Vai de Uber? Aspectos legais

Uber. Em todo o Brasil a discussão em torno da legalidade do aplicativo Uber tem se intensificado. Taxistas protestam contra a Uber alegando a sua ilegalidade. Consumidores cada dia aderem ao serviço que vem transformando a ideia de transporte privado de passageiros.

Afinal, a Uber é legal? Vejamos….

 

O que é a Uber?

A Uber é uma empresa de tecnologia que desenvolveu um aplicativo que conecta provedores e usuários de serviço de transporte privado.

Na prática, o usuário se cadastra no aplicativo. O aciona quando precisar se deslocar para algum local. O programa rastreia o motorista parceiro mais próximo e envia para o cliente a placa do carro que fará o transporte, a foto do motorista e a avaliação do motorista e veículo feita por outros usuários.

Envia ainda uma expectativa da distância do trajeto e do valor a ser cobrado.

O motorista por sua vez para se cadastrar à Uber deve possuir um carro novo ou seminovo de luxo (ar condicionado etc), entre outros requisitos. Do valor que o motorista recebe do cliente parte é repassado para a Uber.

Ao final do transporte, o cliente avalia motorista e veículo.

 

Os taxis possuem exclusividade para o serviço de transporte público individual de passageiros?

Sim. De acordo com o art. 2º da lei 12468/2011, que regulamenta a profissão de taxista:

Art. 2º – Constitui atividade privativa de taxista a utilização de a utilização de veículo automotor, próprio ou de terceiros, para o transporte público individual remunerado de passageiros, cuja capacidade será de, no máximo, 7 (sete) passageiro.

A legislação, ora em destaque, é bem clara quanto à exclusividade dos taxistas para operarem o serviço público de transporte de passageiros.

A referida lei dispõe acerca de vários requisitos que devem ser cumpridos pelos motoristas, destacando seus deveres e direitos, sobretudo, dos taxistas empregados.

 

Uber é LEGAL?

Inicialmente, é importante, classificar o serviço que a UBER oferece, para só então responder à questão proposta.

No Brasil, a lei 12587/2012 instituiu as diretrizes da política nacional de mobilidade urbana. Estabelecendo, dentro da competência da União para legislar sobre transportes (art. 22, incisos IX e XI), além de vários aspectos relacionados à temática, diversos conceitos e classificações importantes para os serviços de transportes.

O art. 3º da referida lei classifica os serviços de transporte da seguinte forma:

– Quanto ao objeto:

. De passageiros

. De cargas

– Quanto à característica do serviço

. Coletivo

. Individual

– Quanto à natureza do serviço

. Público

. Privado

Essa classificação disposta na lei é bastante relevante, à medida que permite a perfeita caracterização de determinado serviço de transporte dentro do que estabelece as diretrizes nacionais de mobilidade.

Partindo da classificação citada, é possível alocar o serviço da UBER da seguinte forma: Transporte de passageiros individual privado.

Assim, percebe-se que a legislação abarca a atividade exercida pelos motoristas parceiros da UBER.

 

Uber x Taxi – Qual o motivo do conflito?

A lei 12587/2012 regulamentou o transporte público individual, mas não o fez com relação ao transporte privado individual. O conceito foi assim estabelecido:

Art. 4º (…)

VIII – transporte público individual: serviço remunerado de transporte de passageiros aberto ao público, por intermédio de veículos de aluguel, para a realização de viagens individualizadas;

À primeira vista, neste conceito se enquadraria tanto o serviço de taxi como os do Uber. Contudo, é forçoso salientar que o serviço prestado pelo Uber não possui natureza de serviço público, vez que não possui regramento jurídico próprio de serviço público e não se reveste de essencialidade.

Neste ponto, vou até mais fundo, o próprio serviço prestado pelo taxi deixou, do ponto de vista legal (à luz da lei 12587/2012), de ser considerado serviço público e passou a ser um serviço de utilidade pública. Senão vejamos o art. 12 da lei:

Art. 12.  Os serviços de utilidade pública de transporte individual de passageiros deverão ser organizados, disciplinados e fiscalizados pelo poder público municipal, com base nos requisitos mínimos de segurança, de conforto, de higiene, de qualidade dos serviços e de fixação prévia dos valores máximos das tarifas a serem cobradas.

Art. 12-A.  O direito à exploração de serviços de táxi poderá ser outorgado a qualquer interessado que satisfaça os requisitos exigidos pelo poder público local.

1o É permitida a transferência da outorga a terceiros que atendam aos requisitos exigidos em legislação municipal.

2o Em caso de falecimento do outorgado, o direito à exploração do serviço será transferido a seus sucessores legítimos, nos termos dos arts. 1.829 e seguintes do Título II do Livro V da Parte Especial da Lei no10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil).

3o As transferências de que tratam os §§ 1oe 2o dar-se-ão pelo prazo da outorga e são condicionadas à prévia anuência do poder público municipal e ao atendimento dos requisitos fixados para a outorga.

A legislação faz expressa referência ao serviço de taxi como serviço de transporte público individual e apresenta a sua regulamentação como serviço de utilidade pública.

O que diferencia, portanto, o serviço de transporte público individual (realizado pelo taxi) do transporte privado individual (realizado pelo Uber), segundo o Professor Daniel Sarmento:

O primeiro configura serviço de utilidade pública, que, conquanto pertencente à esfera da atividade econômica “stricto sensu”, se sujeito a intensa regulamentação estatal. Enquanto o segundo é atividade econômica comum, também sujeito à regulação estatal, embora em menor intensidade.

