O Projeto de Lei de Iniciativa Popular clama por mudanças

Projeto de lei de iniciativa popular. A iniciativa popular, o plebiscito e o referendo são instrumentos previstos na Constituição Federal de 88 (CF/88) para possibilitar a participação direta do cidadão nos rumos do país (democracia direta).

Neste artigo vou me ater apenas à iniciativa popular, que consiste na apresentação de projeto de lei formulado e apoiado pela população à Câmara dos Deputados.

O projeto deve ser subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional. Distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles (CF, art. 61, § 2.º, e Lei 9.709/1998, art. 13).

Normalmente, ONGS, associações e movimentos populares encabeçam a discussão em torno de um tema. Elas se encarregam de colher as assinaturas necessárias e tocam o restante do procedimento até a entrega do projeto à Câmara.

O projeto de lei de iniciativa popular deve voltar-se a um só assunto. Uma vez protocolado na Câmara, não poderá ser rejeitado por vício de forma. A própria Câmara dos Deputados providenciará a correção de eventuais impropriedades de técnica legislativa ou de redação (Lei 9.709/1998, art. 13, §§ 1.º e 2.º).

Alguns exemplos exitosos de projeto de lei de iniciativa popular: a Lei Complementar 135/2010, também conhecida como Lei da Ficha Limpa (coletou mais 1.600.000 assinaturas em todo o país); a Lei 11.124/2005, que instituiu o Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social; a Lei 9.840/1999 de combate à compra de votos; e a Lei 8.930/ 1994, que alterou a lei dos crimes hediondos (caso Daniella Perez, atriz da rede Globo de Televisão, brutalmente assassinada).

 

Caminho do projeto de lei de iniciativa popular

 

Não é tranquilo o caminho pelo qual o projeto de lei de iniciativa popular deve passar. Além de todos os requisitos já citados ligados ao quantitativo de assinaturas e à sua distribuição em todo o território nacional, outro problema deve ser enfrentado.

Ao chegar na Câmara dos Deputados o projeto segue o curso normal de qualquer outro projeto de lei. Mesmo sendo um projeto de lei que carrega uma qualidade especial, a de ser oriunda da vontade direta do povo e não da vontade indireta, como as que são confeccionadas pelos parlamentares.

Ao final deste artigo, apresente as disposições do regimento interno da Câmara dos Deputados que regula a iniciativa popular de projetos de lei.

Esse caminho normal faz com que esses projetos passem muito tempo tramitando até a sua sanção o que acaba por descaracterizar o instituto da iniciativa popular que, normalmente, se manifesta quando há urgência na resolução de uma questão não enfrentada pelo Legislativo.

Tomemos como exemplo, a lei 11124 de 2005, acima citada, que tramitou na Câmara dos Deputados por 13 (treze) anos.

A iniciativa popular de fato clama por uma revisão para se adaptar às novas tecnologias ligadas à internet e, visando à garantia de que o projeto terá uma atenção especial dos parlamentares, uma vez que é fruto da mobilização de parcela considerável dos cidadãos brasileiros.

 

Projeto de lei de iniciativa popular e a PEC 8/2016

 

Visando a estabelecer um tratamento especial ao projeto de lei de iniciativa popular, tramita no Senado Federal a PEC 8/2016. Esta proposta de emenda à Constituição tem por objetivo aplicar aos projetos de lei de iniciativa popular o célere rito de tramitação das medidas provisórias.

A PEC 8/2016 acrescentaria o §3º ao art. 61 da CF/88 e teria a seguinte redação:

3º. Se o projeto de lei de iniciativa popular não for apreciado em até quarenta e cinco dias contados de sua apresentação ao Congresso Nacional, entrará em regime de urgência, subsequentemente, em cada uma das Casas do Congresso Nacional, ficando sobrestadas, até que se ultime a votação, todas as demais deliberações legislativas da Casa em que estiver tramitando, com exceção daquelas que tenham prazo constitucional determinado.

Na prática, caso a PEC seja promulgada, o Congresso seria obrigado a apreciar o projeto imediatamente e, caso não o faça no prazo de até 45 dias, não poderia analisar nenhum outro projeto até que se finalize a sua votação.

A proposta é muito interessante e visa garantir que o verdadeiro detentor do Poder tenha garantida a efetividade de um dos mais importantes instrumentos da democracia direta previstos na CF/88.

Art. 1º.(…)

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição. (grifo nosso)

O Senador Reguffe, do Distrito Federal, na justificativa da PEC 8/2016, muito bem salienta que “é insustentável que o titular de todo o Poder em nossa República – o povo brasileiro – tenha menos prerrogativas que o seu representante, no caso, o Presidente da República”.

O Senador faz referência ao fato de que as medidas provisórias, emanados pelo Presidente da República, caso não apreciadas em 45 dias, possuem força para trancar a pauta de discussões do Congresso. Enquanto não apreciadas o Congresso não pode analisar outras medidas.

Já os projetos de lei de iniciativa popular ficam à mercê dos interesses político-partidários dos parlamentares no poder.

 

Projeto de lei de iniciativa popular e a PLS 267/2016

 

A lei 9709/98 regulamenta o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular. Esta lei dispõe acerca dos conceitos, requisitos e procedimentos desses institutos.

O PLS 267/2016 visa alterar a referida norma, com o intuito de desburocratizar o procedimento referente ao projeto de lei de iniciativa popular.

