Pessoa Jurídica – Aspectos gerais à luz do Código Civil

Pessoa Jurídica – Aspectos gerais à luz do Código Civil

O Ser humano é um ser social por natureza. Ele tem a necessidade de associar-se visando ao interesse comum; é assim desde a antiguidade, quando os seres humanos se associavam para a caça, até os dias atuais em que se associam para as mais diversas atividades.

O presente artigo aborda o tema pessoa jurídica, que é de extrema relevância nesse contexto. Afinal, a falta de um regramento específico para esse associativismo traria, por certo, grande insegurança e instabilidade nas relações firmadas por esses entes.

Quem seria o responsável pelas obrigações assumidas por essas instituições? Qual patrimônio responderia por eventual obrigação assumida?

Essas e outras perguntas poderão ser respondidas, a partir da análise mais aprofundada do assunto.

Conceito

Gonçalves (2017, pag. 233) assim conceitua Pessoa Jurídica:

Consiste num conjunto de pessoas ou de bens, dotado de personalidade jurídica própria e constituído na forma da lei, para a consecução de fins comuns. Pode-se afirmar, pois, que pessoas jurídicas são entidades a que a lei confere personalidade, capacitando-as a serem sujeitos de direitos e obrigações.

A legislação brasileira reconhece a validade dessa integração de pessoas e bens visando a realização de determinada atividade e cria uma pessoa diferente daquelas que a compõe. Essa pessoa criada, que foi resultante da vontade de pessoas naturais ou físicas, é chamada de PESSOA JURÍDICA.

Notem que a ideia central é estabelecer que a Pessoa Jurídica não pode se confundir com as pessoas físicas que a criaram. Se isso acontecer, cai por terra a principal finalidade dessa instituição que é proteger o patrimônio dessa instituição e as relações que são firmadas com outras pessoas.

Ex: João, Maria e José resolveram criar uma associação para proteção aos animais. Essa associação para realizar suas atividades terá que contratar veterinário e outros funcionários para cuidar dos animais. Terá ainda que comprar ração, alugar imóvel, etc. são muitas as relações que associação terá que estabelecer. Nesse caso, se algum desses contratos não for pago na forma pactuada, apenas o patrimônio da Associação será afetado. João, Maria e José são pessoas físicas que compõem a associação, mas o patrimônio delas não é afetado pelas obrigações assumidas por esta Pessoa Jurídica.

Desta forma, é possível afirmar que as Pessoas Jurídicas possuem personalidade jurídica, pois são sujeitos de direitos e deveres na ordem civil. Mas não se confundem com as pessoas físicas que as criaram.

Natureza Jurídica

Teorias que explicam a natureza jurídica da Pessoa Jurídica:(Gonçalves, 2017)

1 – Negativistas

Os negativistas não concebem a existência de uma Pessoa (ente) diferente da Pessoa Física, não reconhecem, portanto, a existência da Pessoa Jurídica, enquanto ente autônomo e independente.

2 – Afirmativistas

Reconhece a existência da Pessoa Jurídica dotada de personalidade própria e buscam explicar o fenômeno:

– Teoria da Ficção legal (Savigny) – a Pessoa Jurídica ser uma criação artificial da lei, uma criação utilizada para atribuir direitos e obrigações a pessoas físicas.

– Teoria da Ficção doutrinária (Vareilles-Sommières) – a pessoa jurídica não tem existência real, mas apenas intelectual.

– Teoria da Realidade

Os adeptos dessa teoria destacam a existência da pessoa jurídica. Afirmam que são realidades vivas e não mera abstração. Abaixo as várias concepções existentes dentro dessa linha de pensamento:

– Teoria da realidade objetiva ou orgânicaSustenta que a pessoa jurídica é uma realidade sociológica, ser com vida própria, que nasce por imposição das forças sociais.

– Teoria da realidade jurídica ou institucionalistaConsidera as pessoas jurídicas como organizações sociais destinadas a um serviço ou ofício, e por isso personificadas.

– Teoria da realidade técnica – A personificação dos grupos sociais é expediente de ordem técnica, a forma encontrada pelo direito para reconhecer a existência de grupos de indivíduos, que se unem na busca de fins determinados. A personificação é atribuída a grupos em que a lei reconhece vontade e objetivos próprios.

O Código Civil vigente, em seu art. 45, segundo a doutrina, adota a Teoria da Realidade Técnica. As teorias da realidade objetiva e da realidade jurídica limitariam a abrangência das Pessoas Jurídicas.

Personalidade da Pessoa Jurídica

A existência da Pessoa Jurídica, conforme determina o art. 45 do Código Civil, começa com o registro do ato constitutivo no órgão competente.

Art. 45. Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo, averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo.

A partir dessa inscrição, a Pessoa Jurídica adquire personalidade e passa a ser sujeito de direito e deveres na ordem civil de maneira autônoma.

Pela análise do artigo destacado acima, o ato constitutivo é requisito para criação da pessoa jurídica; o ato constitutivo é fruto da vontade humana daqueles que desejam criá-la (affectio societatis). Assim, a vontade humana é o requisito subjetivo, enquanto o ato constitutivo em si (Estatuto Social, Contrato Social ou outra forma determinada por lei) é o requisito formal.

 

Classificação da Pessoa Jurídica:

Uma das principais classificações da Pessoa Jurídica é aquela que leva em conta o critério da sua função. Por este critério podem classificá-las em: Pessoas Jurídicas de Direito Público e Pessoas Jurídicas de Direito Privado.

Tal classificação é determinada no art. 40 do Código Civil:

Art. 40. As pessoas jurídicas são de direito público, interno ou externo, e de direito privado.

As pessoas jurídicas de direito público visam atender ao interesse público, enquanto as de direito privado são criadas pela vontade de particulares, e buscam atender seus interesses. (Tartuce, 2017, pág. 113)

Pessoas Jurídicas de Direito Público

Dividem-se em:

– Pessoas Jurídicas de Direito Público Externo

O art. 42 do Código Civil determina que as pessoas jurídicas de direito público externo são os Estados estrangeiros e todas as pessoas que forem regidas pelo direito internacional público. Ex: ONU, os demais países, entre outros.

– Pessoas Jurídicas de Direito Público Interno

O art. 41 do Código Civil determina que as pessoas jurídicas de direito público interno são: A União; os Estados, o Distrito Federal e os Territórios; os Municípios; as autarquias, inclusive as associações públicas; e as demais entidades de caráter público criadas por lei.

Por não constituir objeto específico do presente artigo, que trata das pessoas jurídicas regidas pelo Direito Civil, não aprofundaremos nesse ponto.

Para conhecer a estrutura e organização desses entes de direito público interno, oriento a leitura do artigo: Organização Administrativa do meu blog, basta clicar aqui.

Pessoas Jurídicas de Direito Privado

O art. 44 do Código Civil enumera essas pessoas jurídicas:

Art. 44. São pessoas jurídicas de direito privado:

I – as associações;

II – as sociedades;

III – as fundações.

IV – as organizações religiosas;

V – os partidos políticos.

VI – as empresas individuais de responsabilidade limitada.

Abaixo, um breve resumo esquemático dessas espécies de pessoas jurídicas:

* Galiano e Pamplona Filho, 2018

** Coelho, 2012

Não obstante a importância do estudo de todas as espécies de Pessoas Jurídicas de Direito Privado, traçarei abaixo breves comentários acerca das Associações e Fundações, figuras destacadas pelo Código Civil vigente.

Associações

As associações são formadas pela vontade em comum de pessoas que buscam a execução de determinada finalidade NÃO ECONÔMICA. O destaque ao termo “não econômica” é necessário, pois, havendo esse interesse, a pessoa jurídica deixa de assumir a forma de associação e passa a ter natureza de SOCIEDADE.

A associação pode ter como finalidade, por exemplo, a proteção e defesa dos animais, a representação dos interesses dos moradores de determinado bairro, a defesa dos interesses de determinada classe de pessoas. Enfim, toda e qualquer finalidade LÍCITA e não econômica é possível às associações.

Como dito anteriormente, o ato constitutivo da Associação é o ESTATUTO SOCIAL, que determinará os regramentos da instituição. O art. 54 do Código Civil elenca o conteúdo mínimo desse estatuto:

Art. 54. Sob pena de nulidade, o estatuto das associações conterá:

I – a denominação, os fins e a sede da associação;

II – os requisitos para a admissão, demissão e exclusão dos associados;

III – os direitos e deveres dos associados;

IV – as fontes de recursos para sua manutenção;

V – o modo de constituição e funcionamento dos órgãos deliberativos e administrativos;

V – o modo de constituição e de funcionamento dos órgãos deliberativos;

VI – as condições para a alteração das disposições estatutárias e para a dissolução.

