal, é através desse direito que será possível ao cidadão usufruir os demais, como a liberdade.

Sem a vida não somos nada.

Segundo a doutrina, o direito à vida comporta duas acepções: negativa e positiva.

Na acepção negativa, o direito à vida constitui-se em um direito de defesa, que impede/restringe a intervenção estatal e de outros particulares na existência física da pessoa.

A proibição da pena de morte, prevista no art. 5º, inciso XLVII é um nítido exemplo dessa visão negativa do direito à vida.

Na acepção positiva, há uma relação direta entre o direito à vida e a dignidade da pessoa humana. O Estado, além de não intervir na existência física do cidadão, deve garantir o gozo digno desse direito.

Deve ser assegurado ao cidadão o acesso a bens e utilidades necessários para existência digna, devendo o Estado adotar medidas positivas no sentido da sua viabilização.

Nas palavras de Alexandre de Moraes (2014), “a Constituição Federal proclama, portanto, o direito à vida, cabendo ao Estado assegurá-lo em sua dupla acepção, sendo a primeira relacionada ao direito de continuar vivo e a segunda de se ter vida digna quanto à subsistência”.

 

Direito à vida é absoluto?

Apesar de a vida humana ser concebida como valor central do ordenamento jurídico e pressuposto existencial dos demais direitos fundamentais, ainda assim, não reveste-se de caráter absoluto.

Existem no corpo constitucional e na legislação infraconstitucional hipóteses em que o direito à vida pode ser relativizado. Dos quais cito alguns:

 

– Pena de Morte:

Há vedação no ordenamento brasileiro da pena de morte que fundamenta-se na garantia do direito à vida. A exceção ocorre apenas no caso de guerra declarada (arts. 5º, XLVII, a; 84, XIX

Sempre que o Brasil enfrenta uma forte onda de violência, permeada por crimes bárbaros e cruéis volta à tona a discussão acerca da pena de morte no Brasil. Alguns autores discutem acerca da possibilidade de sua inserção no ordenamento jurídico através de Emenda à Constituição.

O que a meu ver violaria a Constituição Federal de 88, vez que o direito à vida é consagrado como direito fundamental da pessoa, e como tal, faz parte do núcleo imutável da constituição, protegido por cláusula pétrea.

 

– O aborto terapêutico e sentimental

Independentemente da teoria que se adota com relação ao início da vida. A legislação penal assegura a não criminalização desses tipos de aborto. Na verdade, trata-se de hipótese de excludente de ilicitude.

O aborto terapêutico (ou aborto necessário) é aquele em que a má-formação do feto coloca em risco a vida da gestante (Art. 128, I do Código Penal).

O aborto sentimental é aquele resultante do crime de estupro (art. 128, II do Código Penal).

Além dessas hipóteses legais, o Supremo Tribunal Federal (STF) em 2012 declarou, por maioria, a inconstitucionalidade da interpretação segundo a qual a interrupção da gravidez de feto anencéfalo seria conduta tipificada como aborto pelo Código Penal.

 

– Lei do Abate

Permite o abate de aviões considerados hostis, categoria na qual foram incluídas por decreto as aeronaves suspeitas de carregar drogas em território nacional.

Polêmicas à parte, é o art. 303, §2º do Código Brasileiro da Aeronáutica alterado pela lei 9614/98, que autoriza a medida de destruição, em nome da segurança nacional.

 

Direito à vida e à Saúde

O direito à vida em sua acepção positiva, conforme visto, deve trazer consigo a ideia de uma vida digna, devendo o Estado prestar o aparato necessário para essa garantia. Nesta senda, o direito à saúde é consequência lógica do direito à vida digna.

No Brasil a saúde, conforme dicção constitucional, é dever do Estado e direito de todos garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

O Sistema Único de Saúde (SUS) é o responsável por esta gama de serviços disponibilizados ao cidadão, independentemente da sua raça, credo, cor, idade ou condição financeira. Todos devem ser assistidos por este serviço público essencial.

No artigo “O STF e o direito à saúde: Distribuição de medicamentos de alto custo”, eu detalho um pouco mais acerca da legislação sanitária do nosso país. (Clique aqui para acessar o artigo)

 

Quem você escolhe salvar: o traficante em estado grave ou o policial levemente ferido?