A discussão que surge nesse cenário: De um lado os taxistas que se insurgem contra os motoristas parceiros da Uber, sob a alegação de que o serviço é de exclusividade dos taxistas.

E de outro os motoristas parceiros da Uber que querem exercer o direito à realização de uma atividade econômica não regulamentada. Com base nos princípios da livre iniciativa e da livre concorrência, garantidos constitucionalmente.

Como não há legislação que regulamente as atividade da Uber, em tese, não existe ilegalidade no seu exercício. Atualmente, tanto taxis como motoristas da Uber podem, sob o prisma legal, atuar.

Relembremos as lições básicas do princípio da legalidade aplicável à esfera privada: “O que não está proibido por lei, é permitido fazer”. (clique aqui para ler artigo completo sobre os princípios da administração pública).

 

Posicionamento dos Tribunais

No município de São Paulo foi editada lei que proibia as atividades da Uber. O texto da lei vedava a utilização de carros particulares para transporte remunerado.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) declarou inconstitucional a lei municipal 16279/2015, por entender que lei contrariava o livre exercício de atividade econômica, a livre concorrência e o direito de escolha do consumidor, corolários da livre iniciativa.

Noutra linha, o município estaria invadindo competência da União para legislar acerca de transporte, conforme mencionado anteriormente.

O Supremo Tribunal Federal (STF), recentemente, NEGOU pedido liminar em que se discutia a decisão do Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB) que suspendeu lei municipal da capital João Pessoa que vedava o transporte individual de passageiros que não fosse realizado por taxi.

Nota-se uma clara tendência dos tribunais pátrios ao entendimento pela inconstitucionalidade de leis municipais ou estaduais que proíbam as atividades da Uber. É necessário levar em conta que o próprio marco civil da internet também alberga as suas atividades.

 

Considerações Finais

Para amenizar tantos conflitos entre Uber e Taxi é necessária urgentemente a regulamentação do transporte privado individual de passageiros.

Igualmente importante que os nossos legisladores busquem a satisfação do que é interesse público e não apenas interesse de classes específicas.

O Ministério Público do Trabalho tem participado de várias discussões neste sentido e até montou grupo para analisar se existe vínculo de emprego entre a Uber e seus motoristas parceiros.

Aguardemos a regulamentação, enquanto isso. Vai de taxi? Vai de Uber? O consumidor vai escolher o que melhor lhe atende. Tudo legal.

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O que é privatização? (sou contra ou a favor?)

 

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Farol baixo desligado dentro da cidade resulta em multa?

A exigência do farol baixo ligado em rodovias ainda gera muitas dúvidas. Entenda de uma vez por todas em que situações o farol baixo desligado gera multa.

Normalmente publico artigos voltados predominantemente para as áreas de direito administrativo e constitucional. Porém, um dos seguidores do blog pediu que escrevesse algo com relação à aplicação de multa para condutores de veículos que estejam com farol baixo desligado.

A dúvida surge por conta de decisão judicial que inicialmente havia determinada a suspensão de aplicação de multas e logo depois outra decisão autorizou a sua aplicação. Alguns condutores realmente continuam sem saber ao certo se devem ou não ligar o farol. Outra situação é com relação às rodovias que passam pela área urbana. Nesse caso é obrigatória a utilização do farol baixo também?

Vamos à análise:

 

Alteração da Lei 9503/97 (Código de Trânsito Brasileiro)

Inicialmente, é importante frisar que o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) foi alterado pela lei 13290/2016, para tornar obrigatório o uso, nas rodovias, de farol baixo aceso durante o dia. Tal medida, segundo o CONTRAM (Conselho Nacional de Trânsito), visa a melhorar a segurança de quem trafega nas rodovias, vez que o farol baixo ajuda a identificar o veículo em uma distância consideravelmente maior do que se estivesse desligado.

Com a alteração os arts. 40 e 250 do CTB foram alterados da seguinte forma:

Art. 40. O uso de luzes em veículo obedecerá às seguintes determinações:

I – o condutor manterá acesos os faróis do veículo, utilizando luz baixa, durante a noite e durante o dia nos túneis providos de iluminação pública e nas rodovias;

(…)

Art. 250. Quando o veículo estiver em movimento:

I – deixar de manter acesa a luz baixa:

(…)

b) de dia, nos túneis providos de iluminação pública e nas rodovias;

(…)

Infração – média;

Penalidade – multa.

A referida infração de trânsito foi instituída em maio pela referida lei. Respeitada a vacatio legis, a partir do mês de julho de 2016 os órgãos de trânsito iniciaram a fiscalização.

 

Decisão suspende a aplicação das multas

A ADPVAT (Associação Nacional de Proteção Mútua aos Proprietários de Veículos Automotores) ingressou com Ação Civil Pública na Justiça Federal (Seção Judiciária do Distrito Federal) em face da UNIÃO, visando a impedir a aplicação de multas por conta do farol baixo desligado em rodovias.

Segundo a ADPVAT em rodovias que cortam o perímetro urbano das cidades, fica difícil distinguir onde é obrigatória a utilização do farol baixo e onde deixa de ser. Atestou ainda que a finalidade dessa nova infração é apenas a de arrecadação pelo Estado, o que se constitui desvio de finalidade.