VII – a forma de gestão administrativa e de aprovação das respectivas contas;

O Estatuto Social funcionará como se fosse uma lei interna da Associação. Todos os associados devem respeito e observância a ele. É possível até mesmo a propositura de ação judicial para se fazer cumprir determinada disposição estatutária.

O estatuto confere segurança aos membros da associação e regula suas atividades internas e externas.

Os arts. 53 a 61 do Código Civil (oriento a leitura) trazem a normatização básica para as Associações, e destaca de maneira bastante clara a função e importância do estatuto social.

Fundações

Diferentemente das associações, as fundações não são formadas pela união de pessoas para determinados fins, mas sim, pela universalidade de bens, personalizadas pela ordem jurídica, em consideração a um fim estipulado pelo fundador.

Em outras palavras, a fundação nasce da entrega de determinados bens para sua criação. Nasce da vontade de uma pessoa que doa parte do seu patrimônio para constituição da Fundação.

Ex: Edmar é um jogador de futebol e deseja criar uma entidade para atender crianças carentes de um bairro da sua cidade natal. Resolve então doar parte do seu patrimônio para realização dessa finalidade. Esse patrimônio destacado será a base para criação de uma Fundação.

As fundações costumam utilizar o termo “Instituto”.

Os passos para a criação de uma fundação são os seguintes:

– A dotação de bens pode ser feito por ato “inter vivos” (escritura pública) ou “causa mortis” (testamento). O instituidor nesse ato reserva bens necessários à criação da Fundação.

Nesse ato ele deve determinar a finalidade da Fundação e até mesmo a maneira como será administrada. O parágrafo único do art. 62 elenca as finalidades que a Fundação deve perseguir:

Art. 62. (…)

Parágrafo único. A fundação somente poderá constituir-se para fins de:

I – assistência social;

II – cultura, defesa e conservação do patrimônio histórico e artístico;

III – educação;

IV – saúde;

V – segurança alimentar e nutricional;

VI – defesa, preservação e conservação do meio ambiente e promoção do desenvolvimento sustentável;

VII – pesquisa científica, desenvolvimento de tecnologias alternativas, modernização de sistemas de gestão, produção e divulgação de informações e conhecimentos técnicos e científicos;

VIII – promoção da ética, da cidadania, da democracia e dos direitos humanos;

IX – atividades religiosas;

Se os bens destacados forem insuficientes para constituir a fundação, os bens a ela destinados serão, se de outro modo não dispuser o instituidor, incorporados em outra fundação que se proponha a fim igual ou semelhante.

Elaboração do Estatuto pode ser feita de maneira direta (pelo próprio instituidor) ou fiduciária (quando o instituidor determina pessoa de sua confiança para elaboração). Elaborado o Estatuto, ele será apresentado para análise e aprovação.

Caso o estatuto não seja elaborado no prazo determinado pelo instituidor ou em 180 dias (caso não tenha sido estipulado prazo específico), caberá ao Ministério Público o ônus de confeccioná-lo e apresentá-lo para aprovação.

– A Aprovação do Estatuto caberá ao Ministério Público. Nos casos em que o próprio Ministério Público elabora o estatuto, a aprovação caberá ao juízo competente.

– Após aprovação o Registro será feito no cartório competente.

Eventuais alterações no Estatuto devem também ser aprovadas pelo Ministério Público, na forma do art. 67 do Código Civil.

O art. 69 do Código Civil dispõe acerca da extinção da Fundação.

Extinção das Pessoas Jurídicas

A dissolução da Pessoa Jurídica poderá ser feita pela via:

– Convencional

Por deliberação (pela vontade) dos membros que compõem a pessoa jurídica. Importante lembrar, que essa deliberação deve observar o que determina o ato constitutivo.

– Legal

Em razão de motivo determinante previsto na legislação. Ex: Falência.

– Administrativa

Regra geral, as pessoas jurídicas não necessitam de autorização do Poder Público para ser criadas. Elas devem apenas observar os requisitos estabelecidos em lei. Porém, excepcionalmente, há certas atividades que dependem de autorização do ente público.

Para estas pessoas jurídicas, haverá dissolução na hipótese em que a autorização administrativa é cassada, seja por infração a disposição de ordem pública ou prática de atos contrários aos fins declarados no seu estatuto, seja por se tornar ilícita, impossível ou inútil a sua finalidade.

– Judicial

Ocorrerá quando se configurar alguma das hipóteses para dissolução previstas em lei ou no estatuto, mas ainda assim, a pessoa jurídica continua a exercer suas atividades normalmente. Nesse caso, a via judicial deverá ser utilizada para extinção da pessoa jurídica.

Desconsideração da Personalidade Jurídica

Uma das regras claras relacionadas às Pessoas Jurídicas é que o seu patrimônio não se mistura com o patrimônio dos sócios, ou seja, as obrigações assumidas pela Pessoa Jurídica devem ser suportadas pelo seu próprio patrimônio.

Não é possível invadir patrimônio dos sócios nos casos em que a Pessoa Jurídica não consegue arcar com seus compromissos.

Esta é a regra.

Contudo, existem hipóteses em que é possível buscar o patrimônio dos sócios para quitar obrigações da pessoa jurídica. O art. 50 do Código Civil disciplina essa desconsideração.

Esse artigo foi alterado recentemente pela Lei 13.874/2019, que tratou de especificar e aclarar os contornos da desconsideração, nos seguintes termos:

Art. 50.  Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso. (Redação dada pela Lei nº 13.874, de 2019)

§ 1º  Para os fins do disposto neste artigo, desvio de finalidade é a utilização da pessoa jurídica com o propósito de lesar credores e para a prática de atos ilícitos de qualquer natureza. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

§ 2º Entende-se por confusão patrimonial a ausência de separação de fato entre os patrimônios, caracterizada por: (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

I – cumprimento repetitivo pela sociedade de obrigações do sócio ou do administrador ou vice-versa; (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

II – transferência de ativos ou de passivos sem efetivas contraprestações, exceto os de valor proporcionalmente insignificante; e (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

III – outros atos de descumprimento da autonomia patrimonial. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

§ 3º  O disposto no caput e nos §§ 1º e 2º deste artigo também se aplica à extensão das obrigações de sócios ou de administradores à pessoa jurídica. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

§ 4º  A mera existência de grupo econômico sem a presença dos requisitos de que trata o caput deste artigo não autoriza a desconsideração da personalidade da pessoa jurídica. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

§ 5º  Não constitui desvio de finalidade a mera expansão ou a alteração da finalidade original da atividade econômica específica da pessoa jurídica. (Incluído pela Lei nº 13.874, de 2019)

Presentes os requisitos, é possível pleitear judicialmente a desconsideração.

Vamos a um exemplo:

A Empresa do qual Joaquim é sócio contrata empréstimo com banco. Mas Joaquim utiliza o dinheiro para adquirir patrimônio para si, ao invés de utilizar nas finalidades da empresa. A empresa não pagou ao banco o referido empréstimo. O Banco resolve entrar com ação judicial para receber seu crédito, mas quando procura bens da empresa para penhorar, verifica que não há nada em seu nome. O Banco pode, em tese, alegar que houve confusão patrimonial e assim, solicitar ao juízo a desconsideração da personalidade jurídica. Caso o juiz conceda, o patrimônio do sócio poderá responder pelas obrigações da Empresa.

Há ainda a possibilidade da desconsideração inversa. Hipótese em que é possível buscar os bens da pessoa jurídica para cumprir obrigações da pessoa física (sócio).

Desconsideração x Despersonificação

Não confunda os dois institutos. Na desconsideração, a empresa continua existindo, sua personalidade é apenas desconsiderada com a finalidade de alcançar patrimônio do sócio para situação específica.

Já na despersonificação a empresa deixa de existir, ela perde sua personalidade. Estudamos nesse artigo as hipóteses de dissolução da Pessoa Jurídica, pois bem, com a dissolução ocorre a despersonificação da empresa.

Em outras palavras, com a extinção da empresa ocorre a sua despersonificação (perda da personalidade).

Entes Despersonalizados

São agrupamentos de pessoas ou bens, às quais a lei não reconhece personalidade jurídica, mas que podem, nas palavras de DINIZ, agir ativa e passivamente; podem figurar como sujeitos em demandas judiciais, mediante representação.

São entes que, apesar do nosso ordenamento não reconhecer-lhes personalidade, podem atuar na ordem jurídica visando proteger os seus interesses.

Exemplos: Massa falida, espólio, o condomínio, entre outros.