Aqui temos uma pergunta sem reposta, uma vez que cada pessoa de acordo com suas convicções poderá emitir juízo de valor diferente. Não há resposta certa ou errada do ponto de vista valorativo. Cada um se manifestará de uma forma.

Entretanto, à luz da Constituição Federal a melhor pergunta seria: Quem o Estado atenderia primeiro? Pois o Estado deve salvar a todos, ao menos em tese.

Já que não posso responder à primeira pergunta, vamos à resposta dessa segunda:

O Estado, conforme visto, deve garantir o direito à vida sem distinção. Não cabe ao Estado valorar no tocante à vida. Qual vida vale mais? A do policial? A do traficante? A do rico? A do pobre? A da classe média? A de quem estudou? A de quem é analfabeto?

Qual padrão de valoração o Estado poderia utilizar?

Difícil dizer, todos os pontos de vista são aceitáveis à luz dos argumentos de seus defensores. O Estado deve se posicionar acima dessas convicções de cunho discriminatório e deve primar pela vida da pessoa (ser humano).

Como já disse anteriormente, o Estado tem o dever de salvar a todos, mas nos serviços de saúde existe SIM uma ordem para atendimento. Não é possível atender todos ao mesmo tempo.

Esta ordem de atendimento é realizada por meio da classificação de risco, que leva em conta a gravidade da situação.

 

Classificação de Risco

Não sou expert no assunto, mas já trabalhei na área de saúde e já fui atendido em serviços de pronto atendimento.

Ao chegar à clínica ou hospital de urgência/emergência, um profissional faz a triagem do paciente, e lhe entrega uma pulseira ou adesivo com a cor referente à sua classificação de risco:

protocolo-de-manchester

Vermelho: Emergência

Laranja: Muito urgente

Amarelo: Urgente

Verde: Pouco urgente

Azul: Não urgente

                (Imagem: saude.gov.br)

 

A prioridade de atendimento está aí estabelecida. O paciente mais grave, que enfrenta situação de emergência tem prioridade total de atendimento, já que há risco de morte iminente (nem mesmo passa pela triagem, vai direto para o atendimento médico).

A prioridade de atendimento diminui na mesma proporção do risco.

O atendimento ao paciente EMERGENTE deve sempre ser visto como prioridade total.

Nos serviços de saúde existe um sistema denominado vaga zero. Dependendo da gravidade do paciente, o serviço de urgência e emergência, ainda que esteja lotado, ainda que esteja sobrecarregado é obrigado a aceitar o paciente e a fornecer-lhe todo o suporte de tratamento necessário. Ainda que não tenha vaga disponível, o paciente EMERGENTE deve ser acolhido para tratamento.

O Código de Ética Médica (Resolução CFM 1931/2009) estatui no inciso I do Capítulo I, que a medicina é uma profissão a serviço da saúde do ser humano e da coletividade e será exercida sem discriminação de nenhuma natureza.

 

Quem o Estado atenderia primeiro?

Diante do exposto, o Estado deve atender primeiro o mais grave. Assegurar o direito à vida.

Não se trata de escolher entre o policial e o traficante. Entre o rico e o pobre. Entre o branco e o negro. Entre o doutor e o analfabeto. Trata-se de escolher entre o que apresenta mais risco e o que apresenta menos risco de morte.

Permitir ao Estado estabelecer distinção baseada em critérios de natureza pessoal equivaleria jogar por terra todo o ideário de garantias estabelecidos pela Carta Magna.

 

Considerações Finais

Vem ocorrendo uma inversão de valores no seio da comunidade em geral, impulsionada pelos meios de comunicação. Tal fato fica mais evidente dia-a-dia.

As instituições ligadas à segurança pública (polícias civil, militar, rodoviária etc) estão padecendo por falta de investimentos. Necessitam urgentemente de melhores condições de trabalho para enfrentamento ao crime. Seus agentes precisam ser melhor remunerados e mais valorizados.

Neste caso, salvar a Polícia é algo que deve estar na agenda dos nossos governantes para garantir o direito à vida digna dos cidadãos.