O juiz deferiu a liminar.

Entretanto, a União interpôs recurso contra essa decisão e o TRF1 (Tribunal Regional da 1ª Região) publicou decisão liminar, no dia 07 de outubro de 2016, que abriu a possibilidade de que, naquelas rodovias onde a sinalização é adequada, a fiscalização e aplicação da multa seja feita normalmente.

 

Esclarecimentos Gerais

Enumerei abaixo alguns pontos de toda essa temática para esclarecer de vez o assunto:

 

1 – A lei estabelece a obrigatoriedade do farol baixo mesmo durante o dia apenas nas rodovias. Não é demais lembrar, que algumas rodovias cortam o perímetro urbano de algumas cidade e nesses trechos o farol deve permanecer ligado.

 

2 – O farol baixo deve estar ligado em todas as rodovias, sejam elas federais ou estaduais. Na verdade, no polo passivo da ação movida pelo ADPVAT constava apenas a União que, em tese, possui competência para fiscalizar e aplicar multas apenas nas rodovias federais. Assim, a fiscalização e aplicação de multas por farol baixo nas demais rodovias (como as estaduais) nunca esteve suspensa. A suspensão ocorrida no mês de setembro afetava apenas as rodovias federais.

 

3 – As rodovias que cortam o perímetro urbano de cidades devem estar devidamente identificadas, de modo a permitir ao condutor do veículo a exata noção de estar trafegando em rodovia ou via pública (rua, avenida, etc).

Em locais onde essa sinalização não é clara, o farol baixo desligado não poderá acarretar autuação e multa, com base no art. 90 do CTB.

Art. 90. Não serão aplicadas as sanções previstas neste Código por inobservância à sinalização quando esta for insuficiente ou incorreta.

Eventual aplicação de multa será passível de recurso com o fundamento exposto.

 

Exemplo:

Farol baixo multaA imagem ao lado foi retirada do Google Imagens e retrata uma situação bem comum em várias cidades do Brasil. O exemplo foi tirado da cidade de Teófilo Otoni – MG.

Percebam que ao centro está a Rodovia que corta o perímetro urbano da cidade e exatamente ao lado, separadas apenas por um pequeno canteiro, existe uma avenida.

Quem trafega ao centro na Rodovia deve estar com farol baixo ligado ainda que esteja no perímetro urbano, sob pena de multa. Quem trafega na via marginal não tem obrigatoriedade de observância quanto à regra do farol baixo por se tratar de uma avenida.

Essa é a discussão atual, em muitas localidade o motorista se perde. Não sabe se está em uma via pública (rua, avenida, etc) ou em uma rodovia. Daí a necessidade de placas de sinalização.

 

Quem tiver interesse em pesquisar mais sobre o assunto, abaixo o número dos processos para consulta:

Processo principal junto a seção judiciária do DF: 0049529-46.2016.4.01.3400

Agravo de Instrumento junto ao TRF1: 0055875-28.2016.4.01.0000/DF

 

Espero ter contribuído para sanar as dúvidas dos nossos leitores

 

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Se quiser fazer sugestão de alguma temática para um artigo, utiliza a aba “fale conosco”. Sua sugestão será muito bem-vinda.

 

Leia também:  Vai de UBER? Aspectos legais

Zona Azul – pode ou não pode? Aspectos legais

 

 

Grande abraço a todos!




O parcelamento de salários dos servidores é LEGAL?

Parcelamento de Salários. Desde que a crise econômica abalou o Brasil de maneira mais aguda, muito se tem falado a respeito do parcelamento dos vencimentos (dos salários) de servidores públicos de vários estados e municípios da federação.

Sob a alegação de dificuldade de caixa, alguns entes federados parcelam as verbas que os servidores têm direito e outros atrasam o pagamento sem maiores explicações.

O que os nossos tribunais entendem a esse respeito?

O que são vencimentos e remuneração? (parcelamento de salários)

Segundo a lei 8.112/90 (Estatuto dos servidores públicos civis da União), vencimento é a retribuição pecuniária pelo exercício de cargo público, com valor fixado em lei. Já a remuneração é o vencimento do cargo mais as vantagens pecuniárias estabelecidas em lei.

Então, na verdade, o servidor ocupante de cargo público faz jus pelo seu trabalho à remuneração, ou seja, o vencimento determinado em lei para o cargo acrescido das vantagens que, eventualmente, lhe sejam atribuídas.

Analogicamente, a remuneração corresponde ao salário do servidor público.

Toda pessoa que coloca sua mão-de-obra a serviço do Estado deve receber a sua contraprestação financeira, pois, não há que se cogitar a possibilidade de realização de serviços de maneira gratuita. Existe, inclusive, vedação legal neste sentido.

Parcelamentos e atrasos no pagamento da remuneração

Os jornais de circulação nacional citaram a situação dos servidores dos estados de Acre, Amapá, Amazonas, Goiás, Minas Gerais, Paraná, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Roraima e Sergipe e Tocantins, além do Distrito Federal. Em todos essas unidades federativas algum tipo de atraso se verificou. Há ainda vários municípios que decretaram estado de calamidade financeira e embarcam na linha do atraso ao pagamento dos servidores.