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Fato Jurídico

Fato Jurídico

O fato jurídico é um dos conceitos de maior relevância dentro do direito, pois, toda e qualquer situação analisada sob o ponto de vista jurídico tem como fundamento o fato jurídico. É a partir da análise desse instituto do direito que é possível verificar a incidência de uma ou outra norma.

Segundo Venosa (2017, pág. 336), são fatos jurídicos todos os acontecimentos, eventos que, de forma direta ou indireta, acarretam efeito jurídico.

Os acontecimentos, de maneira geral, são apenas fatos comuns. O que os caracterizam como fato jurídico são as conseqüências que podem acarretar no mundo jurídico.

A chuva, por si só, é um simples fato.  A chuva que causa inundações, trazendo prejuízos à população é um fato jurídico. Observe que a chave da discussão não está no fato individualmente considerado, mas sim, na sua importância para o direito.

Quando um jovem completa 17 anos de idade, temos um fato comum. Por outro lado, quando esse mesmo jovem completa 18 anos, o que verificamos é um fato jurídico, pois a lei determina que a partir daí ele ganha capacidade plena e, poderá, pessoalmente, figurar como sujeito de direitos e deveres.

Classificação do Fato Jurídico

A classificação mais usual do Fato Jurídico é a que o divide em: Fatos Naturais e Fatos Humanos, conforme abaixo discriminado:

Fatos Naturais

Os fatos naturais são também chamados de Fatos Jurídicos stricto sensu (em sentido estrito). São os fatos jurídicos que não dependem da ação humana, ocorrem pela força da natureza, como, por exemplo, a chuva, o nascimento, a morte, etc.

Nesse ponto, há outra classificação igualmente importante, conforme se vê na figura acima. Os fatos naturais se dividem em ordinários e extraordinários.

– Ordinários: São aqueles que ocorrem normalmente, como o nascimento, morte, etc.

– Extraordinários: São acontecimentos excepcionais, como grandes enchentes, entre outros.

Fatos Humanos

 

Os fatos humanos são também chamados de Atos Jurídicos lato sensu (em sentido amplo). São os fatos jurídicos que dependem da ação humana, isto é, a ação humana é o elemento essencial para sua ocorrência, como, por exemplo, um contrato, testamento, etc.

Os fatos humanos se dividem em: Ilícitos e Lícitos.

Atos Ilícitos:

São atos praticados com violação a alguma norma ou em desacordo com o que se encontra estabelecido pelo ordenamento jurídico. No nosso ordenamento o ato ilícito é gerador de obrigações.

Assim, cometido determinado ato ilícito, cabe ao ofendido o direito à reparação cível (indenização). É o que estabelece o art. 186 e 927 do Código Civil:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Exemplo bastante comum de ato ilícito é o caso de empresas que inscrevem em cadastro de inadimplentes (SPC, SERASA, por exemplo) os dados de consumidor que não possui débitos. Esse ato ilícito gera direito à reparação pelos danos causados ao consumidor.

Atos Lícitos:

Os atos lícitos, por sua vez, se conformam ao nosso ordenamento de maneira plena. Segundo os ensinamentos de Gonçalves (2017, pág. 346), lícitos são os atos humanos a que a lei defere os efeitos almejados pelo agente.

Os atos lícitos se classificam em: Ato Jurídico em sentido estrito, Negócio Jurídico e Ato-fato Jurídico.

Ato Jurídico em sentido estrito:

São aqueles atos em que o agente pode manifestar vontade de realizá-lo, porém, não consegue estabelecer seus contornos e efeitos, pois são determinados pela própria lei.

Um exemplo bem interessante é o ato de reconhecimento de filho. Não é possível escolher quais as conseqüências legais desse ato, pois elas já se encontram determinadas na norma.

Negócio Jurídico:

O negócio jurídico é o acordo de vontades, que surge da participação humana e projeta efeitos desejados e criados por ela, tendo por fim a aquisição, modificação, transferência ou extinção de direitos. (Farias e Rosenvald, 2017,pág. 603)

Importante observar que, enquanto no ato jurídico os efeitos estão predeterminados na norma, no negócio jurídico é a autonomia da vontade que impera. As partes determinam os limites do negócio.

Ato-Fato Jurídico

No ato-fato jurídico a manifestação da vontade do agente não qualifica o ato, ou seja, não é relevante para que o ordenamento reconheça e proteja o ato realizado.

Gagliano e Pamplona Filho (2017, pág. 300) destacam:

No ato-fato jurídico, o ato humano é realmente da substância desse fato jurídico, mas não importa para a norma se houve, ou não, intenção de praticá-lo. O que se ressalta, na verdade, é a consequência do ato, ou seja, o fato resultante, sem se dar maior significância se houve vontade ou não de realizá-lo.

Os autores citados citam exemplo da compra e venda feita por crianças. Ex: Uma criança vai até um estabelecimento comercial e compra um doce; em tese, estaríamos diante de um contrato de compra e venda nulo, pois a criança não poderia, pessoalmente realizar esse negócio, por faltar-lhe capacidade plena.

Segundo os autores, essa hipótese se enquadraria como ato-fato jurídico, dotado, portanto, de ampla aceitação social.

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Maioridade Civil, Emancipação e Fim da Personalidade

Maioridade Civil, Emancipação e Fim da Personalidade

Conforme discutimos no artigo anterior, (Personalidade Jurídica e Capacidade) a personalidade jurídica da pessoa inicia com o nascimento com vida, acompanhando o que determina o art. 2º do Código Civil.

Neste post apresentarei os aspectos jurídicos que envolvem a
maioridade civil, emancipação e o fim da personalidade jurídica.

Assista minha videoaula sobre Maioridade Civil e EmancipaçãoClique aqui.

Assista minha videoaula sobre Fim da PersonalidadeClique aqui.

Maioridade Civil

A maioridade civil é um momento marcante na vida da pessoa, pois, a partir daí torna-se plenamente capaz. O que importa a possibilidade de exercer pessoalmente os atos da vida civil.

Em um conceito mais simplista poderíamos dizer que a incapacidade cessa aos 18 anos de idade, momento em que a pessoa atinge a maioridade civil.

Tal idade é determinada pelo art. 5º do Código Civil:

Art. 5o A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil.

De maneira mais ampla, o critério idade é apenas um dos que são utilizados pelo Código Civil para determinação do momento em que a incapacidade cessa.

Por exemplo, os pródigos e ébrios habituais são relativamente incapazes. Para eles, a cessação da incapacidade não tem a ver com a idade e sim com os fatores que os levaram a esse estado.

Cessado o vício ou a dependência química que os impediam de exprimir a vontade, é possível o levantamento da interdição. Assim, sairiam do status de incapacidade relativa para o de capacidade plena.

Atingida a capacidade plena, a pessoa estará apta para exercer PESSOALMENTE os atos da vida civil e também responsabilizar-se, patrimonialmente, por eles.

Emancipação

O nosso ordenamento jurídico prevê hipóteses em que é possível antecipar a maioridade civil, ou seja, situações em que é possível à pessoa atingir a capacidade plena antes dos 18 anos de idade.

Na lição de Farias e Rosenvald (2017, p.386), a emancipação representa a aquisição da capacidade civil antes da idade legalmente prevista.

A doutrina, acompanhando o que determina o parágrafo único do art. 5º classifica a emancipação em 03 espécies: Voluntária, Judicial e Legal.

Emancipação Voluntária

A emancipação voluntária ocorre pela concessão dos pais, ou seja, os pais voluntariamente podem emancipar o filho. Ressalto que não se trata de direito subjetivo do menor, mas sim dos pais.

Está prevista no art. 5º, parágrafo único, incio I, primeira parte do Código Civil.

Havendo plena concordância dos pais, a emancipação será realizada via instrumento público no cartório competente. Não há necessidade de homologação judicial e o menor deverá contar com 16 anos de idade.

A finalidade da emancipação é, basicamente, a antecipação dos efeitos da capacidade plena, que pode ter várias causas, por exemplo, o menor que se mudará de cidade e necessitará assinar documentos e contrair obrigações, entre outras.

Quando não há concordância entre os pais, é necessário buscar o suprimento dessa concessão pela via judicial, o que não descaracteriza a emancipação voluntária.

A emancipação é irrevogável, sendo possível apenas a sua anulação nos casos em que for realizada sem a observância dos requisitos legais.

Emancipação Judicial

Nas situações em que o menor está sob tutela, a emancipação deve ser realizada pela via judicial.

O tutor não possui a prerrogativa, como os pais, para a concessão voluntária da emancipação, tendo em vista que exerce um encargo público.