Visa a possibilitar a utilização da internet para coleta de assinaturas que serão validadas pela justiça eleitoral. Prevê ainda, que a justiça eleitoral mantenha lista atualizada de anteprojetos de lei de iniciativa popular na internet, para que aqueles, que assim desejarem, possam assinar eletronicamente os projetos de interesse.

O referido PLS se harmoniza perfeitamente com os princípios constitucionais garantidores da participação popular.

É notória a crise de representatividade vivenciada no nosso país. Onde os cidadãos não conseguem enxergar nas ações dos seus representantes o reflexo da vontade popular, do interesse público.

Clique aqui para acessar o artigo “O Princípio da Supremacia do Interesse Público e a Crise de Representatividade”.

Nessa linha, torna-se necessário o fortalecimento dos instrumentos da democracia direta para assegurar ao cidadão a atendimento aos seus anseios, razão maior da existência do Estado.

 

Disposições do Regimento Interno da Câmara dos Deputados que regulam a iniciativa popular:

 

Art. 252. A iniciativa popular pode ser exercida pela apresentação à Câmara dos Deputados de projeto de lei subscrito por, no mínimo, um centésimo do eleitorado nacional, distribuído pelo menos por cinco Estados, com não menos de três milésimos dos eleitores de cada um deles, obedecidas as seguintes condições:

I – a assinatura de cada eleitor deverá ser acompanhada de seu nome completo e legível, endereço e dados identificadores de seu título eleitoral;

II – as listas de assinatura serão organizadas por Município e por Estado, Território e Distrito Federal, em formulário padronizado pela Mesa da Câmara;

III – será lícito a entidade da sociedade civil patrocinar a apresentação de projeto de lei de iniciativa popular, responsabilizando-se inclusive pela coleta das assinaturas;

IV – o projeto será instruído com documento hábil da Justiça Eleitoral quanto ao contingente de eleitores alistados em cada unidade da Federação, aceitando-se, para esse fim, os dados referentes ao ano anterior, se não disponíveis outros mais recentes;

V – o projeto será protocolizado perante a Secretaria-Geral da Mesa, que verificará se foram cumpridas as exigências constitucionais para sua apresentação;

VI – o projeto de lei de iniciativa popular terá a mesma tramitação dos demais, integrando a numeração geral das proposições;

VII – nas Comissões ou em Plenário, transformado em Comissão Geral, poderá usar da palavra para discutir o projeto de lei, pelo prazo de vinte minutos, o primeiro signatário, ou quem este tiver indicado quando da apresentação do projeto;

VIII – cada projeto de lei deverá circunscrever-se a um único assunto, podendo, caso contrário, ser desdobrado

pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania em proposições autônomas, para tramitação em separado;

IX – não se rejeitará, liminarmente, projeto de lei de iniciativa popular por vícios de linguagem, lapsos ou imperfeições de técnica legislativa, incumbindo à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania escoimá-lo dos vícios formais para sua regular tramitação;

X – a Mesa designará Deputado para exercer, em relação ao projeto de lei de iniciativa popular, os poderes ou atribuições conferidos por este Regimento ao Autor de proposição, devendo a escolha recair sobre quem tenha sido, com a sua anuência, previamente indicado com essa finalidade pelo primeiro signatário do projeto.

 

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Leia também:    Direito à vida e à saúde

O voto facultativo e a PEC 61/2016

 

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Farol baixo desligado dentro da cidade resulta em multa?

A exigência do farol baixo ligado em rodovias ainda gera muitas dúvidas. Entenda de uma vez por todas em que situações o farol baixo desligado gera multa.

Normalmente publico artigos voltados predominantemente para as áreas de direito administrativo e constitucional. Porém, um dos seguidores do blog pediu que escrevesse algo com relação à aplicação de multa para condutores de veículos que estejam com farol baixo desligado.

A dúvida surge por conta de decisão judicial que inicialmente havia determinada a suspensão de aplicação de multas e logo depois outra decisão autorizou a sua aplicação. Alguns condutores realmente continuam sem saber ao certo se devem ou não ligar o farol. Outra situação é com relação às rodovias que passam pela área urbana. Nesse caso é obrigatória a utilização do farol baixo também?

Vamos à análise:

 

Alteração da Lei 9503/97 (Código de Trânsito Brasileiro)

Inicialmente, é importante frisar que o Código de Trânsito Brasileiro (CTB) foi alterado pela lei 13290/2016, para tornar obrigatório o uso, nas rodovias, de farol baixo aceso durante o dia. Tal medida, segundo o CONTRAM (Conselho Nacional de Trânsito), visa a melhorar a segurança de quem trafega nas rodovias, vez que o farol baixo ajuda a identificar o veículo em uma distância consideravelmente maior do que se estivesse desligado.

Com a alteração os arts. 40 e 250 do CTB foram alterados da seguinte forma:

Art. 40. O uso de luzes em veículo obedecerá às seguintes determinações:

I – o condutor manterá acesos os faróis do veículo, utilizando luz baixa, durante a noite e durante o dia nos túneis providos de iluminação pública e nas rodovias;

(…)

Art. 250. Quando o veículo estiver em movimento:

I – deixar de manter acesa a luz baixa:

(…)

b) de dia, nos túneis providos de iluminação pública e nas rodovias;

(…)

Infração – média;

Penalidade – multa.

A referida infração de trânsito foi instituída em maio pela referida lei. Respeitada a vacatio legis, a partir do mês de julho de 2016 os órgãos de trânsito iniciaram a fiscalização.