 

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O Voto Facultativo e a PEC 61/2016

Voto Facultativo. Resolvi escrever um pouco sobre o assunto após analisar a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) nº 61/2016. Esta proposta tem como objetivo tornar o voto facultativo no Brasil.

Antes de adentrarmos à questão é muito importante diferenciamos: o voto e o direito de sufrágio.

 

O que é o Direito de Sufrágio?

Sufrágio (de aprovação, apoio) é o direito subjetivo de natureza política que tem o cidadão de eleger (capacidade eleitoral ativa), ser eleito (capacidade eleitoral passiva) ou participar da organização e da atividade do Poder Estatal. Portanto, sufrágio é o direito que se exterioriza no voto, que, portanto, é a exteriorização ou materialização desse direito (sufrágio), implicando uma declaração de vontade (CERQUEIRA, 2012)

Esse conceito explicita bem o direito de sufrágio que pode ser resumido no direito que o cidadão possui de participar da vida política do Estado.

O direito de sufrágio pode ser classificado como ativo e passivo. Ativo – direito de votar e Passivo: direito a ser votado.

O voto portanto é instrumento para a efetivação do direito de sufrágio.

 

Voto Obrigatório

A Constituição Federal de 88 (CF/88) determina em seu artigo 14, §1º, inciso I, a obrigatoriedade do voto. Assim dispõe:

Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:

(….)

  • 1º O alistamento eleitoral e o voto são:

I – obrigatórios para os maiores de dezoito anos;

(….)

Estão excluídos dessa obrigatoriedade os analfabetos, os maiores de 70 anos, bem como os maiores de 16 e menores de 18 anos. Lembrando ainda que os estrangeiros e, durante o serviço militar, os conscritos não podem alistar-se.

 

O Voto Facultativo:

Voto FacultativoMuito se discute no Brasil acerca desse voto obrigatório, sobretudo porque países com democracias consolidadas possuem em seu ordenamento a previsão do voto facultativo.

Pois bem, tecnicamente, o voto no Brasil é FACULTATIVO. Apesar da disposição constitucional, conforme visto acima, ser clara e explícita no sentido da obrigatoriedade, a verdade é outra.

Vamos exemplificar: O cidadão que no dia da eleição vai até a urna e vota em branco ou nulo, exerceu o seu direito de sufrágio (sufragou), contudo, não votou. Porque, segundo parte da doutrina, o voto é a manifestação da vontade e esta deve ser tida como válida.

Neste sentido, se analisarmos a dicção da lei Eleitoral (Lei 9504/97), que leva em conta na apuração do vencedor das eleições apenas os votos válido; o voto não é obrigatório (já que a pessoa pode optar por não votar em ninguém – branco ou nulo).

Vejamos o que determina o art. 2º da Lei 9504/97:

Art. 2º Será considerado eleito o candidato a Presidente ou a Governador que obtiver a maioria absoluta de votos, não computados os em branco e os nulos.

O que é obrigatório é o comparecimento eleitoral ou a justificativa para aqueles que não sufragarem.

Importante: Essa discussão é de base teórica. Em provas e concursos a banca normalmente espera que a resposta seja: voto é obrigatório.

 

PEC 61/2016

A PEC 61/2016 tem o objetivo tornar o voto facultativo no texto constitucional. Pela proposta os parágrafos 1º e 2º do art. 14 da CF/88 passariam a vigorar com a seguinte redação:

Art. 14 (….)

  • 1º O voto é facultativo e o alistamento eleitoral obrigatório.
  • 2º Não podem se alistar como eleitores os menores de 16 anos, os estrangeiros e, durante o período de serviço militar, os conscritos.

Assim, o alistamento eleitoral continuaria a ser obrigatório, mas o voto (aí incluindo o comparecimento eleitoral) passaria a ser facultativo.

Proposta muito interessante e que reflete a realidade brasileira. Nas eleições de 2016 batemos o recorde em abstenções (pessoas que não compareceram à votação), votos brancos e nulos.

 

Não votei, como proceder?

Para aclarar um pouco a situação de quem não pôde comparecer à votação:

– Quem não comparece à eleição para votar ou apresentar justificativa (quando está fora do seu domicílio eleitoral) deve justificar o seu não comparecimento no prazo máximo de 60 dias junto à justiça eleitoral. Caso o eleitor esteja fora do país, o prazo é de 30 dias contados do seu retorno.