Emancipação Legal

As espécies de emancipação anteriores devem ser realizadas por instrumento público lavrado no cartório competente. Já a emancipação legal não depende da realização dessa formalidade, basta o preenchimento dos requisitos determinados por lei, previstos nos incisos II, III, IV e V do parágrafo único do art. 5º do Código Civil.

Emancipação legal pelo Casamento

O menor que atingiu a idade núbil (16 anos) pode casar-se, desde que autorizado por seus representantes legais, é o que determina o art. 1.517 do Código Civil.

Realizado o casamento, o menor se torna CAPAZ (art. 5º, parágrafo único, inciso II do Código Civil).

Eventual divórcio ou morte do outro cônjuge não importa em retorno ao estado de incapacidade. Uma vez emancipado pelo casamento, o menor se torna capaz e não retornaria ao estado de incapacidade relativa pelos motivos ora expostos.

Apenas a anulação do casamento poderia retornar o menor ao estado de incapacidade relativa.

Emancipação legal pelo exercício de emprego público efetivo

A previsão dessa forma de emancipação nos força a buscar no direito administrativo o significado dos termos “emprego público efetivo”, o que limitaria bastante o alcance dessa espécie emancipatória.

Para o direito administrativo empregado público não é o mesmo que servidor público. Da mesma forma, emprego público efetivo não é o mesmo que emprego público (que englobaria também os cargos comissionados – mais conhecidos como cargos de confiança, que não dependem de concurso). Assim o inciso nos leva ao entendimento de que a pessoa teria que ter ingressado no serviço público através de concurso.

Abrindo mão do emprego formal e estrito do conceito de emprego público efetivo, entendo, corroborando Gonçalves (2017), que a interpretação que deve ser dada é a mais ampla possível, de forma a absorver os casos de vínculo formal entre trabalhador e ente público, independentemente de ter ingressado via concurso ou contratação direta.

Assim ensina Gonçalves (2017, p. 145): O fato de ter sido admitido no serviço público já denota maturidade e discernimento, máxime quando a simples existência de relação de emprego, com estabelecimento de economia própria, é hoje suficiente para a emancipação (art. 5º, parágrafo único, V).

Desta forma ao entrar em exercício junto ao Poder Público, a pessoa preenche os requisitos dessa emancipação legal.

Noutro rumo, alguns doutrinadores afirmam que é necessário que a pessoa esteja em exercício, ou seja, caso seja demitido ou exonerado antes de completar 18 anos, voltaria ao status de incapacidade relativa. Contudo, boa parte da doutrina entende que tal pensamento encontra-se ultrapassado.

Emancipação legal pela colação de grau em curso de ensino superior

Terminado o curso superior, com a conseqüente colação de grau, a pessoa torna-se capaz.

Emancipação legal pelo estabelecimento civil, comercial ou existência de relação de emprego

Neste ponto, parece-me que o legislador vinculou a capacidade civil plena à capacidade financeira da pessoa. Essas três hipóteses denotam situações em que o menor possui renda própria, ao menos em tese, e, portanto, é capaz, do ponto de vista financeiro, de agir autonomamente.

 

Importante:

A emancipação antecipa a capacidade plena do menor, porém, se restringe ao âmbito cível. Significa dizer, que a emancipação não torna o menor apto a realizar todas as atividades reservadas por lei a maiores de 18 anos.

Assim, o emancipado não pode, por exemplo, possuir carteira de habilitação. O menor emancipado não se torna penalmente imputável.

Uma situação interessante: O Tribunal de Minas tem decidido que o menor emancipado não pode realizar provas supletivas do ensino médio como as do Programa ENCCEJA (Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos). Essas provas são direcionadas para aqueles que possuem 18 anos ou mais.

Vamos revisar o tema ouvindo uma música (paródia)Clique aqui.

Fim da Personalidade Natural

O nascimento marca o início da Personalidade da Pessoa Natural, logo, a morte marca o fim da Personalidade.

Art. 6o A existência da pessoa natural termina com a morte; presume-se esta, quanto aos ausentes, nos casos em que a lei autoriza a abertura de sucessão definitiva.

A morte ocorre quando cessam as funções vitais do indivíduo, e, consequentemente, ocorre a parada do sistema cardiorrespiratório. Atualmente, o critério levado em conta para aferição da morte é o da chamada morte encefálica, em que há a cessação da atividade cerebral, devido ao seu caráter irreversível. (Gagliano, 2017)

O conceito acima exposto é o da chamada Morte Real.

Tal morte deve ser atestada por médico ou por duas testemunhas, nas localidades onde não há profissionais da medicina, conforme determina a Lei 6.015/73.

Com a morte ocorre a extinção da pessoa natural e da sua personalidade. Contudo, alguns elementos do direito da personalidade persistem ainda após a morte, conforme veremos num próximo artigo.

Morte Presumida

O legislador foi sensível àquelas situações em que há uma probabilidade muito grande da morte de determinada pessoa, mas não existe uma certeza absoluta, pois o corpo não foi encontrado para análise.

Nestes casos temos a chamada morte presumida, isto é, situações traçadas na lei em que não há possibilidade de se atestar a morte real, mas as circunstâncias levam ao entendimento que a pessoa faleceu.

A morte presumida pode ser declarada:

– Com decretação de ausência

– Sem decretação de ausência

Ausência ocorre nas situações em que a pessoa desaparece do seu domicílio sem deixar notícias ou representante. E, ainda, nos casos em que deixa representante e o mesmo não pode ou não quer assumir a representação.

Só haverá declaração de morte presumida com decretação de ausência, após a abertura da sucessão definitiva.

Quer saber um pouco mais sobre ausência e o procedimento para arrecadação e curadoria dos bens? Clique aqui

Já a declaração de morte presumida sem decretação de ausência ocorrerá nas hipóteses elencadas no art. 7º do Código Civil:

Art. 7o Pode ser declarada a morte presumida, sem decretação de ausência:

I – se for extremamente provável a morte de quem estava em perigo de vida;

II – se alguém, desaparecido em campanha ou feito prisioneiro, não for encontrado até dois anos após o término da guerra.

Observe que nesses casos, a possibilidade de encontrar a pessoa com vida é ínfima, daí a autorização legal para declaração da morte presumida.

Importante destacar que o parágrafo único desse art. 7º determina que tal declaração somente poderá ser requerida depois de esgotadas as buscas e averiguações, devendo a sentença fixar a data provável do falecimento.

Comoriência (Morte Simultânea)

O art. 8º do Código Civil assim dispõe:

Art. 8o Se dois ou mais indivíduos falecerem na mesma ocasião, não se podendo averiguar se algum dos comorientes precedeu aos outros, presumir-se-ão simultaneamente mortos.

Assim, a comoriência é, na verdade, uma presunção de simultaneidade de óbitos (Farias, 2017, p.405).

Para muitos, sobretudo aqueles menos ligados ao direito civil, o conceito e regulamentação da comoriência não possui qualquer relevância. Porém, se analisada sob a ótica do direito sucessório, o conceito ganha vultosa importância.

Na comoriência, como não é possível precisar quem faleceu primeiro, considera-se que morreram ao mesmo tempo. Se houve morte simultânea, nenhum dos mortos sucedeu ao outro.

Como assim?

No direito sucessório, havendo a morte de alguém, outra pessoa o sucederá, por exemplo, o pai morre e o filho o sucede. Caso o pai tenha bens, esses bens serão herdados pelo filho.

Gagliano (2017, p. 93) traz exemplo interessante para compreensão da relevância dessa temática:

João e Maria, casados entre si, sem descendentes ou ascendentes vivos. Falecem por ocasião do mesmo acidente. Pedro, primo de João, e Marcos, primo de Maria, concorrem à herança dos falecidos. Se a perícia atestar que João faleceu dez minutos antes de Maria, a herança daquele, à luz do princípio da saisine e pela ordem de vocação legal, seria transferida para a sua esposa e, posteriormente, após se agregar ao patrimônio dela, arrecadada por Marcos. A solução inversa ocorreria se Maria falecesse antes de João. Ora,em caso de falecimento sem possibilidade de fixação do instante das mortes, firma a lei a presunção de óbito simultâneo, o que determinará a abertura de cadeias sucessórias distintas. Assim, nessa hipótese, não sendo os comorientes considerados sucessores entre si, não haverá transferência de bens entre eles, de maneira que Pedro e Marcos arrecadarão a meação pertencente a cada sucedido.

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LINDB (Decreto Lei 4.657/1942) – Noções Introdutórias

LINDB – Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto Lei 4.657/1942)

Direito Civil: Noções Introdutórias

 

  • Lei ou Decreto-lei?

Apesar de ser conhecida como Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, na verdade, essa norma é um decreto-lei, muito utilizada na história recente do nosso país, em fase anterior à Constituição Federal de 1988.