Segundo notícias veiculadas na internet, mais de um milhão de servidores estão com seus pagamentos em atraso ou parcelados.

Como os tribunais têm abordado tal situação?

Inicialmente, é importante destacar, que o salário do servidor possui natureza alimentar, ou seja, é indispensável para sua manutenção e de todos que dele dependem. Assim, não trata-se de recursos passíveis de livre e irrestrita negociação, já que garantem o mínimo existencial desses trabalhadores.

O Supremo Tribunal Federal (STF) discute essa situação em sede de pedido de Suspensão Liminar formulado pelo estado do Rio Grande do Sul. Neste caso, o Tribunal de Justiça RS (TJRS) determinou que aquele ente federado realize os pagamentos em dia, conforme determina a constituição do estado (o governo daquele estado havia iniciado processo de parcelamento de salários dos servidores).

O Supremo ao decidir o pedido liminar confirmou a decisão do TJRS, garantindo o direito dos servidores ao pagamento em dia.

Houve, em verdade, o reconhecimento judicial pela primazia no pagamento dos servidores, como tantas legislações já assim o fazem, como por exemplo, a lei 11.101/2005 (Lei de Falências e Recuperação Judicial);

Além de garantir a subsistência do servidor, outro fundamento deve ser levado em consideração. O administrador público deve pautar-se pelos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, conforme determina o art. 37 da CF/88.

Os entes públicos possuem legislação que determina prazo limite para pagamento dos salários do servidores, ultrapassado o prazo ali previsto, violado estará o princípio da legalidade.

Noutro rumo, o inciso X, do art. 7º da CF/88 e art. 37, X, CF, preveem que a remuneração dos servidores públicos somente poderá ser fixada ou alterada por lei específica.

Qualquer ato administrativo que determine parcelamento, diminuição ou aumento da remuneração sem o devido lastro legal viola a mencionada norma constitucional.

A situação de calamidade nas finanças públicas é clara e notória em todos os cantos do país. Contudo, deve-se verificar ainda, caso a caso, se há na conduta do administrador público (referente a atrasos e parcelamento de salários) alguma atitude configuradora de improbidade administrativa, prevista na Lei 8.429/92.

Meu salário foi parcelado, o que fazer?

Na hipótese de parcelamento de salários é muito importante verificar a data de pagamento determinada pela legislação do ente a que está vinculado. Caso o parcelamento seja realizado dentro dos limites legais estabelecidos não há muito o que se fazer.

Mas, por outro lado, se o parcelamento ultrapassa a data determinada pela legislação caberá o manejo de ação judicial pugnando pelo pagamento em dia.

Via de regra, os sindicatos e associações de servidores, em situações como essa, acabam por fechar acordos com os gestores no intuito de resguardarem os direitos dos servidores e ao mesmo tempo não abalarem a própria atividade do poder público, que esbarra na chamada “reserva do possível”. Em muitas situações não há como o ente público saldar as obrigações salariais por estrita falta de recursos, onde deve imperar o bom senso frente à crise e ao caos.

 

Clique aqui e leia também: A crise afeta o servidor público estável?

 

Grande abraço a todos!




O que é privatização? (Sou contra ou a favor?)

O debate acerca das privatizações voltaram à tona depois que o Presidente Michel Temer assumiu o governo, vez que algumas de suas propostas permeiam a ideia de menor presença estatal em alguns setores.

A ideia do presente artigo é apenas aclarar alguns aspectos legais relacionados à privatização, que despertam muitas dúvidas, oferecendo subsídios para que cada um possa se posicionar como melhor entender: a favor ou contra.

Caso tenha alguma dúvida sobre o assunto, deixe seu comentário, terei o maior prazer em ajudar no esclarecimento.

Grande abraço a todos…

 

O que é privatização?

Imagem de um entregador com um presente escrito serviço públicoApesar da grande divergência entre os doutrinadores quanto à específica conceituação deste termo, em linhas gerais é possível afirmar que privatizar é tornar privado. É, na verdade, o processo em que o Poder Público entrega ao particular a execução e a própria titularidade de determinada atividade. O Estado deixa de ser dono.

Um dos exemplos mais conhecidos foi a privatização da Vale do Rio Doce.

Importante destacar que privatização é diferente de concessão. Enquanto na privatização o Estado entrega a titularidade e a execução de determinada atividade, na concessão apenas a execução de determinada atividade é transferida para o particular por tempo determinado, permanecendo o Estado como legítimo titular.

Os exemplos de concessão de serviços mais conhecidos em quase todos os municípios do país, são as concessões para o transporte coletivo de passageiros, concessão para o tratamento e distribuição de água, energia elétrica, etc.

Ambos os procedimentos devem se desenrolar dentro do que a legislação determina, buscando garantir uma disputa justa entre os agentes da iniciativa privada que pretendem realizar o serviço.

 

O que são empresas estatais?

As empresas estatais são as pessoas jurídicas de direito privado que fazem parte do Estado (integram a chamada administração indireta): são as empresas públicas e sociedades de economia mista.

Entes criados pelo próprio Estado para exploração de determinada atividade. Ex: Banco do Brasil (Sociedade de Economia Mista), BNDES – Banco Nacional do Desenvolvimento (empresa pública), entre outros.

Ambas se submetem a diversos mecanismos de controle próprios dos entes públicos, como a realização de concurso para contratação de pessoal e licitação para aquisição de bens e serviços.