O Tribunal Superior Eleitoral disponibiliza em seu site formulários online para esta justificativa.

Caso a pessoa não justifique no prazo ou tenha a sua justificativa indeferida pelo juiz eleitoral, deverá arcar com uma multa, caso não queira ficar inadimplente com a justiça eleitoral.

Esta multa, em valores atualizados, pode variar de R$ 1,05 até R$ 3,51 por turno ausente.

O valor da multa pelo não comparecimento e não justificativa é irrisório, o que justifica ainda mais a PEC 61/2016. Em algumas cidades, o cidadão tem que pagar transporte coletivo para ir até o local de votação e por certo gastará mais do que gastaria pagando essa multa.

 

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Zona Azul – Pode ou não pode? Aspectos legais

Aspectos legais do estacionamento pago em via pública

Zona Azul ou Faixa Azul. Devido ao grande número de veículos que circulam nas cidades, o simples ato de estacionar em via pública tornou-se uma via crucis. Os motoristas rodam por várias ruas, por longo tempo, para terem a sorte de acharem espaço livre para estacionar.

Uma das causas dessa dificuldade em achar locais para estacionamento nas vias públicas, se deve ao fato de pessoas que trabalham e moram em regiões de maior densidade comercial e que não possuem garagens, estacionam seus carros na via e ali o deixam durante todo o dia.

Não há nenhuma ilegalidade no fato de a pessoa simplesmente estacionar o carro na via o dia inteiro. Contudo, a vaga para estacionamento em área de comércio não estaria atingindo a sua função social de forma plena. Afinal, as pessoas que precisam fazer negócios naquela área não terão onde estacionar.

A ideia da Zona Azul ou Faixa Azul ou simplesmente estacionamento pago em via pública, surgiu da necessidade de se regulamentar a permanência em vagas de alta densidade comercial, como os centros das cidade e bairros de maior concentração de comércios e repartições públicas.

 

Zona Azul é um serviço público?

Sim. Trata-se de serviço público de administração e exploração do sistema de estacionamento rotativo. Este serviço, via de regra, pode ser explorado pelo próprio Poder Público ou mediante concessão.

A concessão de serviço público é uma forma de delegação. O Poder Público, titular do serviço, entrega a uma pessoa jurídica a execução de determinado serviço. A concessão de serviços públicos está prevista no art. 175 da Constituição Federal de 88 (CF/88).

Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.

A concessão deve, obrigatoriamente, ser precedida de lei que autorize a sua instituição e procedimento licitatório na modalidade concorrência pública (procedimento mais complexo previsto na Lei 8666/93).

A lei geral que regulamenta as concessões no Brasil é 8987/95. Ela conceitua a concessão de serviço público como a delegação de sua prestação, feita pelo poder concedente, mediante licitação, na modalidade de concorrência, à pessoa jurídica ou consórcio de empresas que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco e por prazo determinado.

Observem que o Poder Público transfere apenas a execução do serviço, mantendo-se a sua titularidade. Assim, havendo, por exemplo, a inadimplência por parte da concessionária, o Poder Público poderá retomar o serviço.

 

 

A via é pública. A cobrança da taxa para estacionar é legal?

Zona AzulSim. Apesar de a rua ser um bem público, o Estado pode regulamentar a sua utilização com vistas ao interesse da coletividade. É exatamente isso que ocorre com a instituição deste serviço de administração de estacionamento rotativo.

Segundo o art. 103 do Código Civil Brasileiro:

Art. 103. O uso comum dos bens públicos pode ser gratuito ou retribuído, conforme for estabelecido legalmente pela entidade a cuja administração pertencerem. (grifo nosso)

O valor da tarifa é regulamentado pela lei que autorizou a concessão. Deve ser paga pelo usuário do serviço diretamente à concessionária (empresa exploradora da atividade).

Do valor recolhido pela concessionária, parte é repassado ao Poder Público, na forma estipulada em contrato.

 

O motorista que não paga o estacionamento rotativo pode ser multado?

