Mitos e Verdades sobre a PEC 241/2016 (PEC 55/2016)

O Projeto de Emenda Constitucional 241/2016 (PEC 55/2016) pretende a instituição do “Novo Regime Fiscal”, conforme a justificativa apresentada no projeto, consiste num instrumento que visa reverter, no horizonte de médio e longo prazo, o quadro de agudo desequilíbrio fiscal em que nos últimos anos foi colocado o Governo Federal.

Em linhas gerais o projeto traça limites para os orçamentos dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, e dos demais entes que possuem autonomia orçamentário-financeira como Ministério Público e Defensoria Pública.

Tratei aqui, do ponto de vista legal, das principais discussões que tenho visto na internet, sobretudo nas redes sociais. Caso tenha alguma dúvida sobre o assunto, deixe seu comentário, terei o maior prazer em ajudar no esclarecimento.

Grande abraço a todos.

 

A PEC 55/2016 surgiu para substituir a PEC 241:

Imagem com texto "Mito"

Na verdade, trata-se da mesma proposta. Apenas mudou a numeração porque ela agora tramita no Senado Federal.

 

 

 

A PEC 241 JÁ ESTÁ APROVADA: 

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As emendas constitucionais como é o caso da PEC 241 (PEC 55) passam por procedimentos complexos de aprovação, determinados pela Constituição Federal. Para aprovação é necessária discussão e votação em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos. Apenas será considerada aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros (art. 60 §2º CF/88).

Isso significa que a PEC deve ser aprovada duas vezes na Câmara dos Deputados e duas vezes no Senado Federal por três quintos de seus membros. A PEC 241 foi aprovada apenas na Câmara dos Deputados. Ainda precisa completar o seu ciclo no Senado Federal.

Assim, ainda há muito o que se discutir até a efetiva aprovação da PEC 241, que, até ser promulgada, ainda pode ser modificada.

 

A PEC 241 congelará os gastos com saúde e educação pelo período de 20 anos:

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A proposta contempla que a variação de gastos com saúde e educação de um ano para outro acompanhará o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), ou seja, será corrigido pela inflação projetada para o período.

Ressalto “projetada”, tendo em vista que o orçamento de um ano é elaborado no ano anterior, dessa forma, o orçamento das despesas com saúde e educação será determinado pela inflação projetada e não pela real.

O congelamento vai ocorrer, uma vez que não haverá aumento real nas despesas com saúde e educação, haverá apenas a atualização inflacionária.

Necessário se ter em mente que na sistemática atual determinada pelo art. 212 da Constituição de 88, a União deve aplicar, anualmente, no mínimo 18% de sua receita com impostos. No campo da saúde, por força da emenda constitucional 86/2015, a união deveria aplicar, no mínimo, 15% de receita corrente líquida.

Observem que os percentuais atualmente determinados pela Constituição se referem às receitas. Assim, à medida que o país cresce os investimentos tendem a terem aumento real, ou seja, mais dinheiro investido.

A PEC 241 pretende suspender os artigos citadas por um prazo de 20 anos. Nesta senda, durante as próximas duas décadas não haveria obrigatoriedade de gastos mínimos com saúde e educação, respeitando os patamares citados. A fórmula para essas despesas seguem o caminho já citado (atualização pelo IPCA).

O Projeto prevê a possibilidade de alteração nessas áreas de despesas a partir do décimo exercício financeiro (10 anos após a promulgação da emenda).

 

A PEC vai acabar com as ações do Ministério Público contra a corrupção:

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O Ministério Público (MP) tem sua independência determinada pela Constituição Federal de 88 em seus arts. 127 e seguintes. Todas as atividades desenvolvidas por esta instituição são e continuarão a serem desempenhadas com imparcialidade.

O que a PEC prevê é um engessamento do teto de gastos do MP, o que segundo o próprio Procurador Geral da República, em nota técnica enviada ao Congresso Nacional, impedirá a ampliação da sua estrutura, promover despesas com investimentos, nomear novos membros e servidores, promover os reajustes das despesas com pessoal e encargos sociais dos agentes públicos, estabelecidos em lei ou projeto de lei acordados com o Poder Executivo, efetuar despesas com inativos e pensionistas, entre outros aspectos.