Para onde vai o lucro das Estatais?

Esta é uma pergunta que possui resposta bastante intrigante.

Algumas estatais, sobretudo aquelas constituídas sob a forma de sociedade anônima, ou seja, aquelas que abriram seu capital para o mercado de ações, possibilitando o investimento das pessoas em geral, costumam apresentar balanços significativamente positivos. O Banco do Brasil (que é uma sociedade de economia mista), por exemplo, somente no 2º trimestre de 2016 apresentou lucro que ultrapassa os 02 bilhões de reais; no acumulado do 1º e 2º trimestres são quase 05 bilhões de reais. Deve-se levar em consideração ainda que o resultado apresentado está abaixo das expectativas e do saldo apresentado em 2015, devido à crise econômica que o país enfrenta.

Levando-se em conta que o Estado é o principal acionista do Banco do Brasil, parte do lucro contabilizado será recolhido ao tesouro da União, de acordo com as normas estabelecidas para esta entidade.

Pois bem, agora apresento a informação que poucas pessoas conhecem, esses valores não serão utilizados, como muitos pensam, em ações de saúde, educação, segurança etc. Por força da lei 9.530/97 esses valores serão direcionados à amortização da dívida pública federal. Destaco o art. 1º da referida lei:

Art. 1º Serão destinados à amortização da dívida pública federal:

I – a receita do Tesouro Nacional decorrente do pagamento de participações e dividendos pelas entidades integrantes da Administração Pública Federal indireta, inclusive os relativos a lucros acumulados em exercícios anteriores;

Assim, havendo uma boa gestão no âmbito das estatais que reflita na apresentação de lucros e dividendos, a parte que cabe ao tesouro nacional será direcionada, como dito anteriormente, à amortização da dívida pública federal.

 

Depois de privatizadas, as empresas sofrem algum tipo de controle?

A onda de privatizações no Brasil surgiu na década de 90, sobretudo por influências dos agentes internacionais. E neste mesmo período foram criadas as chamadas Agências Reguladoras.

Estas agências nasceram basicamente para exercerem o controle e fiscalização dos investidores que participaram do processo de privatização e passaram a ocupar atividades antes exercidas pelo Estado.

As agências reguladoras foram constituídas sob a forma de autarquia com regime especial, para garantir uma atuação independente. Elas possuem várias funções como a de fiscalizar, normatizar, fomentar, etc. Com o passar do tempo ganharam novos campos de atuação e atualmente exercem controle sob diversas atividades ligadas ao interesse público.

Como exemplo, temos a ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicações), ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), entre outras.

Toda essa estrutura é necessária para garantir a qualidade e a efetiva prestação do serviço ao cidadão.

 

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Desaposentação é INCONSTITUCIONAL?

Desaposentação é o ato pelo qual o aposentado abre mão da sua aposentadoria. Mas por qual motivo, uma pessoa que já está aposentada iria querer se desaposentar, ou seja, abrir mão daquela aposentadoria?

Pergunta bastante intrigante, mas de fácil resposta.

A expectativa de vida do brasileiro tem melhorado a cada ano. Segundo os últimos dados divulgados pelo IBGE, o brasileiro possui expectativa de vida média de 75,2 anos (mulher: 78,8 anos e homem: 71,6 anos).

No Brasil as aposentadorias mais comuns no Regime Geral de Previdência Social (RGPS), o regime dos que trabalham com carteira assinada, são: aposentadoria por idade e aposentadoria por tempo de contribuição. Ambas são concedidas por ato de vontade do contribuinte. Ele solicita, o INSS analisa se os requisitos para concessão foram completados, logo após, o benefício é concedido.

Para aposentar-se por idade, o contribuinte deve ter 65 anos, se homem, ou 60, se mulher. No caso de trabalhadores rurais essa idade é diminuída em 05 anos. Além da idade, para fazer jus à aposentadoria é necessária a comprovação de, no mínimo, 180 contribuições, o que equivale a 15 anos de contribuição. Quanto maior o tempo de contribuição, maior a possibilidade de melhoria no valor do benefício.

Já na aposentadoria por tempo de contribuição, não há idade mínima para aposentar-se, basta que se comprove 35 anos de contribuição, se homem, ou 30, se mulher. Esse tempo de contribuição pode ser diminuído em alguns casos especiais como o dos professores. Neste caso, quanto maior a idade e o tempo de contribuição, maior será a possibilidade de melhoria no valor do benefício.

 

– Explicando o que é desaposentação

Para melhor compreensão vamos a um exemplo: Determinada mulher começa a trabalhar com carteira assinada aos 16 anos de idade. Quando ela alcançar 46 anos, havendo contribuído com a Previdência em todo o período, ela terá 30 anos de contribuição e, portanto, já preencherá os requisitos para aposentar-se por tempo de contribuição.

Pensemos: uma mulher aos 46 anos, via de regra, está em plena vitalidade mental e física e pode perfeitamente continuar a trabalhar.

Essa mulher que aposenta-se aos 46 anos por tempo de contribuição não terá uma aposentadoria tão boa, porque o INSS aplica uma fórmula denominada fator previdenciário, que acaba, na maioria dos casos, por diminuir a o valor do benefício quando a pessoa é muito jovem.

