Tutela Provisória e o novo CPC
Tutela Provisória e o novo CPC
No estudo do processo fica evidente o quanto a demora no prestação jurisdicional ocasiona prejuízos às partes que, muitas vezes, não conseguem enxergar justiça na decisão final, mesmo lhe sendo favorável, devido a essa insuportável e causticante demora.
Importante dizer que as partes, quando buscam o Judiciário, o fazem movidos pelo interesse na resolução de alguma demanda que não foram capazes de resolver amigavelmente (ou administrativamente).
Quem busca o Judiciário, busca com a finalidade de obtenção de uma tutela, uma proteção a um direito que entende lhe pertencer.
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O que caracteriza a atividade jurisdicional é a tutela ao direito daquele que, no conflito, se acha na situação de vantagem garantida pela ordem jurídica. Tutelar os direitos, portanto, é a função da Justiça, e o processo é o instrumento por meio do qual se alcança a efetividade dessa tutela.
Visando a possibilitar um atalho na tutela almejada frente ao estado-juiz (pedido formulado no processo judicial), as tutelas provisórias se consolidaram no nosso ordenamento jurídico como importante ferramenta.
Através delas o autor consegue, por exemplo, logo no início da demanda, a entrega da coisa desejada, ao invés de esperar anos e anos até o provimento final. As tutelas provisórias dão, portanto, maior efetividade ao processo.
O CPC (Código de Processo Civil) de maneira muito inteligente, apesar da grande discussão existente acerca de alguns pontos, sistematizou as regras das tutelas provisórias. Classificou-as em: Tutelas de Urgência e Tutelas de Evidência.
A tutela de urgência ainda subdivide-se em: Tutela antecipada e Tutela Cautelar
Tutela Provisória de Urgência
+ Tutela antecipada
Tutela antecipada nada mais é do que uma hipótese de antecipação à parte da própria proteção jurídica (a própria tutela jurisdicional).
Ex: Joaquim ingressa com uma ação em face da Empresa XYZ, alegando que teve seu nome indevidamente inscrito em cadastro de inadimplentes (SPC/SERASA), requerendo, que seu nome seja retirado do referido cadastro. Nesse caso, o autor solicita ao juiz que já defira no início do processo a retirada do seu nome do cadastro de inadimplentes, tendo em vista a documentação que acostou aos autos que comprovam que está adimplente com a empresa XYZ e ainda porque há urgência nessa liberação.
No exemplo, a parte está pleiteando uma antecipação da tutela que foi requerida no pedido principal, qual seja, a retirada do seu nome do cadastro de devedores.
O que se antecipa para a parte é a própria tutela. Não se deve confundir tutela antecipada com decisão antecipada. Antecipar a tutela é dar o próprio bem da vida e não a prestação jurisdicional.
O traço marcante da tutela antecipada é a satisfatividade.
Deve haver para a concessão da tutela antecipada uma correspondência, ainda que parcial, entre o que se obtém com a tutela antecipada e o que se requer ao final.
Clique aqui e veja artigo específico acerca da Tutela Antecipada.
+ Tutela Cautelar
Em alguns aspectos é parecida com a tutela antecipada, pois também é provisória (pode oportunamente ser revista) e ela também é de urgência (porque ela também objetiva proteger a ameaça a um direito).
A diferença é que, enquanto a tutela antecipada é satisfativa, a cautelar é conservativa.
Funciona assim: Na tutela antecipada eu quero o bem, na cautelar eu quero a garantia que terei o bem ao final.
Ex: devedor que está dilapidando todo o patrimônio. Medida cautelar de arresto. No arresto o juiz tira um bem do devedor e reserva – não o dá para o credor. Caso ao final, o credor vença, vai ter um bem para fazer frente ao crédito.
Tutela Provisória de Evidência
Apesar de ser provisória e também constituir em medida para dar maior efetividade ao processo, a tutela de evidência não se baseia na urgência (periculum in mora).
Essa é a chamada tutela do direito provável. Nela, é tão evidente a probabilidade do direito do autor, que a lei garante, já no início do processo, que a coisa lhe seja entregue, ainda que o autor não precise.
Obs: a demora do processo, via de regra, beneficia o réu. Em uma situação em que se discute a propriedade de um bem, por exemplo, enquanto o processo é discutido o réu é que está usando o bem. Assim, a ideia da tutela de evidência é reverter esse parâmetro no início do processo, com a entrega da coisa ao autor.