Esse congelamento nos investimento afetará não só o Ministério Público mas diversos outros órgãos.

 

O Judiciário será afetado pela PEC 241:

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A limitação de gastos que será imposta com a possível aprovação da PEC 241 impõe limitação nos crescimento das despesas do Judiciário, fazendo com que sua capacidade de ampliação estrutural fique comprometida, assim como ocorreria com o MP, Defensoria Pública, entre outros.

 

 

O STF já se manifestou pela constitucionalidade da PEC 241 (PEC 55):

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Alguns parlamentares impetraram Mandado de Segurança no STF, cujo pedido liminar foi apreciado pelo Ministro Barroso e indeferido. Na prática, o referido mandado de segurança buscava a suspensão da tramitação da PEC 241 sob o argumento de que o projeto prevê ofensa à separação de poderes e outros pontos relacionados ao mérito do projeto.

O Ministro não entendeu, em uma análise liminar, que haveria ofensa à separação de poderes. Ressalte-se que o STF não pode interferir no processo legislativo, porque nesse caso estaria invadindo competência de outro Poder. O STF pode suspender a tramitação quando o projeto viola as chamadas cláusulas pétreas ou na hipótese de violação do devido processo legislativo (questões formais).

Esta decisão do Ministro não impede que, após a promulgação dessa emenda constitucional, o STF declare sua inconstitucionalidade.

 

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Grande abraço a todos!

 




O STF e o direito à saúde: distribuição de medicamentos de alto custo

 

“Quem deve morrer?”. Essa pergunta pode parecer estranha, afinal, se há uma certeza na vida é a de que ela é passageira e seu término se dará com a morte. A maior lógica existencial é essa, se nasceu, um dia morrerá. Contudo, todos (ou quase todos) desejam uma vida longa (o mais longa possível) e feliz, e é neste ponto que reside a minha inquietação, pois, vida longa é sinal de saúde.

O debate em torno deste tema se acalora cada dia mais. Quanto mais discute-se o acesso a determinados serviços em saúde, mais a discussão aumenta e se aprofunda.

Na família, na igreja, na escola, na faculdade de direito, em todo lugar ensina-se algo que deve ser levado para todos os lugares: o direito à vida é o mais importante.

Partindo dessa premissa, o constituinte de 88 de forma ousada e brilhante insculpiu no art. 196:

A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Neste panorama, a garantia à saúde não pode encontrar quaisquer obstáculos à sua efetivação. Garantir esse direito a todos, significa dizer que quaisquer pessoas, impendentemente de raça, credo, condição financeira, ou qualquer outra hipótese discriminatória, poderão e deverão ser atendidos em suas necessidades atinentes a essa área de atuação estatal.

No Brasil essas ações e serviços públicos se desenvolvem no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), responsável pelo planejamento, execução e controle dessas políticas. Tal sistema é descentralizado e possui direção única em cada esfera de governo: municipal, estadual e federal.

A abrangência das ações do SUS é tão grande, que no Brasil é simplesmente impossível alguém declarar que não utiliza os serviços por ele prestados. Destaque-se alguns exemplos, quando se adquire produtos em uma farmácia, o SUS está presente desde a liberação da fabricação e distribuição do medicamento, através da ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), até a autorização para funcionamento, que deve passar necessariamente pelo crivo da vigilância sanitária municipal; as vacinas distribuídas gratuitamente no Brasil; o programa de vacinação animal (cachorros e gatos); o serviço de atendimento de urgência e emergência (conhecido como SAMU); estratégia saúda da família; hospitais de pequeno, médio e grande porte; entre outros.

As leis 8080 e 8142/1990 estão entre os principais instrumentos normativos do SUS. A primeira dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e a segunda sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde.

Os recursos necessários ao financiamento das atividades do SUS são oriundos dos cofres públicos. União, Estados, Distrito Federal e Municípios devem, por força constitucional (EC 29/2000 e 86/2015), destinar percentual mínimo de seus respectivos orçamentos para cobertura das ações.