Sim. A multa está prevista no Código de Trânsito Brasileiro.

Art. 181. Estacionar o veículo:

(…)

XVII – em desacordo com as condições regulamentadas especificamente pela sinalização (placa – Estacionamento Regulamentado):

Infração – grave; (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)    (Vigência)

Penalidade – multa;

Medida administrativa – remoção do veículo;

 

Quem estaciona sem pagar a taxa ou fora do que estabelecem as placas, está estacionado em desacordo com as condições regulamentadas. Pode sim levar multa.

 

IMPORTANTE: O Poder Público pode autuar e aplicar multas por conta do chamado Poder de Polícia. Tal poder é INDELEGÁVEL, ou seja, o Poder Público ao delegar o serviço de administração do estacionamento rotativo, entrega ao particular apenas a execução da atividade.

O Poder Público não pode entregar o Poder de Polícia (que abrange a competência para fiscalizar, autuar e, se for o caso, aplicar multas ou medidas administrativas). Apenas a autoridade de trânsito municipal poderá fazê-lo ou a polícia militar, caso haja convênio.

Assim, caso a empresa operadora do sistema Faixa Azul ou Zona Azul (como queiram chamar) seja a responsável por fiscalizar os veículos estacionados irregularmente estaríamos diante de uma grave ilegalidade, que acarretaria por certo a nulidade do auto de infração.

 

O Código de Trânsito Brasil estabelece os requisitos para autuação em seu art. 280, vejamos:

Art. 280. Ocorrendo infração prevista na legislação de trânsito, lavrar-se-á auto de infração, do qual constará:

I – tipificação da infração;

II – local, data e hora do cometimento da infração;

III – caracteres da placa de identificação do veículo, sua marca e espécie, e outros elementos julgados necessários à sua identificação;

IV – o prontuário do condutor, sempre que possível;

V – identificação do órgão ou entidade e da autoridade ou agente autuador ou equipamento que comprovar a infração;

VI – assinatura do infrator, sempre que possível, valendo esta como notificação do cometimento da infração.

1º (VETADO)

§ 2º A infração deverá ser comprovada por declaração da autoridade ou do agente da autoridade de trânsito, por aparelho eletrônico ou por equipamento audiovisual, reações químicas ou qualquer outro meio tecnologicamente disponível, previamente regulamentado pelo CONTRAN.

§ 3º Não sendo possível a autuação em flagrante, o agente de trânsito relatará o fato à autoridade no próprio auto de infração, informando os dados a respeito do veículo, além dos constantes nos incisos I, II e III, para o procedimento previsto no artigo seguinte.

§ 4º O agente da autoridade de trânsito competente para lavrar o auto de infração poderá ser servidor civil, estatutário ou celetista ou, ainda, policial militar designado pela autoridade de trânsito com jurisdição sobre a via no âmbito de sua competência.

 

A partir da leitura desse artigo verifica-se claramente que cabe ao agente de trânsito a fiscalização do sistema de estacionamento rotativo em via pública.

 

Considerações Finais

O estacionamento rotativo em via pública é uma importante ferramenta para as cidades em meio a um trânsito tão complicado que vemos dia-a-dia crescer. A sua instituição, se feita de forma correta, melhora a fluidez do trânsito e as condições de quem lida com suas atividades em área comercial.

O Poder Público deve estar atento para que todos os requisitos legais sejam completados. Não é demais lembrar que, como trata-se de serviço público a ser prestado por particular, o Código de Defesa do Consumidor aplica-se à relação (art. 7º da Lei 8987/95)

 

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Estado Laico – Laicidade e Governo

Estado Laico. Ultimamente temos assistido a diversas discussões, sobretudo na esfera parlamentar, acerca de divergências em torno de questões que envolvem o discurso religioso. Temos no deputado Bolsonaro, um exemplo muito claro disso.

Importante entendermos de uma vez por todas, o que significa a expressão Estado Laico? Afinal, o Brasil é ou não é um Estado Laico?

Vejamos:

 

O que é laicidade?