No CPC de 73 (revogado), não existia referência explícita à tutela de evidência, ao menos não com esse nome. Mas existiam ações em que se verificava a aplicação da tutela de evidência.
O art. 311 enumera as hipóteses de cabimento da tutela de evidência (trata-se de um rol taxativo):
Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando:
I – ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte;
II – as alegações de fato puderem ser comprovadas apenas documentalmente e houver tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante;
III – se tratar de pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada do contrato de depósito, caso em que será decretada a ordem de entrega do objeto custodiado, sob cominação de multa;
IV – a petição inicial for instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável.
Parágrafo único. Nas hipóteses dos incisos II e III, o juiz poderá decidir liminarmente.
Verifica-se, portanto, que a tutela de evidência visa reprimir conduta indevida do réu, ou funda-se em um grau de probabilidade muito mais elevado que a tutela de urgência.
É interessante destacar que mesmo a tutela de evidência poderá ser deferida sem a oitiva da parte contrária nas hipóteses dos incisos II e III do art. 311 do CPC.
As hipóteses destacadas não são cumulativas, basta a presença de uma para o deferimento da tutela de evidência.
Características Comuns às Tutelas Provisórias no CPC
– Sumariedade da cognição
É possível afirmar que cognição significa a ciência do juiz com relação ao caso que lhe é apresentado; em outras palavras o conhecimento, a análise do caso realizada pelo magistrado.
A sumariedade da cognição diz respeito à sua profundidade. Nela a análise do juiz é superficial, pois não há plena certeza da existência do direito.
A tutela definitiva (que é concedida ou não na sentença) é fruto da cognição exauriente, pois o juiz apenas a pronunciará quando houver firmado o seu convencimento motivado.
A tutela provisória é fruto da cognição sumária, pois o juiz decide com base na probabilidade do direito.
Obs: Segundo Gajardoni, quando o juiz analisa com base na cognição exauriente (profunda): Ganha-se em segurança (a possibilidade de o juiz errar é menor), mas perde-se em celeridade.
De outro lado, quando o juiz analisa com base na cognição sumária: Perde-se em segurança (a possibilidade de o juiz errar é maior), mas ganha-se em celeridade.
– Urgência
Aplica-se às tutelas de urgência.
É o chamado periculum in mora (perigo da demora). Tanto a tutela antecipada quanto a cautelar possuem essa característica, fundada no art. 300 do CPC.
Na tutela antecipada há urgência pois a própria coisa, objeto da demanda, está em perigo. Já na tutela cautelar há urgência quando determinada situação ameaça o risco do resultado útil do processo.
Ex: Qual o resultado útil de um processo de divórcio, se no seu decorrer o marido matar a mulher, devido às constantes e violentas brigas do casal? Neste caso, seria possível pleitear-se uma tutela cautelar de separação de corpos, visando trazer a segurança necessária ao casal.
– Provisoriedade (Precariedade ou reversibilidade)
O próprio nome já é bastante sugestivo: “Tutela Provisória”. Provisória porque pode ser a qualquer momento revisada, tendo em vista que sua análise se deu em cognição sumária.
Existe a possibilidade de concessão da tutela provisória, mesmo sem a oitiva da parte contrária (inaudita altera pars).
O art. 296 do CPC é bem claro nesse sentido:
Art. 296 – A tutela provisória conserva sua eficácia na pendência do processo, mas pode, a qualquer tempo, ser revogada ou modificada
Essas decisões, em sede de tutela provisória, perduram até que venha uma decisão no processo revendo-as.
Obs: Se a medida for irreversível ela não deverá ser deferida. Algumas doutrinas chamam essa característica de periculum in mora inverso ou periculum in mora sob a ótica do réu. A jurisprudência cada vez mais atenua esse princípio, tendo em vista, a existência de impossibilidade de sua aplicação em determinados casos concretos.
Ex: Paciente que precisa de medicamento fundamental à manutenção da vida. Entra com ação contra o Estado solicitando tal medicamento com urgência e pleiteia a tutela antecipada. Apesar de haver uma clara irreversibilidade da decisão (no plano fático), o juiz, estando presentes os requisitos autorizadores, provavelmente a concederá.