A exclusão de tal tipo de norma do nosso ordenamento teve como causa o fato de que ela não passava pelo Poder Legislativo para ter força de lei (era emanada diretamente do Poder Executivo), o que muito a aproximava às medidas provisórias da atualidade. Porém, a medida provisória é temporária, enquanto o decreto-lei era permanente, assim como a lei.

Portanto, decretos-leis anteriores à Constituição Federal de 1988 continuam a ter vigência normalmente, desde que não contrariem a própria Constituição. Como é o caso do Código Penal (Decreto-lei 2.848/1940) e a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (Decreto-lei 4.657/1942).

 

Lei de Introdução ao Código Civil ou Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro

 

Inicialmente, o Decreto-lei 4.657/1942 era conhecido como Lei de Introdução ao Código Civil (LICC). Tal nome nunca se adequou ao conteúdo que a norma de fato trazia. Afinal, esse decreto-lei regula vários aspectos da aplicação e interpretação das normas de direito privado e de direito público e não apenas do direito civil.

Apenas em 2010, com a Lei 12.376/2010 é que seu nome foi alterado para Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB – DECRETO LEI 4.657/42), o que se amoldou melhor ao seu conteúdo.

 

Neste artigo abordaremos apenas aspectos conceituais importantes dispostos nos primeiros artigos dessa norma, para facilitar o estudo do direito Civil.

 

Vigência da Lei

 

O art.1º da LINDB (Decreto-lei 4.657/1942), assim determina:

Art. 1o  Salvo disposição contrária, a lei começa a vigorar em todo o país quarenta e cinco dias depois de oficialmente publicada.

O artigo primeiro da LINDB – DECRETO LEI 4.657/42, determina aspectos acerca da vigência das leis, estabelecendo um período de vacatio legis mínimo, nas hipóteses em que a própria lei não disponha de maneira diferente.

Regra geral, no texto da própria lei existe dispositivo determinando o momento de início da sua vigência, ou seja, o momento em que as normas ali estabelecidas poderão ser aplicadas.

Por exemplo, o Código Civil atual é a lei 10.406/2002. O seu art. 2.044 diz o seguinte:

Art. 2.044. Este Código entrará em vigor 1 (um) ano após a sua publicação.

Neste caso, apenas 01 ano após a publicação é que as normas dispostas no Código Civil foram efetivadas. Este período compreendido entre a publicação da lei a e sua vigência efetiva (momento em que passa a ser obrigatória) é denominado de VACATIO LEGIS.

Esse é o período de vacância da lei. Estabelecido para que o próprio Estado se organize no sentido de possibilitar os direitos assegurados pela norma. Para que a população em geral conheça a norma. É o momento para as adequações necessárias para a vigência da norma.

Quando a própria lei não estabelece o momento de início da sua vigência, é necessário recorrer ao art. 1º da LINDB – DECRETO LEI 4.657/42, isto é, o prazo a ser observado é de 45 dias entre a publicação e a vigência.

 

É possível que uma lei tenha vigência imediata?

Sim. Existe no nosso ordenamento uma infinidade de leis que tiveram vigência imediata.

Por exemplo, a lei 12.376/2010, citada no início desse texto. O art.3º dessa lei, assim dispõe:

Art. 3o  Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

A vigência imediata só é possível quando a lei expressamente determina, pois quando a norma é omissa, vale a regra do art. 1º da LINDB – DECRETO LEI 4.657/42, qual seja, 45 dias de vacatio legis.

 

E nos Estados estrangeiros (fora do país), como funciona?

Quando admitida a aplicação da lei brasileira fora do seu território, aplica-se o §1º do art. 1º da LINDB – DECRETO LEI 4.657/42, que assim estabelece:

§ 1oNos Estados, estrangeiros, a obrigatoriedade da lei brasileira, quando admitida, se inicia três meses depois de oficialmente publicada.

Observe que o prazo de vacatio legis é maior nesses casos.

 

A Lei pode ser alterada antes do início de sua vigência?

Sim. Se estivermos diante de situação em que o texto da lei foi publicado novamente apenas por conta algum erro material ou ortográfico, o prazo para início da sua vigência começa a correr da nova publicação. É o que diz o §3º da LINDB – DECRETO LEI 4.657/42:

§3– Se, antes de entrar a lei em vigor, ocorrer nova publicação de seu texto, destinada a correção, o prazo deste artigo e dos parágrafos anteriores começará a correr da nova publicação.

Entretanto, caso ocorra uma alteração real do texto da lei (modificação do seu conteúdo), temos outro procedimento.

Antes de entrar nessa discussão, vamos entendermos alguns conceitos importantes.

Abaixo, temos um fluxo bem didático e sucinto do processo de formação da lei.

Durante o processo legislativo (processo de formação da lei), o projeto pode ser alterado a qualquer momento. Porém, após a sanção, promulgação e publicação, a lei se torna válida e vigente.

A partir daí, qualquer alteração em seu texto, apenas poderá ser feito por outra lei.

Voltando à resposta para pergunta acima, é possível que no período de vacatio legis (ou seja, antes do início de sua vigência) a lei seja alterada. Porém, deve ser alterada por outra lei.

Nestes casos, assim prevê o §4º do art. 1º da LINDB – DECRETO LEI 4.657/42:

§4oAs correções a texto de lei já em vigor consideram-se lei nova.

 

Princípio da Vigência Sincrônica?

Por este princípio, a lei entra em vigência a um só tempo em todo o país. A lei entra em vigor simultaneamente em todo o país, após o período de vacatio legis.

 

Qual o tempo de vigência de uma lei?

Normalmente uma lei nasce para ter duração infinita, ou seja, ela nasce e terá vigência até que outra lei a modifique ou altere.

Isso reflete a ideia do chamado Princípio da Continuidade Normativa ou, simplesmente, Princípio da Continuidade.

Nas palavras de Farias e Rosenvald (2017, p. 139): Excetuados os casos especiais, com expressa previsão normativa, a lei tem caráter permanente, vigendo até que outra venha a lhe revogar, expressa ou tacitamente.

O art. 2º da LIND consagra tal princípio:

Art. 2o  Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue.

 

O que é revogação?

A revogação ocorre quando determinada lei ou artigo de lei perde sua vigência por ter sido substituída ou simplesmente excluída por força de outra lei.

Ex: A lei 3.071 de 1916 estabeleceu o Código Civil. Esta lei foi revogada pela lei 10.406 de 2002 que trouxe o novo Código Civil (vigente)

Neste exemplo a lei 3071/16 foi excluída do nosso ordenamento (deixou de ter vigência) e em seu lugar passou a ter validade (vigência) a lei 10.406/2002.

A revogação de uma lei pode ser:

– Expressa (ou por via Direta): Quando a lei revogadora trata de maneira específica em seu texto acerca da revogação

– Tácita (ou por via Oblíqua): Quando a lei revogadora não trata diretamente acerca da revogação, porém, regula a mesma matéria daquela legislação anterior ou é incompatível com ela.

O §1o do art. 2º da LINDB – DECRETO LEI 4.657/42, determina:

A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.

Caso a lei nova trace dispositivos que complementem a legislação anterior, então não estaremos diante de hipótese de revogação.

§2o – A lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a lei anterior.

Além de expressa e tácita, a revogação pode ser ainda:

– Parcial: Quando revoga apenas parte de determinada lei. Também é chamada de derrogação

– Total: Quando revoga toda a lei anterior. Também é chamada de ab-rogação

 

Quando uma lei é revogada, a lei anterior a ela, caso exista, volta a ter vigência?

Vou explicar melhor a pergunta, imagine a seguinte situação (fictícia):

A lei 10.000 regula as atividades de vendedor na feira. Alguns anos depois, essa lei foi revogada pela lei 11.000, que passou a ter vigência e regular as atividades de vendedor na feira de modo diferente. Posteriormente essa lei foi revogada pela lei 12.000.

O quadro é o seguinte:

– Lei 10.000 revogada pela Lei 11.000

– Lei 11.000 revogada pela Lei 12.000

Adaptando a pergunta a esse caso fictício: A Lei 10.000 voltaria a ter vigência, uma vez que a Lei que a revogou (Lei 11.000) acabou sendo revogada pela Lei 12.000?

A resposta é NÃO. Uma vez revogada a Lei não voltará a ter vigência.

Isso porque a ordenamento jurídico não autoriza (veda) a Repristinação como regra.

 

O que é Repristinação?

Repristinação seria a hipótese em que uma lei já revogada volta a ter vigência. Ela voltaria a ter vigência, pois a lei que a revogou também foi revogada.

No Brasil não é admitida a Repristinação como regra. É até possível, desde que haja expressa disposição legal, ou seja, desde que a lei expressamente assim determine.