 

Decisão suspende a aplicação das multas

A ADPVAT (Associação Nacional de Proteção Mútua aos Proprietários de Veículos Automotores) ingressou com Ação Civil Pública na Justiça Federal (Seção Judiciária do Distrito Federal) em face da UNIÃO, visando a impedir a aplicação de multas por conta do farol baixo desligado em rodovias.

Segundo a ADPVAT em rodovias que cortam o perímetro urbano das cidades, fica difícil distinguir onde é obrigatória a utilização do farol baixo e onde deixa de ser. Atestou ainda que a finalidade dessa nova infração é apenas a de arrecadação pelo Estado, o que se constitui desvio de finalidade.

O juiz deferiu a liminar.

Entretanto, a União interpôs recurso contra essa decisão e o TRF1 (Tribunal Regional da 1ª Região) publicou decisão liminar, no dia 07 de outubro de 2016, que abriu a possibilidade de que, naquelas rodovias onde a sinalização é adequada, a fiscalização e aplicação da multa seja feita normalmente.

 

Esclarecimentos Gerais

Enumerei abaixo alguns pontos de toda essa temática para esclarecer de vez o assunto:

 

1 – A lei estabelece a obrigatoriedade do farol baixo mesmo durante o dia apenas nas rodovias. Não é demais lembrar, que algumas rodovias cortam o perímetro urbano de algumas cidade e nesses trechos o farol deve permanecer ligado.

 

2 – O farol baixo deve estar ligado em todas as rodovias, sejam elas federais ou estaduais. Na verdade, no polo passivo da ação movida pelo ADPVAT constava apenas a União que, em tese, possui competência para fiscalizar e aplicar multas apenas nas rodovias federais. Assim, a fiscalização e aplicação de multas por farol baixo nas demais rodovias (como as estaduais) nunca esteve suspensa. A suspensão ocorrida no mês de setembro afetava apenas as rodovias federais.

 

3 – As rodovias que cortam o perímetro urbano de cidades devem estar devidamente identificadas, de modo a permitir ao condutor do veículo a exata noção de estar trafegando em rodovia ou via pública (rua, avenida, etc).

Em locais onde essa sinalização não é clara, o farol baixo desligado não poderá acarretar autuação e multa, com base no art. 90 do CTB.

Art. 90. Não serão aplicadas as sanções previstas neste Código por inobservância à sinalização quando esta for insuficiente ou incorreta.

Eventual aplicação de multa será passível de recurso com o fundamento exposto.

 

Exemplo:

Farol baixo multaA imagem ao lado foi retirada do Google Imagens e retrata uma situação bem comum em várias cidades do Brasil. O exemplo foi tirado da cidade de Teófilo Otoni – MG.

Percebam que ao centro está a Rodovia que corta o perímetro urbano da cidade e exatamente ao lado, separadas apenas por um pequeno canteiro, existe uma avenida.

Quem trafega ao centro na Rodovia deve estar com farol baixo ligado ainda que esteja no perímetro urbano, sob pena de multa. Quem trafega na via marginal não tem obrigatoriedade de observância quanto à regra do farol baixo por se tratar de uma avenida.

Essa é a discussão atual, em muitas localidade o motorista se perde. Não sabe se está em uma via pública (rua, avenida, etc) ou em uma rodovia. Daí a necessidade de placas de sinalização.

 

Quem tiver interesse em pesquisar mais sobre o assunto, abaixo o número dos processos para consulta:

Processo principal junto a seção judiciária do DF: 0049529-46.2016.4.01.3400

Agravo de Instrumento junto ao TRF1: 0055875-28.2016.4.01.0000/DF

 

Espero ter contribuído para sanar as dúvidas dos nossos leitores

 

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Leia também:  Vai de UBER? Aspectos legais

Zona Azul – pode ou não pode? Aspectos legais

 

 

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Vai de Uber? Aspectos legais

Uber. Em todo o Brasil a discussão em torno da legalidade do aplicativo Uber tem se intensificado. Taxistas protestam contra a Uber alegando a sua ilegalidade. Consumidores cada dia aderem ao serviço que vem transformando a ideia de transporte privado de passageiros.

Afinal, a Uber é legal? Vejamos….

 

O que é a Uber?

A Uber é uma empresa de tecnologia que desenvolveu um aplicativo que conecta provedores e usuários de serviço de transporte privado.

Na prática, o usuário se cadastra no aplicativo. O aciona quando precisar se deslocar para algum local. O programa rastreia o motorista parceiro mais próximo e envia para o cliente a placa do carro que fará o transporte, a foto do motorista e a avaliação do motorista e veículo feita por outros usuários.

Envia ainda uma expectativa da distância do trajeto e do valor a ser cobrado.

O motorista por sua vez para se cadastrar à Uber deve possuir um carro novo ou seminovo de luxo (ar condicionado etc), entre outros requisitos. Do valor que o motorista recebe do cliente parte é repassado para a Uber.

Ao final do transporte, o cliente avalia motorista e veículo.

 

Os taxis possuem exclusividade para o serviço de transporte público individual de passageiros?

Sim. De acordo com o art. 2º da lei 12468/2011, que regulamenta a profissão de taxista:

Art. 2º – Constitui atividade privativa de taxista a utilização de a utilização de veículo automotor, próprio ou de terceiros, para o transporte público individual remunerado de passageiros, cuja capacidade será de, no máximo, 7 (sete) passageiro.