– Revogabilidade ou Mutabilidade
Conforme dito no item anterior, a tutela provisória poderá ser revisada a qualquer momento, ou seja, poderá ser revogada ou modificada a qualquer momento.
Essa é a inteligência do art. 296 do CPC que assim determina: A tutela provisória conserva sua eficácia na pendência do processo, mas pode, a qualquer tempo, ser revogada ou modificada.
Como a tutela de evidência funda-se apenas no chamado fummus boni iuris a possibilidade de sua reversão é menor.
– Inexistência de coisa julgada material
A tutela provisória não faz coisa julgada, pois, entre outros aspectos, a sua concessão se dá por meio de cognição sumária, ou seja, sem um aprofundamento maior nas questões discutidas na demanda.
Destaque-se que a tutela provisória poderá ser deferida em caráter liminar, inaudita altera pars (sem oitiva prévia da parte contrária), o que por si só já afasta a possibilidade da coisa julgada, vez que ainda não foi concedida a ampla defesa e o contraditório.
Como a cognição é sumária o sistema faz uma troca de valores. Quando a cognição é exauriente o sistema sela – haverá coisa julgada.
Como nas tutelas provisórias temos a cognição sumária, não há uma análise aprofundada, consequentemente, no novo CPC, assim como já era no de 73, não haverá coisa julgada no tocante às tutelas provisórias.
Segundo a doutrina, as únicas exceções são a prescrição e decadência – por economia processual.
– Fungibilidade
Se a parte pedir tutela cautelar (conservativo) e o juiz entender que é caso de antecipada (satisfativa), o juiz dará uma pela outra, com fundamento no art. 305, parágrafo único do CPC.
O contrário também é reconhecido pela doutrina, apesar de o novo CPC não falar explicitamente.
– Responsabilidade objetiva por dano processual
Aplica-se tanto à tutela cautelar quanto à antecipada. Aquele que tem para si concedida a tutela provisória de urgência cautelar ou antecipada responde objetivamente por eventuais prejuízos causados à outra parte, caso perca a ação.
O art. 302 assim estabelece:
Art. 302. Independentemente da reparação por dano processual, a parte responde pelo prejuízo que a efetivação da tutela de urgência causar à parte adversa, se:
I – a sentença lhe for desfavorável;
II – obtida liminarmente a tutela em caráter antecedente, não fornecer os meios necessários para a citação do requerido no prazo de 5 (cinco) dias;
III – ocorrer a cessação da eficácia da medida em qualquer hipótese legal;
IV – o juiz acolher a alegação de decadência ou prescrição da pretensão do autor.
Parágrafo único. A indenização será liquidada nos autos em que a medida tiver sido concedida, sempre que possível.
Tal penalização visa a reprimir a utilização da tutela provisória de maneira irresponsável.
Apesar de o CPC não referir-se à tutela de evidência no tocante à essa responsabilização, boa parte da doutrina entende que a ela também se aplica.
– Retirada do efeito suspensivo automático da Apelação
A apelação é dotada de duplo efeito (suspensivo e devolutivo). Pelo efeito suspensivo, a decisão fica com efeito suspenso até que o tribunal confirme.
Se a decisão proferida no processo em que houve a concessão da tutela provisória for atacada por apelação, essa apelação não terá o efeito suspensivo automático. A sentença já estará valendo desde logo, conforme preceitua o art. 1.012, §1º, V do CPC.
– Caução
Aplica-se às tutelas de urgência.
O juiz pode condicionar, com base no art. 300 §1º do CPC, o deferimento da tutela provisória à prestação de caução (garantia) idônea. É uma forma de garantir, no caso de revogação da tutela, eventuais prejuízos experimentados pela parte contrária.
A caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.
– Caráter Incidental e Antecedente
A tutela provisória pode ser requerida antes do pedido principal completo com todos os seus argumentos (caráter antecedente) e em conjunto com a petição inicial completa ou durante o curso da ação (caráter incidental).
A tutela provisória requerida em caráter antecedente não se aplica à tutela de evidência, vez que seu traço característico é a urgência, o que não se vislumbra nesse tipo de tutela.
Leia também: Tutela Antecipada e o novo CPC, onde trato especificamente sobre essa tutela requerida em caráter incidental e antecedente.
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