Então essa mulher aos 46 anos de idade, já aposentada, continua trabalhando normalmente com carteira assinada para complementar a sua renda. Lembrando que ela continuará a contribuir para a previdência social sobre os rendimentos do seu trabalho.

Ao completar 61 anos de idade, sem ter parado de contribuir, ela já preencheria, em tese, os requisitos para outra aposentadoria, a por idade. Lembra-se? 15 anos de contribuição + 60 anos de idade.

Contudo, a legislação veda duas aposentadorias no regime geral. Mas o que me diz da possibilidade dessa mulher, abrir mão da sua primeira aposentadoria (desaposentação) para buscar um benefício novo agora aos 61 anos. Certamente a sua aposentadoria poderia melhorar o valor, já que agora ela está com mais idade e mais tempo de contribuição.

Isto é desaposentação, abrir mão de um primeiro benefício para a concessão de um novo benefício em melhores condições.

 

– A legislação infraconstitucional e a desaposentação.

Não há no ordenamento pátrio legislação que autorize a chamada desaposentação. Na verdade, na linha contrária existe dispositivo no decreto 3048/99 (Regulamento da Previdência Social) que determina que as aposentadorias por idade, tempo de contribuição e especial concedidas pela previdência social são irreversíveis e irrenunciáveis (art. 181-B). Assim, restaria inviabilizada a desaposentação, vez que é impossível a renúncia ao benefício.

Contudo, os defensores da desaposentação argumentaram que decreto não pode inovar no ordenamento, e se a lei ordinária não proibiu a renúncia, o decreto não poderia fazê-lo. Lado outro, a desaposentação não seria uma simples renúncia ao benefício, seria uma renúncia para concessão de outro, logo, a pessoa não ficaria descoberta.

Recentemente, em 2015, em meio a grande turbulência política, houve uma tentativa para regulamentação da desaposentação. O senado fez a proposta no bojo do projeto que culminou com a sanção da Lei 13183/2015. Entretanto, a presidenta Dilma vetou o art. 6º do referido projeto, que tratava exatamente dos contornos da desaposentação.

Como o veto não foi derrubado pelo Congresso Nacional, a desaposentação continuou sem um referencial legislativo para sua concessão.

 

– O entendimento dos tribunais

Posições em várias linhas foram verificadas pelos tribunais em todo o país. Alguns pela concessão outros pela impossibilidade. Mas outra discussão surgiu nesse caminho.

Havendo a possibilidade da desaposentação, o aposentado seria obrigado a devolver os valores já recebidos referentes ao primeiro benefício?

No ano de 2013, em Recurso Especial julgado no regime dos Recursos Repetitivos, o STJ firmou entendimento no sentido de ser desnecessária a devolução dos proventos recebidos; Firmou-se naquela oportunidade o entendimento de que os benefícios previdenciários são direitos patrimoniais disponíveis e, portanto, suscetíveis de desistência pelos seus titulares, não sendo necessária a devolução dos valores recebidos.

Na origem, o Tribunal havia concedido a desaposentação, mas a condicionou à devolução dos valores recebidos.

 

– A decisão do STF

desaposentaçãoA discussão da desaposentação chegou ao STF e, a partir do reconhecimento da repercussão geral do tema, paralisou milhares de processos em todo o país, para que a Suprema Corte emanasse a sua decisão definitiva sobre o caso.

No julgamento, entre tantas ponderações contrárias e favoráveis, prevaleceu a tese da IMPOSSIBILIDADE da desaposentação, tendo em vista que não existe lei que a regulamente.

A tese fixada foi a seguinte: “No âmbito do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), somente lei pode criar benefícios e vantagens previdenciárias, não havendo, por ora, previsão legal do direito à ‘desaposentação’, sendo constitucional a regra do artigo 18, parágrafo 2º, da Lei 8.213/1991”.

A tese fixada servirá de parâmetro para mais de 68 mil processos sobre o tema que estão sobrestados (suspensos) nos demais tribunais.

Agora todos esses processos receberão os efeitos da decisão do STF pela impossibilidade da Desaposentação.

Não restou, portanto, declarada a inconstitucionalidade da desaposentação, mas sim a sua inviabilidade pela ausência de legislação.

 

– O aposentado que continua trabalhando e contribuindo para a Previdência

Lembra-se da moça do início deste artigo que aposentou-se por tempo de contribuição aos 46 anos e continuou trabalhando?

Pois bem, o que acontece com essas contribuições que ela fez durante os outros 15 anos da vida dela? Afinal, no nosso exemplo, ela já está com 61 anos de idade e continua contribuindo para a previdência sobre seu rendimento laboral.

Neste caso é necessário compreender a sistemática adotada pela previdência pública no Brasil, que adota o chamado sistema de repartição simples. O que isso significa?

A contribuição realizada à previdência por determinada pessoa não serve para formar um fundo individual para sua aposentadoria, pelo contrário, esse valor compõe um fundo único que faz frente a todos os benefícios concedidos pelo Sistema. É, em verdade, um pacto de solidariedade, onde uma geração contribui para a outra.

Não há aqui ilegalidade ou inconstitucionalidade referente aos valores de contribuição por quem já está aposentado (esta tese já foi enfrentada pelo STF), por conta desse princípio da solidariedade.

Quem já está aposentado e continua trabalhando e, portanto, contribuindo para a previdência tem direito apenas à ao salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado. Essa é determinação do art. 18, §2º da Lei 8213/91, que teve a sua constitucionalidade reafirmada pelo STF.