A laicidade impõe ao Estado uma postura não confessional frente aos diversos movimentos religiosos, respeitando e assegurando o pluralismo. Significa dizer que o Estado não professa ou adota religião alguma, contudo, tolera, respeita e resguarda o direito de todos em professar alguma religião, ou mesmo não professar. É a Constituição Federal de 88 que determina a liberdade religiosa e a neutralidade estatal.

As disposições constitucionais que garantem a liberdade de crença e de cultos, estão previstas no art. 5º, incisos VI, VII e VIII da CF/88:

Art. 5º (…)

VI – é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;

VII – é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva;

VIII – ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei;

Apesar de ser um Estado laico, o Brasil DEVE assegurar a livre manifestação das religiões em geral e também daqueles que não professam religião alguma.

A Constituição Federal de 88 faz menção a Deus em seu preâmbulo e tal situação já foi objeto de questionamento em sede de controle de constitucionalidade junto ao STF. Como pode um país que se diz leigo ou laico suscitar a proteção da divindade em seu texto?

O que deve ficar claro é que o Deus descrito no preâmbulo não se refere a uma religião específica. Trata-se, na verdade, de um reforço à laicidade estatal, nas palavras de Alexandre de Moraes.

Esta liberdade de convicção religiosa, descrita no texto constitucional, deve ser analisada da forma mais ampla possível. Garantindo e protegendo àqueles que professam sua fé, suas crenças e também aqueles que não professam.

 

 

Laicidade x Laicismo

A laicidade, conforme dito anteriormente, agrega aos direitos fundamentais do cidadão a sua liberdade de crença. Já o laicismo seria um modelo de comportamento antirreligioso, em que o Estado deve excluir, em sua totalidade, questões de cunho religioso da esfera pública.

Tal situação não ocorre no Brasil. Primeiro porque é impossível exigir uma conduta neutra dos mandatários do Poder, a frente do governo. Segundo, porque ao excluir de forma plena as questões religiosas, estaríamos privilegiando a parcela da população que não professa religião alguma em detrimento das que professam.

Observem que há uma tênue linha que separa uma situação da outra. Se de um lado as ideias baseadas apenas no sentimento religioso não podem fundamentar a atuação estatal. Em outra dimensão, a atuação totalmente afastada dessa discussão de igual forma constitui-se em critério discriminatório.

 

Estado Laico x Estado Ateu

O fato de o Brasil ser um Estado Laico não o leva a, consequentemente, ser considerado um Estado Ateu. Segundo o dicionário online Michaelis:

Ateu (adj sm) – 1 Que ou aquele que não crê em Deus; ateísta. / 2 Que ou aquele que não demonstra respeito, deferência ou reverência para com as crenças religiosas alheias; herege, ímpio.

Esta definição de Ateu não se adequa à relação existente entre Estado e Religião, estabelecida na Constituição. Nela há o reconhecimento das religiões e da sua importância no contexto da esfera individual do cidadão, que mesmo encarcerado, tem direito fundamental à sua prestação, se assim o desejar.

Um outro conceito muito difundido nos dias atuais é o Agnosticismo, segundo o dicionário online Michaelis:

Agnosticismo (sm – 1 Atitude filosófica e religiosa daqueles que afirmam que ideias metafísicas, como a existência de Deus e a imortalidade da alma, não podem ser provadas nem negadas (termo criado em 1869 por Thomas Henry Huxley (1825-1895). / 2 Qualquer doutrina que afirma a impossibilidade de se conhecer a natureza última das coisas.

Destarte, os religiosos, ateus e agnósticos encontram, de maneira isonômica, proteção às suas convicções no bojo da Constituição Federal de 88.

 

Governantes Religiosos

Estado laicoInicialmente, é importante destacar a diferença entre Estado e Governo. Estado é uno, indivisível e perene, é a estrutura que garante o bem estar de todos e se triparte em três funções: executivo, judiciário e legislativo.

Já o governo é núcleo decisório do Estado. É temporário, eleito mediante escolha popular. É quem administra a estrutura do Estado.

Mesmo o Brasil sendo um Estado laico, a cada eleição se multiplicam os candidatos originários de determinadas denominações religiosas. Neste caso, haveria ofensa à Constituição?

Conforme mencionado, é impossível exigir de uma pessoa completa neutralidade em sua atuação. É até possível exigir imparcialidade, assim como as normas processuais exigem do juiz. Mas neutralidade não, pois diz respeito à carga valorativa adquirida com a experiência de vida de cada um.