Existe exceção a essa regra, mas não nos cabe nesse momento analisar.

O §3o  do art. 2º da LINDB – DECRETO LEI 4.657/42, esclarece toda a questão:

Salvo disposição em contrário, a lei revogada não se restaura por ter a lei revogadora perdido a vigência.

 

Princípio da Obrigatoriedade Normativa

Este princípio significa que a lei a todos obriga. Ninguém pode se negar a cumprir o que a lei determina.

Art. 3o (LINDB – DECRETO LEI 4.657/42) Ninguém se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece.

O desconhecimento da lei não pode ser alegado com a finalidade de não cumpri-la. Publicada, a lei se torna, ao menos em tese, conhecida por todos. Não importa onde a pessoa viva, na Capital do país ou no interior.

Devido ao grande número de leis existentes em nosso país, alguns autores entendem que tal princípio deve ser visto com ressalvas.

 

Existe lei para qualquer situação?

Infelizmente não. É impossível ao legislador prevê todas as possibilidades para criar legislações para enfrentá-las. Mas, neste caso, o que fazer quando não há lei que fundamente determinada conduta ou direito?

O juiz pode simplesmente deixar de julgar?

Quando não existe uma legislação específica para determinada situação costumamos dizer que existe uma “lacuna”, ou seja, existe um buraco.

Segundo o art. 4º da LINDB – DECRETO LEI 4.657/42, quando o juiz está diante de uma lacuna da lei ele não pode se negar a julgar o caso, ele deve utilizar as demais fontes do direito.

Art. 4o  Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.

Assim, é possível afirmar que existe omissão da lei ou lacuna na lei, por outro lado, no direito não existe lacuna ou omissão. Daí a conclusão de que o direito não é formado apenas por leis (regras), mas também pelos costumes, analogia e princípios.

Importante destacar que as lacunas são da lei, não do DIREITO

Diante de uma situação em que não há lei específica, o juiz deve utilizar-se das outras fontes do direito. Podemos discutir com maior profundidade sobre as fontes em outro artigo.

Complementando a ideia inserida no art. 4º da LINDB – DECRETO LEI 4.657/42, vemos o seu art. 5º:

Art. 5o  Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.

Observe que, novamente, a LINDB – DECRETO LEI 4.657/42, demonstra que o ordenamento jurídico é composto não só pelas regras (leis) e, no momento da aplicação, o juiz deve utilizar as demais fontes. Neste caso, deve observar os fins sociais a que se dirige e às exigências do bem comum.

 

Princípio da Irretroatividade

Por fim, temos o princípio da Irretroatividade. Ele determina que a lei seja aplicada a partir do momento que inicia sua vigência, não atingindo situações passadas.

Um dos grandes pilares deste princípio é a segurança jurídica. As situação concretizadas com base em determinada lei, não podem ser modificadas, por exemplo, se depois de muitos anos esta lei foi revogada.

Se assim fosse, viveríamos, eternamente, em situação de conflito. Pois a lei que resolveu determinada demanda, poderia, a qualquer momento, ser revogada, e instalar novamente a discussão.

A ideia da irretroatividade é exatamente trazer segurança jurídica. Se determinado ato foi consolidado na vigência de uma lei, este ato está perfeito e não se modifica por ter a lei que lhe deu base sido revogada posteriormente.

O art. 6º da LINDB – DECRETO LEI 4.657/42, esclarece:

Art. 6º A Lei em vigor terá efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.

Terá efeito imediato e geral, ou seja, “daqui pra frente”, não retroage.

Os parágrafos do art. 6º da LINDB – DECRETO LEI 4.657/42, explicam as situações que não são alcançadas por esta nova lei.

§1º Reputa-se ato jurídico perfeito o já consumado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou.

§2º Consideram-se adquiridos assim os direitos que o seu titular, ou alguém por êle, possa exercer, como aquêles cujo comêço do exercício tenha têrmo pré-fixo, ou condição pré-estabelecida inalterável, a arbítrio de outrem.

§3º Chama-se coisa julgada ou caso julgado a decisão judicial de que já não caiba recurso.

O princípio da Irretroatividade da Lei possui exceções, que serão estudadas em outros artigos.

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Personalidade Jurídica e Capacidade

Personalidade Jurídica e Capacidade

O direito civil, como já destacado em outros posts aqui do blog, é o ramo do direito que regula a relação entre os particulares, ou seja, pessoas que estão em mesma posição jurídica.

Esses particulares tanto são pessoas físicas (naturais), quanto pessoas jurídicas (empresas, associações, fundações, etc).

Neste momento nos interessa a discussão acerca das pessoas naturais, ou seja, as questões jurídicas que envolvem o próprio ser humano.

O direito civil resguarda e regulamenta desde a concepção da pessoa até a sua morte. Vou um pouco além, o direito civil regula hipóteses que abarcam momento anterior à concepção do ser humano (o chamado concepturo  – que ainda não nasceu) e abrange situações até mesmo para depois da morte. Isso para termos noção da amplitude da cobertura do direito civil.

Dentre esses aspectos legais que envolvem o indivíduo enquanto pessoa, um dos principais é a discussão acerca da sua PERSONALIDADE.

Assista minha videoaula sobre Personalidade. Clique aqui.

Assista minha videoaula sobre Capacidade. Clique aqui.

O que é Personalidade?Personalidade Jurídica

Personalidade Jurídica

Em uma rápida análise poderíamos dizer que a personalidade tem a ver com o temperamento da pessoa, com a carga emocional que ela ostenta pelas suas experiências e conhecimento adquirido, entre outros.

Contudo, personalidade sob o ponto de vista do direito civil possui outra conotação.

No âmbito cível, personalidade é a aptidão para ser sujeito de direitos e deveres.

Em outras palavras:

Pode ser definida como aptidão genérica para adquirir direitos e contrair obrigações ou deveres na ordem civil. É pressuposto para a inserção e atuação da pessoa na ordem jurídica. (Gonçalves, 2017)

A partir desses conceitos, alguns questionamentos surgem: Quem tem personalidade? Quem pode ser titular de direito e obrigações na ordem civil?

E o art. 2º do Código Civil elucida bem tais questões:

Art. 2o A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.

O artigo é bem claro. A personalidade civil começa do nascimento.

Nasceu? Então adquiriu personalidade, passando a ter aptidão para ser titular de direitos e obrigações na ordem civil. Essa é a regra.

– Um bebê com meia hora de vida pode titularizar relações jurídicas?

A resposta é sim, afinal, ele possui personalidade.

– Um bebê que nasceu com paralisia cerebral pode titularizar relações jurídicas?

A resposta é sim, afinal, ele possui personalidade

Personalidade Jurídica

Apesar de termos um dispositivo no Código Civil (art. 2º) que delimita de maneira muito clara que a personalidade civil começa do nascimento com vida, a doutrina trata acerca de 03 teorias que explicam a situação do nascituro (aquele que foi gerado, mas ainda não nasceu):

Teoria Natalista – Por essa teoria, a personalidade jurídica começa do nascimento com vida.

Neste caso, é necessário nascer com vida. A lei dos Registros Públicos (LRP – Lei 6.015/73 – art. 53 §2º), afirma que para a proteção à personalidade é necessário que a criança tenha respirado.

Destarte, aquele que nasce morto (NATIMORTO), não adquire personalidade jurídica.

Teoria Concepcionista – Por essa teoria, a personalidade jurídica começa da concepção.

Aqui temos outro conceito importante que é o do nascituro.

Nascituro é aquele que já foi gerado (concebido), mas ainda não nasceu.

A teoria concepcionista afirma que o nascituro possui personalidade jurídica. E, se possui personalidade, pode ser sujeito de direitos e deveres na ordem civil.

O art. 542 do Código Civil é um exemplo interessante nesse sentido.

Art. 542. A doação feita ao nascituro valerá, sendo aceita pelo seu representante legal.

O nascituro pode figurar em um contrato para recebimento de doação.

Para alguns doutrinadores que adotam essa teoria, determinados direitos patrimoniais reconhecidos ao nascituro ficariam condicionados ao seu nascimento com vida. Como, por exemplo, a doação.

Tartuce (2017, p.68), citando a lição de Maria Helena Diniz faz a diferenciação entre personalidade jurídica formal e material:

Personalidade jurídica formal – é aquela relacionada com os direitos da personalidade, o que nascituro já tem desde a concepção

Personalidade jurídica material – mantém relação com os direitos patrimoniais, e o nascituro só a adquire com o nascimento com vida.

Personalidade Jurídica

Teoria da Personalidade Condicional – Por essa teoria, a personalidade do nascituro é reconhecida, mas se encontra subordinada ao seu nascimento com vida.