 

Espero que tenha sido possível a todos a compreensão do tema.

 

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Legalização do Aborto e o STF

Legalização do aborto. Este é um tema sempre atual no nosso ordenamento. As divergências entre os que defendem a legalização do aborto e os que apoiam a sua criminalização crescem a cada dia.

Os que defendem a legalização, o fazem apoiados nos direitos da mulher, na igualdade de gênero entre outros argumentos. Os contrários, se apoiam na garantia do direito à vida, constitucionalmente protegido, se referindo especificamente aos direitos do ser em formação.

Recentemente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) deu fôlego novo às discussões em torno da legalização do aborto. E a pergunta que agora paira no ar: Depois desse julgamento realizado pelo STF, o aborto continua sendo crime?

Vamos à análise da questão:

 

Aborto

 

Segundo a doutrina (Bulos, 2014), “Aborto é a interrupção da gravidez antes do seu termo normal, com ou sem expulsão do feto, espontâneo ou provocado”.

A prática do aborto no Brasil constitui crime. Mesmo que seja praticado pela própria gestante ou com o seu consentimento existe previsão legal do crime.

A interrupção da gravidez também acarreta a interrupção da vida. É nessa ideia que o legislador buscou fundamento para tipificação desse ilícito penal.

A criminalização do aborto tem por pressuposto a proteção do direito à vida, consagrado pela Constituição Federal de 88 (CF 88). Tal direito é também reconhecido ao feto ou embrião.

Mas a partir de qual momento surge a vida?

 

Teorias que explicam o surgimento da vida humana

 

São várias as teorias que explicam em que momento se dá o surgimento da vida humana, das quais destaco:

– A primeira teoria entende que a vida se inicia a partir da concepção. Tal teoria se fundamenta no Pacto de São José da Costa Rica, o qual dispõe que o direito à vida deverá ser protegido por lei e, em geral, a partir da concepção (momento em que há a fecundação do óvulo pelo espermatozoide que resulta no ovo ou zigoto).

– A segunda teoria entende que a vida se inicia a partir da nidação (momento em que o ovo ou zigoto se fixa no útero). O fundamento é de que a partir da nidação a vida se torna viável, uma vez que o embrião não pode se desenvolver fora do útero.

– A terceira teoria aborda que a formação do sistema nervoso central do ser humano deve ser levado em conta para aferição do surgimento da vida humana. Isto ocorre por volta do décimo quarto dia após a concepção.

– A quarta teoria entende que a vida humana surge quando o feto passa a ter capacidade de existir fora do ventre materno. O que ocorre entre a vigésima quarta e a vigésima sexta semanas de gestação.

 

O ordenamento brasileiro garante a inviolabilidade do direito à vida, mas não fixa em que momento essa garantia surge, isto é, em que momento há o surgimento da vida.

Alguns autores, utilizando-se analogicamente da lei 9434/97 e de resolução do Conselho Federal de Medicina, aduzem que a proteção jurídica à vida se inicia com a formação da placa neural.

Tal entendimento se baseia na ideia de que o indivíduo é considerado morto quando a atividade cerebral cessa. Assim, a contrário sensu, quando essa atividade se inicia, há o surgimento da vida.

O que justificaria a utilização da chamada “pílula do dia seguinte” sem reflexos no âmbito criminal (esse medicamento, entre outros efeitos, impede a nidação).

O STF reconheceu essa teoria no julgamento da ação de descumprimento de preceito fundamental – ADPF 54/DF, em que se discutia a legalidade do aborto de feto anencéfalo.

Na oportunidade, foi firmado o entendimento de que não constitui crime a interrupção de gravidez de feto anencéfalo, por não haver viabilidade de vida. Pois o feto anencéfalo não possui cérebro ou possibilidade de desenvolver atividade cerebral devido à má formação.

 

Legalização do Aborto pelo Mundo

 

Marcelo Novelino (2013), apresenta como o aborto é tratado em outros países:

– Na Alemanha, existe lei que proíbe o aborto sem, contudo, criminalizar a conduta da gestante, desde que sejam adotadas outras medidas para a proteção do feto. O entendimento do Tribunal Constitucional Federal da Alemanha que o direito do feto à vida não pode eliminar por completo os direitos fundamentais da gestante.

–  Na França, o aborto é tratado como questão de saúde pública. Aquele país entende que tratando dessa forma, há um menor custo para a sociedade, além de oferecer menos risco que abortos realizados clandestinamente.

– No Reino Unido, com exceção da Irlanda do Norte, o aborto é legal, porém sua prática é possível até a 24.ª semana de gestação.

– Nos Estados Unidos, a Suprema há o reconhecimento do direito da mulher à realização do aborto, mas só no primeiro trimestre da gestação.

 

Vários países pelo mundo permitem a realização do aborto, mas a maioria deles o condicionam a determinados prazos (por exemplo, realizado até o primeiro trimestre da gestação) ou motivado por situações que ofereçam riscos à saúde da gestante, má formação do feto, estupro, entre outros.

 

Legalização do Aborto – Brasil

No Brasil o aborto é crime, tipificado nos arts. 124 a 127 do código penal brasileiro. As exceções a esta regra também estão previstas na legislação penal:

Art. 128 – Não se pune o aborto praticado por médico:

Aborto necessário

I – se não há outro meio de salvar a vida da gestante;

Aborto no caso de gravidez resultante de estupro

II – se a gravidez resulta de estupro e o aborto é precedido de consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.