A legislação, ora em destaque, é bem clara quanto à exclusividade dos taxistas para operarem o serviço público de transporte de passageiros.

A referida lei dispõe acerca de vários requisitos que devem ser cumpridos pelos motoristas, destacando seus deveres e direitos, sobretudo, dos taxistas empregados.

 

Uber é LEGAL?

Inicialmente, é importante, classificar o serviço que a UBER oferece, para só então responder à questão proposta.

No Brasil, a lei 12587/2012 instituiu as diretrizes da política nacional de mobilidade urbana. Estabelecendo, dentro da competência da União para legislar sobre transportes (art. 22, incisos IX e XI), além de vários aspectos relacionados à temática, diversos conceitos e classificações importantes para os serviços de transportes.

O art. 3º da referida lei classifica os serviços de transporte da seguinte forma:

– Quanto ao objeto:

. De passageiros

. De cargas

– Quanto à característica do serviço

. Coletivo

. Individual

– Quanto à natureza do serviço

. Público

. Privado

Essa classificação disposta na lei é bastante relevante, à medida que permite a perfeita caracterização de determinado serviço de transporte dentro do que estabelece as diretrizes nacionais de mobilidade.

Partindo da classificação citada, é possível alocar o serviço da UBER da seguinte forma: Transporte de passageiros individual privado.

Assim, percebe-se que a legislação abarca a atividade exercida pelos motoristas parceiros da UBER.

 

Uber x Taxi – Qual o motivo do conflito?

A lei 12587/2012 regulamentou o transporte público individual, mas não o fez com relação ao transporte privado individual. O conceito foi assim estabelecido:

Art. 4º (…)

VIII – transporte público individual: serviço remunerado de transporte de passageiros aberto ao público, por intermédio de veículos de aluguel, para a realização de viagens individualizadas;

À primeira vista, neste conceito se enquadraria tanto o serviço de taxi como os do Uber. Contudo, é forçoso salientar que o serviço prestado pelo Uber não possui natureza de serviço público, vez que não possui regramento jurídico próprio de serviço público e não se reveste de essencialidade.

Neste ponto, vou até mais fundo, o próprio serviço prestado pelo taxi deixou, do ponto de vista legal (à luz da lei 12587/2012), de ser considerado serviço público e passou a ser um serviço de utilidade pública. Senão vejamos o art. 12 da lei:

Art. 12.  Os serviços de utilidade pública de transporte individual de passageiros deverão ser organizados, disciplinados e fiscalizados pelo poder público municipal, com base nos requisitos mínimos de segurança, de conforto, de higiene, de qualidade dos serviços e de fixação prévia dos valores máximos das tarifas a serem cobradas.

Art. 12-A.  O direito à exploração de serviços de táxi poderá ser outorgado a qualquer interessado que satisfaça os requisitos exigidos pelo poder público local.

1o É permitida a transferência da outorga a terceiros que atendam aos requisitos exigidos em legislação municipal.

2o Em caso de falecimento do outorgado, o direito à exploração do serviço será transferido a seus sucessores legítimos, nos termos dos arts. 1.829 e seguintes do Título II do Livro V da Parte Especial da Lei no10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil).

3o As transferências de que tratam os §§ 1oe 2o dar-se-ão pelo prazo da outorga e são condicionadas à prévia anuência do poder público municipal e ao atendimento dos requisitos fixados para a outorga.

A legislação faz expressa referência ao serviço de taxi como serviço de transporte público individual e apresenta a sua regulamentação como serviço de utilidade pública.

O que diferencia, portanto, o serviço de transporte público individual (realizado pelo taxi) do transporte privado individual (realizado pelo Uber), segundo o Professor Daniel Sarmento:

O primeiro configura serviço de utilidade pública, que, conquanto pertencente à esfera da atividade econômica “stricto sensu”, se sujeito a intensa regulamentação estatal. Enquanto o segundo é atividade econômica comum, também sujeito à regulação estatal, embora em menor intensidade.

A discussão que surge nesse cenário: De um lado os taxistas que se insurgem contra os motoristas parceiros da Uber, sob a alegação de que o serviço é de exclusividade dos taxistas.

E de outro os motoristas parceiros da Uber que querem exercer o direito à realização de uma atividade econômica não regulamentada. Com base nos princípios da livre iniciativa e da livre concorrência, garantidos constitucionalmente.

Como não há legislação que regulamente as atividade da Uber, em tese, não existe ilegalidade no seu exercício. Atualmente, tanto taxis como motoristas da Uber podem, sob o prisma legal, atuar.

Relembremos as lições básicas do princípio da legalidade aplicável à esfera privada: “O que não está proibido por lei, é permitido fazer”. (clique aqui para ler artigo completo sobre os princípios da administração pública).

 

Posicionamento dos Tribunais

No município de São Paulo foi editada lei que proibia as atividades da Uber. O texto da lei vedava a utilização de carros particulares para transporte remunerado.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) declarou inconstitucional a lei municipal 16279/2015, por entender que lei contrariava o livre exercício de atividade econômica, a livre concorrência e o direito de escolha do consumidor, corolários da livre iniciativa.

Noutra linha, o município estaria invadindo competência da União para legislar acerca de transporte, conforme mencionado anteriormente.