O fato de um deputado se intitular representante no congresso de eleitores de determinada religião não lhe retira a legitimidade do mandato. Pelo contrário, o direito ao sufrágio (consagrado na CF/88), dá a liberdade ao cidadão de escolher quem melhor representa seus interesses.

O fato de um governante professar uma fé ou cultuar a Deus não lhe retira o direito a ocupar cargo público. Lembremos que, antes de agente político, ele é cidadão. E, como cidadão, possui a sua liberdade de crença assegurada. Vejam que estamos diante de uma relação quase cíclica.

O que é vedado ao mandatário (seja ele membro do executivo ou legislativo) é utilizar-se de sua liberdade de crença para a perseguição ou intolerância contra aqueles que não professam a sua fé ou não professam fé.

Igualmente vedado a concessão de benefícios não previstos na CF/88 a qualquer religião. A atuação parlamentar ou executiva deve ser realizada nos exatos limites estabelecidos pela Constituição.

Noutro norte, as parcerias para consecução de atividades afins não encontram vedação constitucional. Exemplo exitoso é o método APAC para cumprimento de pena que encontra na religião um fator essencial na recuperação dos apenados.

 

Considerações Finais

Como a maioria dos direitos fundamentais, a liberdade de crença e de culto não são absolutos e devem ser exercidos em conformidade com as demais normas do nosso ordenamento. Havendo conflito entre esse direito e outro igualmente tutelado pela CF/88, a ponderação de interesses deve ser aplicada ao caso concreto.

 

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A supremacia do interesse público e a crise de representatividade

 

 

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Supremacia do Interesse Público e a crise de representatividade

A supremacia do interesse público deve estar presente nas ações estatais. É através dela que o Estado legitima ações que, apesar de interferir no direito de alguns cidadãos isoladamente considerados, refletem no atendimento à coletividade.

O problema é que as pessoas que elegemos para nos representar acabam por se desviarem do interesse maior de proteção ao que é de todos. A crise vivenciada pelo Brasil não deixa dúvidas quanto a isso.

Vejamos alguns conceitos e debates em torno dessa temática.

 

Princípio da Supremacia do Interesse Público

O princípio da supremacia do interesse público não está explicitamente previsto na Constituição Federal de 88, mas possui contornos tão importantes, que a doutrina o classifica como SUPRA princípio, ou seja, um princípio de ordem superior.

A ideia central da supremacia é a de que o interesse público deve estar à frente, guiando as atividades do Estado. O Poder Público deve perseguir a todo custo o chamado interesse público primário. Ainda que para isso seja necessário se valer de mecanismos (previstos em lei) que relativizem o direito de terceiros.

A desapropriação é um claro exemplo. Ela ocorre quando o Estado retira, de maneira forçada, a propriedade de uma pessoa, em regra, mediante indenização justa, prévia e em dinheiro.

Para a pessoa que teve o seu direito de propriedade relativizado, a desapropriação é injusta. Por outro lado, o fim maior do Estado é o interesse da coletividade, e em nome desse interesse pode assim proceder.

A supremacia do interesse público dá ao Estado, portanto, os instrumentos para garantir à coletividade a prevalência do seu interesse.

Indisponibilidade do Interesse Público

A Supremacia do Interesse Público encontra limites neste outro supra princípio, o da indisponibilidade. Devemos entender que coisa pública é algo que pertence a todos.

O gestor da coisa pública não é seu dono é apenas gestor. Os donos (todos nós) delegamos competência, através de um mandato, para que ele, em nosso nome, exerça a administração desses bens.

Assim, a legislação impõe limitações nessa atuação para que as melhores práticas sejam realizadas. Deseja adquirir bens? Deve realizar procedimento licitatório. Deseja contratar pessoal? Deve realizar concurso público. Pretende alienar bens público? Deve seguir todos os parâmetros determinados por lei. E assim por diante.

Toda a conduta do gestor público é limitada pela legislação e demais princípios. Eles dispõem de regras rígidas (burocracia administrativa) para garantir que a atuação estatal não se desvie da finalidade maior de atendimento ao interesse público.