Essa na verdade é uma teoria que sintetiza em um só lugar as anteriores.

Resumindo, o nascituro possuiria personalidade, mas ela está diretamente atrelada ao seu nascimento com vida. Nascer com vida é a condição para que a personalidade reconhecida enquanto era nascituro se efetive.

Personalidade x Capacidade

Personalidade Jurídica

Até agora tudo bem. Já conseguimos entender que toda pessoa possui personalidade, o que dá a ela a possibilidade de ser titular de direitos e deveres na ordem civil.

Contudo, existe outro problema: Como essa personalidade é exercida?

Por exemplo: Um bebê que nasceu há meia hora pode titularizar um contrato, mas de que forma isso se dá?

O conceito de capacidade pode responder a essas inquietações.

A capacidade é a medida da personalidade.

Vamos à resposta à questão posta. Um bebê que nasceu há meia hora pode titularizar um contrato, mas não o fará pessoalmente, pois lhe falta capacidade.

A capacidade diferencia aqueles que podem exercer pessoalmente os atos da vida civil, daqueles que não podem exercer pessoalmente ou sofrem limitação na forma de exercer.

Nesse ponto é importante diferenciarmos as espécies de capacidade:

– Capacidade de Direito ou de Gozo: Aptidão para ser sujeito de direitos e deveres.

– Capacidade de Fato ou de Exercício: Aptidão para exercer PESSOALMENTE os atos da vida civil, sem qualquer interferência.

Interessante notar que o conceito de capacidade de direito quase se confunde com o próprio conceito de personalidade. Esse último é mais amplo e isso ficará claro com o aprofundamento no estudo do direito civil.

Outra diferenciação importante é a de capacidade e legitimação. Esta última é a aptidão para realizar determinados atos específicos. A pessoa continua capaz, apenas não tem legitimação (aptidão) em hipóteses especificas.

Exemplo mais comum na doutrina, é o do pai que pretende vender um bem para um filho. Ele tem capacidade para isso, mas para que o ato seja perfeito ele precisa também da concordância dos demais filhos e do seu cônjuge. Assim, faltaria legitimação para esse pai efetuar essa venda sozinho.

Voltando à ideia de capacidade.(Personalidade Jurídica)

Nasceu com vida –> adquiriu personalidade –> tornou-se capaz

O art. 1º do Código Civil deixa isso bem claro.

Art. 1o Toda pessoa é capaz de direitos e deveres na ordem civil.

Mas essa é a capacidade de direito. Todos possuem.

Por ela a pessoa pode titularizar direitos e contrair obrigações, mas não o faz pessoalmente.

Já a capacidade de fato oportuniza ao sujeito realizar pessoalmente os atos da vida civil.

Capacidade de direito + Capacidade de fato = Capacidade Plena

No nosso ordenamento jurídico, regra geral, a capacidade de fato é adquirida no momento em que cessa a menoridade, ou seja, aos 18 anos.

A pessoa que completa 18 anos é MAIOR e CAPAZ.

Incapacidade (Personalidade Jurídica)

 Personalidade Jurídica

Já destacamos que todas as pessoas possuem capacidade de direito, mas nem todas possuem capacidade de fato ou de exercício. Essas pessoas são chamadas de incapazes.

A incapacidade está ligada a alguma situação que impede a pessoa de exercer pessoalmente os atos da vida civil. Essa incapacidade, na verdade, é uma forma de proteção a determinadas pessoas que não possuem condições de atuar pessoalmente.

Existem duas espécies de incapacidade:

Incapacidade Absoluta – Impede o exercício pessoal de quaisquer atos da vida civil

Incapacidade Relativa – Impede o exercício pessoal de alguns atos da vida civil ou à forma de exercê-los

+ Incapacidade Absoluta

Segundo o art.3º do Código Civil, os menores de 16 anos são absolutamente incapazes. O critério levado em consideração pelo legislador foi o etário (idade).

Parte-se da premissa de que aquele que ainda não completou 16 anos ainda não possui a maturidade necessária para realizar pessoalmente os atos da vida civil, necessitando que alguém o REPRESENTE.

Personalidade Jurídica

+ Incapacidade Relativa

O art. 4º do Código Civil determina quem são os relativamente incapazes:

Os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos;

Os ébrios habituais e os viciados em tóxico;

Aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade;

Os pródigos

Todas essas pessoas sofrem limitações para o exercício de determinados atos ou na forma de exercê-los.

+ Os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos:

Aqui o Código adota um critério ligado à idade. Quem completou 16 anos já possui um discernimento mínimo que o possibilita a tomar certas decisões e realizar pessoalmente determinados atos, como votar.

Contudo, o direito civil ainda não lhe defere uma capacidade plena. O relativamente incapaz (entre 16 e 18 anos) deve ser ASSISTIDO pelos seus responsáveis para que os atos por ele realizados tenham valor jurídico.

Desta forma, eles realizam pessoalmente os atos da vida civil, mas necessitam desse acompanhamos pelos responsáveis.

+ Os ébrios habituais e os viciados em tóxicos

Importante esclarecer que o ébrio habitual é aquela pessoa entregue ao alcoolismo.

Tanto o ébrio habitual quanto o viciado em tóxicos são considerados relativamente incapazes por um critério que não leva em conta a idade, como no item anterior, mas sim, a sua capacidade para tomar decisões.

Não estamos falando de pessoas que se entregam à bebedeira ou ao uso de drogas de maneira pontual. O artigo diz respeito àquelas pessoas que vivem sob a dependência do álcool e/ou das drogas.

Essas pessoas devem ser submetidas ao processo judicial de interdição para que o juiz nomeie curador para suprir essa incapacidade.

+ Aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade;

Neste ponto, o Código Civil destaca uma hipótese geral de incapacidade relativa. Toda pessoa que está impossibilitada de exprimir sua vontade pode ser considerada relativamente incapaz.

Destaco que utilizei a expressão “pode ser considerada” e não “deve ser considerada”.

Não existe presunção absoluta de que a pessoa seja relativamente incapaz nesse caso. É necessário comprovar que ela está incapaz de exprimir sua vontade e, portanto, necessita do apoio de outra pessoa para representá-la ou assisti-la.

Exemplo:

Pessoa que está bêbada em uma festa poderia ser considerada relativamente incapaz. Estamos diante de uma causa transitória que o impedia de manifestar sua vontade.

Eventual contrato por ela firmada nessa situação, poderia ser objeto de anulação.

Esse inciso III do art. 4º do Código Civil é bastante abrangente e abarca várias hipóteses.

+ Os pródigos

Pródigo é aquela pessoa que tem compulsão pelo gasto desordenado. De tal maneira, que não consegue ter controle sobre seus atos na esfera patrimonial.

Ele também pode ser considerado relativamente incapaz. E, também necessitará de processo judicial para sua interdição e nomeação de um curador.

E a situação da pessoa com deficiência como fica?

Personalidade Jurídica

A pessoa com deficiência era considerada pelo Código Civil como absolutamente incapaz. A legislação negava a capacidade plena, independentemente de análise do grau da deficiência.

A partir da promulgação da lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), o Código Civil, entre outras legislações, foi alterado, e a pessoa com deficiência passou a ser considerado plenamente capaz.

Seguindo os mesmos critérios estabelecidos para quem não possui deficiência:

– A pessoa com deficiência menor de 16 anos é considerada absolutamente incapaz (o critério é a idade e não a deficiência)

– A pessoa com deficiência maior de 16 e menor de 18 anos é considerada relativamente incapaz (o critério é a idade e não a deficiência)

– A pessoa com deficiência maior de 18 anos é considerada plenamente capaz (repise-se, o critério é a idade e não a deficiência)

O Estatuto da Pessoa com Deficiência acabou com um critério discriminatório e excludente que vigorava no Código Civil, o que significou grande evolução para o nosso ordenamento jurídico.

Mas você deve estar se perguntando acerca da situação daquela pessoa que possui uma deficiência grave, por exemplo, uma paralisia cerebral que a impede de exprimir sua vontade. Como o Código Civil trata esses casos?

– O art. 4º, inciso III do Código Civil responde a este questionamento.

Aqueles que, por causa transitória ou permanente, não puderem exprimir sua vontade são considerados relativamente incapazes.

Resumindo, caso a pessoa com deficiência não possa exprimir sua vontade, ele passará por processo de interdição para que sejam avaliados os limites dessa sua incapacidade. O juiz nomeará curador para atuação nessas hipóteses. Mas ele poderá realizar, ainda, pessoalmente os atos que não foram objeto da interdição, como por exemplo, o matrimônio.