O Supremo Tribunal Federal (STF), recentemente, NEGOU pedido liminar em que se discutia a decisão do Tribunal de Justiça da Paraíba (TJPB) que suspendeu lei municipal da capital João Pessoa que vedava o transporte individual de passageiros que não fosse realizado por taxi.

Nota-se uma clara tendência dos tribunais pátrios ao entendimento pela inconstitucionalidade de leis municipais ou estaduais que proíbam as atividades da Uber. É necessário levar em conta que o próprio marco civil da internet também alberga as suas atividades.

 

Considerações Finais

Para amenizar tantos conflitos entre Uber e Taxi é necessária urgentemente a regulamentação do transporte privado individual de passageiros.

Igualmente importante que os nossos legisladores busquem a satisfação do que é interesse público e não apenas interesse de classes específicas.

O Ministério Público do Trabalho tem participado de várias discussões neste sentido e até montou grupo para analisar se existe vínculo de emprego entre a Uber e seus motoristas parceiros.

Aguardemos a regulamentação, enquanto isso. Vai de taxi? Vai de Uber? O consumidor vai escolher o que melhor lhe atende. Tudo legal.

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Leia também:    Direito de greve. O que aconteceu?

O que é privatização? (sou contra ou a favor?)

 

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Direito à vida e à saúde

Breves considerações acerca do atendimento médico de urgência

Não há uma hierarquia definida, do ponto de vista constitucional, dos direitos fundamentais do cidadão. Contudo, é inegável que o direito à vida merece especial atenção e destaque. Afinal, é através desse direito que será possível ao cidadão usufruir os demais, como a liberdade.

Sem a vida não somos nada.

Segundo a doutrina, o direito à vida comporta duas acepções: negativa e positiva.

Na acepção negativa, o direito à vida constitui-se em um direito de defesa, que impede/restringe a intervenção estatal e de outros particulares na existência física da pessoa.

A proibição da pena de morte, prevista no art. 5º, inciso XLVII é um nítido exemplo dessa visão negativa do direito à vida.

Na acepção positiva, há uma relação direta entre o direito à vida e a dignidade da pessoa humana. O Estado, além de não intervir na existência física do cidadão, deve garantir o gozo digno desse direito.

Deve ser assegurado ao cidadão o acesso a bens e utilidades necessários para existência digna, devendo o Estado adotar medidas positivas no sentido da sua viabilização.

Nas palavras de Alexandre de Moraes (2014), “a Constituição Federal proclama, portanto, o direito à vida, cabendo ao Estado assegurá-lo em sua dupla acepção, sendo a primeira relacionada ao direito de continuar vivo e a segunda de se ter vida digna quanto à subsistência”.

 

Direito à vida é absoluto?

Apesar de a vida humana ser concebida como valor central do ordenamento jurídico e pressuposto existencial dos demais direitos fundamentais, ainda assim, não reveste-se de caráter absoluto.

Existem no corpo constitucional e na legislação infraconstitucional hipóteses em que o direito à vida pode ser relativizado. Dos quais cito alguns:

 

– Pena de Morte:

Há vedação no ordenamento brasileiro da pena de morte que fundamenta-se na garantia do direito à vida. A exceção ocorre apenas no caso de guerra declarada (arts. 5º, XLVII, a; 84, XIX

Sempre que o Brasil enfrenta uma forte onda de violência, permeada por crimes bárbaros e cruéis volta à tona a discussão acerca da pena de morte no Brasil. Alguns autores discutem acerca da possibilidade de sua inserção no ordenamento jurídico através de Emenda à Constituição.

O que a meu ver violaria a Constituição Federal de 88, vez que o direito à vida é consagrado como direito fundamental da pessoa, e como tal, faz parte do núcleo imutável da constituição, protegido por cláusula pétrea.

 

– O aborto terapêutico e sentimental

Independentemente da teoria que se adota com relação ao início da vida. A legislação penal assegura a não criminalização desses tipos de aborto. Na verdade, trata-se de hipótese de excludente de ilicitude.

O aborto terapêutico (ou aborto necessário) é aquele em que a má-formação do feto coloca em risco a vida da gestante (Art. 128, I do Código Penal).

O aborto sentimental é aquele resultante do crime de estupro (art. 128, II do Código Penal).

Além dessas hipóteses legais, o Supremo Tribunal Federal (STF) em 2012 declarou, por maioria, a inconstitucionalidade da interpretação segundo a qual a interrupção da gravidez de feto anencéfalo seria conduta tipificada como aborto pelo Código Penal.

 

– Lei do Abate

Permite o abate de aviões considerados hostis, categoria na qual foram incluídas por decreto as aeronaves suspeitas de carregar drogas em território nacional.

Polêmicas à parte, é o art. 303, §2º do Código Brasileiro da Aeronáutica alterado pela lei 9614/98, que autoriza a medida de destruição, em nome da segurança nacional.

 

Direito à vida e à Saúde

O direito à vida em sua acepção positiva, conforme visto, deve trazer consigo a ideia de uma vida digna, devendo o Estado prestar o aparato necessário para essa garantia. Nesta senda, o direito à saúde é consequência lógica do direito à vida digna.

No Brasil a saúde, conforme dicção constitucional, é dever do Estado e direito de todos garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

O Sistema Único de Saúde (SUS) é o responsável por esta gama de serviços disponibilizados ao cidadão, independentemente da sua raça, credo, cor, idade ou condição financeira. Todos devem ser assistidos por este serviço público essencial.