Muito vem se discutindo acerca do direito de escolha da mulher no momento de realização do aborto. Haveria ou não a possibilidade de respeitar os interesses da mulher com relação à continuidade ou não da gravidez?

No Brasil, não há espaço para legalização do aborto, uma vez que a própria Constituição dispôs em seu art. 5º, caput, acerca do direito à vida. E não há como se negar que o embrião ou o feto, não obstante não ser pessoa pois ainda está em formação, está vivo e deve ter esse direito preservado.

Nem mesmo Emenda Constitucional poderia proceder à legalização do aborto, tendo em vista, que o direito à vida constitui núcleo imutável da Carta Magna, protegida por cláusula pétrea.

 

Decisão do STF que descriminaliza o Aborto

 

As redes sociais trataram de disseminar a ideia de que o STF teria descriminalizado o aborto, ou seja, deixado de considerar o aborto como crime, tendo em vista a sua inconstitucionalidade.

Isso não aconteceu.

O aborto continua sendo crime. Vamos entender o que o STF decidiu:

O caso envolvia integrantes de uma clínica de aborto que teriam realizado o procedimento com o consentimento de uma gestante. Eles tiveram prisão preventiva declarada.

Logo depois o juízo competente concedeu liberdade provisória aos acusados. O MP interpôs recurso dessa decisão que foi acatado pelo Tribunal e confirmado pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça).

Os acusados impetraram Habeas Corpus junto ao STF que em decisão final não conheceu do habeas corpus por ser incabível na hipótese (porque foi utilizado como substitutivo de recurso ordinário constitucional). Contudo, resolveu conceder de ofício o habeas corpus sob dois fundamentos:

1 – Não estavam mais presentes os requisitos que legitimariam a prisão preventiva. Os acusados são primários, com bons antecedentes, têm trabalho e residência fixa, têm comparecido aos atos de instrução e cumprirão pena em regime aberto, na hipótese de condenação.

2 – A criminalização do aborto no primeiro trimestre da gestação (que era o caso), viola diversos direitos fundamentais da mulher, bem como o princípio da proporcionalidade.

 

Quanto ao primeiro fundamento invocado pelo Ministro não há muito o que comentar. Trata-se de análise feita à luz do que o art. 312 do Código de Processo Penal estatui.

O segundo ponto argumentativo merece destaque.

A análise foi feito pelo Ministro Luís Roberto Barroso que compõe a 1º Turma do STF. No entendimento dele, que foi acompanhado por outros dois ministros, “é preciso conferir interpretação conforme a Constituição aos artigos 124 a 126 do Código Penal – que tipificam o crime de aborto – para excluir do seu âmbito de incidência a interrupção voluntária da gestação efetivada no primeiro trimestre”.

Foi concedido Habeas Corpus porque haveria dúvidas, inclusive, sobre a existência de crime.

A decisão do Ministro Barroso baseou-se nos seguintes pilares:

– A criminalização do aborto antes de concluído o primeiro trimestre de gestação viola diversos direitos fundamentais da mulher, além de não observar suficientemente o princípio da proporcionalidade / Violação à autonomia da mulher / Violação do direito à integridade física e psíquica / Violação aos direitos sexuais e reprodutivos da mulher / Violação à igualdade de gênero / Discriminação social e impacto desproporcional sobre mulheres pobres / Violação ao princípio da proporcionalidade.

 

Mas por que no primeiro trimestre?

Segundo o Ministro, apoiado em alguns estudos e na prática adotada em diversos países como os Estados Unidos, até o final do primeiro trimestre o córtex cerebral ainda não foi totalmente formado.

Essa é a área que permite ao feto desenvolver sentimentos e racionalidade. Ademais, durante esse período não há qualquer potencialidade de vida fora do útero materno.

 

Considerações Finais

 

Como disse no início desse artigo, humildemente me filio à corrente doutrinária que entende ser IMPOSSÍVEL a legalização do aborto no Brasil, vez que o direito à vida é o bem maior assegurado pela Constituição. E, nesta senda, nem mesmo Emenda Constitucional teria legitimidade para sua violação.

Contudo, reconheço que há situações que acabam por relativizar essa premissa. Alguns já reconhecidos pela legislação (gestação que ameace a vida da gestante, gestação oriunda de estupro) e outros reconhecidos pelos tribunais (gestação de feto anencéfalo). Essas exceções não maculam o mandamento constitucional.

É necessário entender que a decisão do STF foi adotada sem unanimidade por uma turma do STF (o STF é composto por duas turmas) para um caso específico. Destarte, não aplica-se imediatamente ou automaticamente a outros casos, ainda que idênticos.

Ademais, o próprio Ministro esclareceu em seu voto que “ao se afirmar aqui a incompatibilidade da criminalização com a Constituição, não se está a fazer a defesa da disseminação do procedimento”.

Contudo, a referida decisão gera precedente que pode acabar sendo invocado em outros instâncias.

Se estamos diante de mais uma possibilidade de aborto a ser definitivamente reconhecido pelos tribunais, e posteriormente pela legislação, só o tempo dirá.

 

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Grande abraço a todos!