Crise de Representatividade

A supremacia do interesse público deve ser assegurada em cada política implementada pelo Estado. O cidadão comum é protagonista de todo o processo, uma vez que é o responsável pela escolha dos gestores públicos.

O direito de sufrágio, patrimônio fundamental do cidadão, concede a possibilidade de efetiva participação na vida política do Estado. É através dele que o cidadão vota e pode ser votado.

Escolhemos, de 02 em 02 anos, em eleições diretas, as pessoas que farão parte do núcleo decisório estatal. Presidente, senadores, deputados federais e estaduais, prefeitos e vereadores. Todos, dentro de suas competências, quando eleitos, firmam o pacto de defesa dos interesses da coletividade.

Ocorre que, no Brasil, há muito assistimos um completo desvio dessa lógica. O interesse público acaba sendo confundido com o interesse político de grupos no poder.

O cidadão eleitor, salvo honrosas exceções, não consegue enxergar nas ações de seu representante, o reflexo da sua vontade, enquanto parte de uma coletividade.

E nessa toada, a classe política vê o seu prestígio desmoronar com a população em geral. Por conta dos sucessivos fracassos na administração de muitos entes federados e, principalmente, pelos escândalos de corrupção.

A cada nova fase da operação Lava Jato, por exemplo, mais se aprofundam num mar de lama, numa areia movediça que os enterram, ao menos temporariamente, das atividades parlamentares e executivas.

Esta conjuntura leva a população a buscar caminhos alternativos no momento da escolha dos candidatos. Exemplo disso é o da cidade de São Paulo que elegeu um candidato que se diz administrador e não político. Idem Belo Horizonte e tantas outras cidades.

 

Maranhão estava certo?

Quem se lembra do Deputado Waldir Maranhão que substituiu Eduardo Cunha em seu afastamento?

Em poucos dias à frente da Câmara dos Deputados expediu ato anulando todo o processo de impeachment da Presidente Dilma (diga-se de passagem em total afronta ao regimento interno da Casa).

Sem adentrar no mérito politiqueiro de sua decisão, gostaria de apontar algo muito interessante em seu fundamento. O deputado alegou que os seus companheiros parlamentares votaram motivados por conluios políticos (ordenados pelas siglas partidárias). Que não foram movidos pelas suas convicções pessoais representativas do interesse público.

Neste ponto, aplausos.

Diz os arts. 45, 46 e 78 da CF/88:

Art. 45. A Câmara dos Deputados compõe-se de representantes do povo, eleitos, pelo sistema proporcional, em cada Estado, em cada Território e no Distrito Federal.

Art. 46. O Senado Federal compõe-se de representantes dos Estados e do Distrito Federal, eleitos segundo o princípio majoritário.

Art. 78. O Presidente e o Vice-Presidente da República tomarão posse em sessão do Congresso Nacional, prestando o compromisso de manter, defender e cumprir a Constituição, observar as leis, promover o bem geral do povo brasileiro, sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil.

O interesse a ser defendido por quem ocupa cargo eletivo é o da coletividade e nenhum outro, por mais tentador que seja.

Em situação muito análoga (caso de compra de votos dos deputados), Pedro Lenza argumenta que é possível a declaração de inconstitucionalidade das decisões resultantes desses processos. Seria a inconstitucionalidade por vício de decoro parlamentar.

 

Considerações Finais

O supra princípio da Supremacia do Interesse Público não constitui-se em mera diretriz colaborativa da gestão pública. Este conceito deve ser posto em primeira ordem. A gestão da coisa pública deve ser feita no interesse da coletividade e, qualquer outro colocado à sua frente, padece de legitimidade constitucional.

Nos Estado Unidos a eleição do bilionário excêntrico Donald Trump pode até parecer estranho aos olhos de muita gente. Mas, talvez lá, a população, assim como aqui, esteja cansada dos profissionais da política (no caso Hillary). Muita lógica, mas a meu ver, escolha complicada.

A crise de representatividade brasileira se agrava mais e mais e enquanto isso, o conceito de Supremacia do Interesse Público se esvai nos ralos da impunidade e da corrupção.

 

Grande abraço a todos!

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