No artigo “O STF e o direito à saúde: Distribuição de medicamentos de alto custo”, eu detalho um pouco mais acerca da legislação sanitária do nosso país. (Clique aqui para acessar o artigo)

 

Quem você escolhe salvar: o traficante em estado grave ou o policial levemente ferido?

Aqui temos uma pergunta sem reposta, uma vez que cada pessoa de acordo com suas convicções poderá emitir juízo de valor diferente. Não há resposta certa ou errada do ponto de vista valorativo. Cada um se manifestará de uma forma.

Entretanto, à luz da Constituição Federal a melhor pergunta seria: Quem o Estado atenderia primeiro? Pois o Estado deve salvar a todos, ao menos em tese.

Já que não posso responder à primeira pergunta, vamos à resposta dessa segunda:

O Estado, conforme visto, deve garantir o direito à vida sem distinção. Não cabe ao Estado valorar no tocante à vida. Qual vida vale mais? A do policial? A do traficante? A do rico? A do pobre? A da classe média? A de quem estudou? A de quem é analfabeto?

Qual padrão de valoração o Estado poderia utilizar?

Difícil dizer, todos os pontos de vista são aceitáveis à luz dos argumentos de seus defensores. O Estado deve se posicionar acima dessas convicções de cunho discriminatório e deve primar pela vida da pessoa (ser humano).

Como já disse anteriormente, o Estado tem o dever de salvar a todos, mas nos serviços de saúde existe SIM uma ordem para atendimento. Não é possível atender todos ao mesmo tempo.

Esta ordem de atendimento é realizada por meio da classificação de risco, que leva em conta a gravidade da situação.

 

Classificação de Risco

Não sou expert no assunto, mas já trabalhei na área de saúde e já fui atendido em serviços de pronto atendimento.

Ao chegar à clínica ou hospital de urgência/emergência, um profissional faz a triagem do paciente, e lhe entrega uma pulseira ou adesivo com a cor referente à sua classificação de risco:

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Vermelho: Emergência

Laranja: Muito urgente

Amarelo: Urgente

Verde: Pouco urgente

Azul: Não urgente

                (Imagem: saude.gov.br)

 

A prioridade de atendimento está aí estabelecida. O paciente mais grave, que enfrenta situação de emergência tem prioridade total de atendimento, já que há risco de morte iminente (nem mesmo passa pela triagem, vai direto para o atendimento médico).

A prioridade de atendimento diminui na mesma proporção do risco.

O atendimento ao paciente EMERGENTE deve sempre ser visto como prioridade total.

Nos serviços de saúde existe um sistema denominado vaga zero. Dependendo da gravidade do paciente, o serviço de urgência e emergência, ainda que esteja lotado, ainda que esteja sobrecarregado é obrigado a aceitar o paciente e a fornecer-lhe todo o suporte de tratamento necessário. Ainda que não tenha vaga disponível, o paciente EMERGENTE deve ser acolhido para tratamento.

O Código de Ética Médica (Resolução CFM 1931/2009) estatui no inciso I do Capítulo I, que a medicina é uma profissão a serviço da saúde do ser humano e da coletividade e será exercida sem discriminação de nenhuma natureza.

 

Quem o Estado atenderia primeiro?

Diante do exposto, o Estado deve atender primeiro o mais grave. Assegurar o direito à vida.

Não se trata de escolher entre o policial e o traficante. Entre o rico e o pobre. Entre o branco e o negro. Entre o doutor e o analfabeto. Trata-se de escolher entre o que apresenta mais risco e o que apresenta menos risco de morte.

Permitir ao Estado estabelecer distinção baseada em critérios de natureza pessoal equivaleria jogar por terra todo o ideário de garantias estabelecidos pela Carta Magna.

 

Considerações Finais

Vem ocorrendo uma inversão de valores no seio da comunidade em geral, impulsionada pelos meios de comunicação. Tal fato fica mais evidente dia-a-dia.

As instituições ligadas à segurança pública (polícias civil, militar, rodoviária etc) estão padecendo por falta de investimentos. Necessitam urgentemente de melhores condições de trabalho para enfrentamento ao crime. Seus agentes precisam ser melhor remunerados e mais valorizados.

Neste caso, salvar a Polícia é algo que deve estar na agenda dos nossos governantes para garantir o direito à vida digna dos cidadãos.

 

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Leia também:    Direito ao esquecimento x Direito à Informação

As ações afirmativas e o princípio da Igualdade

 

 

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O Voto Facultativo e a PEC 61/2016

Voto Facultativo. Resolvi escrever um pouco sobre o assunto após analisar a PEC (Proposta de Emenda à Constituição) nº 61/2016. Esta proposta tem como objetivo tornar o voto facultativo no Brasil.

Antes de adentrarmos à questão é muito importante diferenciamos: o voto e o direito de sufrágio.

 

O que é o Direito de Sufrágio?

Sufrágio (de aprovação, apoio) é o direito subjetivo de natureza política que tem o cidadão de eleger (capacidade eleitoral ativa), ser eleito (capacidade eleitoral passiva) ou participar da organização e da atividade do Poder Estatal. Portanto, sufrágio é o direito que se exterioriza no voto, que, portanto, é a exteriorização ou materialização desse direito (sufrágio), implicando uma declaração de vontade (CERQUEIRA, 2012)

Esse conceito explicita bem o direito de sufrágio que pode ser resumido no direito que o cidadão possui de participar da vida política do Estado.