Quer saber um pouco mais sobre o processo de interdição e a situação da pessoa com deficiência? Clique aqui

Suprimento da Incapacidade

Personalidade Jurídica

O absolutamente incapaz e o relativamente incapaz encontram-se em situação que os impossibilita de, pessoalmente, exercerem os atos da vida civil sem interferências.

Mas isso significa que eles não podem ser titulares de direitos e obrigações na ordem civil?

Não. Não é isso. Afinal, eles são pessoas e, portanto, possuem personalidade jurídica e, consequentemente, possuem capacidade de direito. O que lhes falta é a capacidade de fato ou de exercício.

O Código Civil, para viabilizar o exercício de direitos e obrigações por essas pessoas dispõe acerca de formas de suprimento da incapacidade, ou seja, formas de realização do ato por quem é relativamente ou absolutamente incapaz de maneira legal.

 

Suprimento da incapacidade absoluta se dá pela Representação

Suprimento da incapacidade relativa se dá pela Assistência

Na representação, o absolutamente incapaz não participa diretamente do ato, o seu representante realizará o ato em seu nome. Já na assistência, o relativamente incapaz participa do ato, sendo apenas assistido (supervisionado).

De maneira mais simples: os representantes assinam pelo representado, enquanto os assistidos assinam em conjunto com os que os assistem.

Regra geral a representação e assistência são realizadas pelos pais (pai ou mãe).

Podem ocorrer situações em que os pais já faleceram ou não podem exercer tal poder, e ainda situações em que a pessoa já passou à maioridade. Para esses casos existem os institutos da tutela (deferida para menores) e curatela (deferida para maiores).

Um exemplo interessante que podemos citar é a hipótese de uma pessoa com deficiência que não pode exprimir sua vontade. O juiz poderá nomear curador para representá-lo nos atos em que está impedido de realizar.

Índios

Conforme preceitua o parágrafo único do art. 4º, a capacidade dos indígenas é regulada por legislação especial. É a lei 6.001/73.

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Direito Civil: Noções Introdutórias

Direito Civil: Noções Introdutórias

A partir do momento em que o ser humano passou a viver em sociedade, normas de conduta foram necessárias para regular a comunidade. Afinal, de maneira geral, não é possível a manutenção de uma convivência social harmoniosa sem um regramento mínimo.

Em uma comunidade sem orientação acerca do que pode e o que não pode ser feito, sem um conjunto de normas para conduzir as relações entre os indivíduos, provavelmente, valeria a lei do mais forte, ou do mais esperto. Assim, não poderia cogitar-se em uma igualdade entre as pessoas que ali convivem.

O direito nasce exatamente com essa ideia de pacificação social. É ele que vai regular aspectos gerais e específicos de condutas nas mais diversas situações, dessa forma resolvendo conflitos e estabelecendo uma linha mestra de conduta para a sociedade.

Direito Civil: Noções Introdutórias

O que é o Direito?

Direito Civil: Noções Introdutórias

A doutrina foi incapaz de chegar a um consenso acerca do conceito de “Direito”, tendo em vista as múltiplas facetas que o termo assume.

Na etimologia, a palavra direito se encontra no latim directum, literalmente direto, trazendo à mente a concepção de que o direito deve ser uma linha direta, isto é, conforme exatamente uma regra. (Gagliano e Pamplona Filho, 2012,p.37)

Direito pode ser conceituado como um conjunto de normas que regem a vida em sociedade. Também pode ser conceituado como um regramento para a vida em sociedade. Pode ser conceituado como prerrogativa conferida por lei a alguém, entre outras.

São muitos os significados.

Para se estabelecer de maneira mais clara o que é o “Direito”, cito Gonçalves (2017,p.13): “Direito é o conjunto das normas gerais e positivas, que regulam a vida social”.

 

Neste aspecto é importante diferenciarmos direito de outros termos com significados semelhantes:

Direito Civil: Noções Introdutórias

DIREITO X MORAL

Direito Civil: Noções Introdutórias

Tanto as normas do direito, também chamadas de normas jurídicas, quanto as morais dizem respeito a condutas que são aceitas ou não por determinada sociedade. São em verdade, regras de comportamento.

O direito e a moral possuem esse traço em comum, o de estabelecer normas para o convívio social. O caráter sancionador é o ponto diferencial entre ambos.

As normas jurídicas são impostas pelo Estado e, portanto, devem ser cumpridas, sob pena de aplicação de sanção (penalidade). Enquanto as normas morais estão mais ligadas à consciência do ser humano.

 

Direito OBJETIVO X Direito SUBJETIVO

Norma Agendi x Facultas Agendi

Direito Civil: Noções Introdutórias

O direito objetivo está ligado à ideia de norma imposta pelo Estado e que deve ser respeitada por todos. O direito objetivo é a própria norma (norma agendi).

Nas palavras de Gagliano e Pamplona Filho (2012,p.39), norma de comportamento a que a pessoa deve se submeter, preceito esse que, caso descumprido, deve impor, pelo sistema, a aplicação de uma sanção institucionalizada.

O fato de existir norma, por exemplo, conferindo o direito à propriedade, não impõe a todos a obrigação de adquirir um bem, na verdade, apenas assegura a todos aqueles que queiram adquirir uma segurança nesta aquisição. Essa faculdade (opção) de agir dada ao indivíduo é chamado de direito subjetivo (facultas agendi).

Nas palavras de Gagliano e Pamplona Filho (2012,p.39) direito subjetivo designa a possibilidade ou faculdade individual de agir de acordo com o direito.

O próprio autor acima citado apresenta dois exemplos interessantes:

Respeitar as normas de trânsito é um direito objetivo imposto ao indivíduo

Direito subjetivo de propriedade gera as prerrogativas de usar, gozar e dispor do bem

 

Importante ressaltar que é o próprio direito objetivo que assegura o direito subjetivo. Em outras palavras, só é possível ao indivíduo exercer determinado direito (subjetivo), porque a própria norma geral e impositiva possibilitou.

Nesta linha, duas importantes linhas de pensamento surgiram: Negativista (nega a existência do direito subjetivo) e Afirmativa (reconhecem a existência do direito objetivo e subjetivo)

 

– Negativistas: (DUGUIT e KELSEN)

– Afirmativas:

Se dividem em: (Gonçalves, 2017)

a) Teoria da vontade (SAVIGNY, WINDSCHEID) – direito subjetivo constitui um poder da vontade reconhecido pela ordem jurídica

b) Teoria do interesse (IHERING) – direito subjetivo é o interesse juridicamente protegido

c) Teoria mista (JELLINEK) – direito subjetivo é o interesse protegido que a vontade tem o poder de realizar.

Todas essas teorias são importantes para a compreensão do tema, porém, sofrem duras críticas da doutrina por estabelecerem limites à atuação do direito subjetivo. Ora na vontade, ora no interesse.

Para Gonçalves (2017, p. 19), O direito subjetivo, em verdade, não constitui nem poder da vontade, nem interesse protegido, mas apenas “um poder de agir e de exigir determinado comportamento para a realização de um interesse, pressupondo a existência de uma relação jurídica

Direito Civil: Noções Introdutórias

Direito PRIVADO x Direito PÚBLICO

Direito Civil: Noções Introdutórias

Em geral, o direito privado regula as relações entre pessoas naturais ou jurídicas que estão em posição de igualdade, tendo como principal fundamento a autonomia da vontade. Enquanto o direito público regula as relações em que o interesse público está presente e, por conseqüência, o próprio Estado.

Apesar do conceito acima ser bastante utilizado, na atualidade é difícil estabelecer uma linha divisória entre direito privado e o direito público. Muitos ramos do direito público possuem normas do direito privado e vice-versa.

No direito privado temos o direito civil, direito do consumidor, direito empresarial, entre outros.

No direito público temos o direito constitucional, direito penal, direito administrativo, entre outros.

 Direito Civil: Noções Introdutórias

Direito POSITIVO X Direito NATURAL

 Direito Civil: Noções Introdutórias

O direito positivo é o complexo de normas que regulam determinada sociedade em um determinado tempo. Seguindo a lição de Pereira (2017, p.26), direito positivo é o conjunto de regras e princípios jurídicos que pautam a vida social de determinado povo em determinada época.

Observe que o direito positivo no Brasil há 200 anos não é o mesmo da atualidade. Por outro lado, o direito natural ainda é o mesmo.

Explico melhor, a ideia do direito natural está ligada à própria ideia do ser humano enquanto ser social.

Na época moderna, o direito natural desenvolve-se sob o nome de jusnaturalismo, sendo visto como “expressão de princípios superiores ligados à natureza racional e social do homem (Gonçalves, 2017, p.16).

 

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