O direito de sufrágio pode ser classificado como ativo e passivo. Ativo – direito de votar e Passivo: direito a ser votado.

O voto portanto é instrumento para a efetivação do direito de sufrágio.

 

Voto Obrigatório

A Constituição Federal de 88 (CF/88) determina em seu artigo 14, §1º, inciso I, a obrigatoriedade do voto. Assim dispõe:

Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante:

(….)

  • 1º O alistamento eleitoral e o voto são:

I – obrigatórios para os maiores de dezoito anos;

(….)

Estão excluídos dessa obrigatoriedade os analfabetos, os maiores de 70 anos, bem como os maiores de 16 e menores de 18 anos. Lembrando ainda que os estrangeiros e, durante o serviço militar, os conscritos não podem alistar-se.

 

O Voto Facultativo:

Voto FacultativoMuito se discute no Brasil acerca desse voto obrigatório, sobretudo porque países com democracias consolidadas possuem em seu ordenamento a previsão do voto facultativo.

Pois bem, tecnicamente, o voto no Brasil é FACULTATIVO. Apesar da disposição constitucional, conforme visto acima, ser clara e explícita no sentido da obrigatoriedade, a verdade é outra.

Vamos exemplificar: O cidadão que no dia da eleição vai até a urna e vota em branco ou nulo, exerceu o seu direito de sufrágio (sufragou), contudo, não votou. Porque, segundo parte da doutrina, o voto é a manifestação da vontade e esta deve ser tida como válida.

Neste sentido, se analisarmos a dicção da lei Eleitoral (Lei 9504/97), que leva em conta na apuração do vencedor das eleições apenas os votos válido; o voto não é obrigatório (já que a pessoa pode optar por não votar em ninguém – branco ou nulo).

Vejamos o que determina o art. 2º da Lei 9504/97:

Art. 2º Será considerado eleito o candidato a Presidente ou a Governador que obtiver a maioria absoluta de votos, não computados os em branco e os nulos.

O que é obrigatório é o comparecimento eleitoral ou a justificativa para aqueles que não sufragarem.

Importante: Essa discussão é de base teórica. Em provas e concursos a banca normalmente espera que a resposta seja: voto é obrigatório.

 

PEC 61/2016

A PEC 61/2016 tem o objetivo tornar o voto facultativo no texto constitucional. Pela proposta os parágrafos 1º e 2º do art. 14 da CF/88 passariam a vigorar com a seguinte redação:

Art. 14 (….)

  • 1º O voto é facultativo e o alistamento eleitoral obrigatório.
  • 2º Não podem se alistar como eleitores os menores de 16 anos, os estrangeiros e, durante o período de serviço militar, os conscritos.

Assim, o alistamento eleitoral continuaria a ser obrigatório, mas o voto (aí incluindo o comparecimento eleitoral) passaria a ser facultativo.

Proposta muito interessante e que reflete a realidade brasileira. Nas eleições de 2016 batemos o recorde em abstenções (pessoas que não compareceram à votação), votos brancos e nulos.

 

Não votei, como proceder?

Para aclarar um pouco a situação de quem não pôde comparecer à votação:

– Quem não comparece à eleição para votar ou apresentar justificativa (quando está fora do seu domicílio eleitoral) deve justificar o seu não comparecimento no prazo máximo de 60 dias junto à justiça eleitoral. Caso o eleitor esteja fora do país, o prazo é de 30 dias contados do seu retorno.

O Tribunal Superior Eleitoral disponibiliza em seu site formulários online para esta justificativa.

Caso a pessoa não justifique no prazo ou tenha a sua justificativa indeferida pelo juiz eleitoral, deverá arcar com uma multa, caso não queira ficar inadimplente com a justiça eleitoral.

Esta multa, em valores atualizados, pode variar de R$ 1,05 até R$ 3,51 por turno ausente.

O valor da multa pelo não comparecimento e não justificativa é irrisório, o que justifica ainda mais a PEC 61/2016. Em algumas cidades, o cidadão tem que pagar transporte coletivo para ir até o local de votação e por certo gastará mais do que gastaria pagando essa multa.

 

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Zona Azul – Pode ou não pode? Aspectos legais

Aspectos legais do estacionamento pago em via pública

Zona Azul ou Faixa Azul. Devido ao grande número de veículos que circulam nas cidades, o simples ato de estacionar em via pública tornou-se uma via crucis. Os motoristas rodam por várias ruas, por longo tempo, para terem a sorte de acharem espaço livre para estacionar.

Uma das causas dessa dificuldade em achar locais para estacionamento nas vias públicas, se deve ao fato de pessoas que trabalham e moram em regiões de maior densidade comercial e que não possuem garagens, estacionam seus carros na via e ali o deixam durante todo o dia.

Não há nenhuma ilegalidade no fato de a pessoa simplesmente estacionar o carro na via o dia inteiro. Contudo, a vaga para estacionamento em área de comércio não estaria atingindo a sua função social de forma plena. Afinal, as pessoas que precisam fazer negócios naquela área não terão onde estacionar.

A ideia da Zona Azul ou Faixa Azul ou simplesmente estacionamento pago em via pública, surgiu da necessidade de se regulamentar a permanência em vagas de alta densidade comercial, como os centros das cidade e bairros de maior concentração de comércios e repartições públicas.

 

Zona Azul é um serviço público?

Sim. Trata-se de serviço público de administração e exploração do sistema de estacionamento rotativo. Este serviço, via de regra, pode ser explorado pelo próprio Poder Público ou mediante concessão.

A concessão de serviço público é uma forma de delegação. O Poder Público, titular do serviço, entrega a uma pessoa jurídica a execução de determinado serviço. A concessão de serviços públicos está prevista no art. 175 da Constituição Federal de 88 (CF/88).

Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos.

A concessão deve, obrigatoriamente, ser precedida de lei que autorize a sua instituição e procedimento licitatório na modalidade concorrência pública (procedimento mais complexo previsto na Lei 8666/93).

A lei geral que regulamenta as concessões no Brasil é 8987/95. Ela conceitua a concessão de serviço público como a delegação de sua prestação, feita pelo poder concedente, mediante licitação, na modalidade de concorrência, à pessoa jurídica ou consórcio de empresas que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco e por prazo determinado.

Observem que o Poder Público transfere apenas a execução do serviço, mantendo-se a sua titularidade. Assim, havendo, por exemplo, a inadimplência por parte da concessionária, o Poder Público poderá retomar o serviço.

 

 

A via é pública. A cobrança da taxa para estacionar é legal?

Zona AzulSim. Apesar de a rua ser um bem público, o Estado pode regulamentar a sua utilização com vistas ao interesse da coletividade. É exatamente isso que ocorre com a instituição deste serviço de administração de estacionamento rotativo.

Segundo o art. 103 do Código Civil Brasileiro:

Art. 103. O uso comum dos bens públicos pode ser gratuito ou retribuído, conforme for estabelecido legalmente pela entidade a cuja administração pertencerem. (grifo nosso)

O valor da tarifa é regulamentado pela lei que autorizou a concessão. Deve ser paga pelo usuário do serviço diretamente à concessionária (empresa exploradora da atividade).

Do valor recolhido pela concessionária, parte é repassado ao Poder Público, na forma estipulada em contrato.

 

O motorista que não paga o estacionamento rotativo pode ser multado?

Sim. A multa está prevista no Código de Trânsito Brasileiro.

Art. 181. Estacionar o veículo:

(…)

XVII – em desacordo com as condições regulamentadas especificamente pela sinalização (placa – Estacionamento Regulamentado):

Infração – grave; (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)    (Vigência)

Penalidade – multa;

Medida administrativa – remoção do veículo;

 

Quem estaciona sem pagar a taxa ou fora do que estabelecem as placas, está estacionado em desacordo com as condições regulamentadas. Pode sim levar multa.

 

IMPORTANTE: O Poder Público pode autuar e aplicar multas por conta do chamado Poder de Polícia. Tal poder é INDELEGÁVEL, ou seja, o Poder Público ao delegar o serviço de administração do estacionamento rotativo, entrega ao particular apenas a execução da atividade.

O Poder Público não pode entregar o Poder de Polícia (que abrange a competência para fiscalizar, autuar e, se for o caso, aplicar multas ou medidas administrativas). Apenas a autoridade de trânsito municipal poderá fazê-lo ou a polícia militar, caso haja convênio.

Assim, caso a empresa operadora do sistema Faixa Azul ou Zona Azul (como queiram chamar) seja a responsável por fiscalizar os veículos estacionados irregularmente estaríamos diante de uma grave ilegalidade, que acarretaria por certo a nulidade do auto de infração.

 

O Código de Trânsito Brasil estabelece os requisitos para autuação em seu art. 280, vejamos:

Art. 280. Ocorrendo infração prevista na legislação de trânsito, lavrar-se-á auto de infração, do qual constará:

I – tipificação da infração;

II – local, data e hora do cometimento da infração;

III – caracteres da placa de identificação do veículo, sua marca e espécie, e outros elementos julgados necessários à sua identificação;

IV – o prontuário do condutor, sempre que possível;

V – identificação do órgão ou entidade e da autoridade ou agente autuador ou equipamento que comprovar a infração;

VI – assinatura do infrator, sempre que possível, valendo esta como notificação do cometimento da infração.

1º (VETADO)

§ 2º A infração deverá ser comprovada por declaração da autoridade ou do agente da autoridade de trânsito, por aparelho eletrônico ou por equipamento audiovisual, reações químicas ou qualquer outro meio tecnologicamente disponível, previamente regulamentado pelo CONTRAN.

§ 3º Não sendo possível a autuação em flagrante, o agente de trânsito relatará o fato à autoridade no próprio auto de infração, informando os dados a respeito do veículo, além dos constantes nos incisos I, II e III, para o procedimento previsto no artigo seguinte.

§ 4º O agente da autoridade de trânsito competente para lavrar o auto de infração poderá ser servidor civil, estatutário ou celetista ou, ainda, policial militar designado pela autoridade de trânsito com jurisdição sobre a via no âmbito de sua competência.

 

A partir da leitura desse artigo verifica-se claramente que cabe ao agente de trânsito a fiscalização do sistema de estacionamento rotativo em via pública.

 

Considerações Finais

O estacionamento rotativo em via pública é uma importante ferramenta para as cidades em meio a um trânsito tão complicado que vemos dia-a-dia crescer. A sua instituição, se feita de forma correta, melhora a fluidez do trânsito e as condições de quem lida com suas atividades em área comercial.

O Poder Público deve estar atento para que todos os requisitos legais sejam completados. Não é demais lembrar que, como trata-se de serviço público a ser prestado por particular, o Código de Defesa do Consumidor aplica-se à relação (art. 7º da Lei 8987/95)

 

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