Dentre as atividades executadas pelo SUS no firme objetivo de garantir saúde à população está a política pública de distribuição de medicamentos.

É de conhecimento notório que os medicamentos são drogas utilizadas para o tratamento das mais diversas doenças. Num conceito mais técnico são produtos especiais elaborados com a finalidade de diagnosticar, prevenir, curar doenças ou aliviar seus sintomas, sendo produzidos com rigoroso controle técnico para atender às especificações determinadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA[1].

O Estado deve ofertar, conforme aludido anteriormente, saúde integral à população, o que significa que o acesso aos medicamentos necessários ao tratamento das enfermidades que eventualmente lhe acometa é direito do cidadão.

Apesar de toda essa garantia de acesso, o que se vê é a proliferação de ações judiciais em que se discute o acesso a medicamentos cujo fornecimento foi negado pelos diversos entes federados.

Várias são as justificativas invocadas para que o medicamento prescrito pelo profissional médico não seja entregue ao cidadão que dele necessita. Em muitos casos a discussão é acerca de qual ente seria o responsável pela entrega daquele medicamento específico; em outros o medicamento não consta da relação de medicamentos municipal, estadual ou nacional; há ainda casos de medicamentos ainda não aprovados pela ANVISA; entre outros.

Com o “não” do Estado-Executivo, resta ao cidadão se valer do Estado-Judiciário para ter o seu direito satisfeito. Este fenômeno é mais conhecido por judicialização da saúde, que envolve não só a entrega de medicamentos, mas também, a realização de cirurgias, a busca por vagas em leitos hospitalares, até mesmo a realização de simples consultas especializadas, entre outros.

A partir da decisão judicial municípios, estados e União se veem na obrigatoriedade de entregar os medicamentos. Na maioria das vezes esse encargo recai sobre o município, afinal, é o ente mais próximo da população.

Esta discussão tem ganhado maiores contornos com os debates acerca dos recursos extraordinários 566471 e 657718 que tramitam no STF. Os recursos, que tiveram repercussão geral reconhecida, tratam do fornecimento de remédios de alto custo não disponíveis na lista do Sistema Único de Saúde (SUS) e de medicamentos não registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

O mérito da questão gira em torno da obrigatoriedade de o Estado fornecer medicamento de alto custo não previsto na lista que é elaborada pelo SUS. No âmbito nacional essa lista é chamada de RENAME – Relação Nacional de Medicamentos. E de outro lado, se o Estado deve ofertar mesmo aquele medicamento que ainda não passou pelos rígidos critérios de análise da ANVISA.

Com relação ao primeiro ponto, data maxima venia, trata-se de discussão sem sentido. Afinal, o fato de existir uma lista de medicamentos elaborada pelo SUS, não significa que todas as possibilidades estão ali contempladas. Afinal, todos os dias novos estudos são desenvolvidos, novos medicamentos são criados para combater os mais diversos males que acometem a humanidade.

Não é plausível estabelecer como critério para o fornecimento de medicamento uma lista elaborada por órgão público. Noutro norte, o fato de o medicamento ter um alto custo, de igual forma, não é critério balizado pela Constituição ou qualquer outra norma.

Em uma análise coberta de um racionalismo prático e desumano poderia se aferir que o que se gasta com o medicamento para salvar a vida de uma única pessoa, daria para adquirir medicamentos para o tratamento de milhares de outras pessoas. Neste caso, como aferir quem deve ser salvo?

A Constituição Federal de 88 ao estabelecer o direito fundamental à saúde não o fez de maneira condicionada, a resposta à questão posta é simples, atendimento integral e universal. O que o dispositivo constitucional já impõe com muita propriedade.

O embate judicial deve se pautar em torno de quem “pagará a conta” e não em torno do acesso ao medicamento. É claro que devem ser estabelecidos requisitos mínimos para o acesso a este tipo de medicamento para que haja a comprovação de sua eficácia e imprescindibilidade.

Negar o acesso a medicamento que comprovadamente seja capaz de garantir a vida de uma pessoa acometida por doença grave ou rara, por mais caro que seja, ainda que não esteja na lista “x” ou “y”, pode significar o encurtamento de uma vida longa e feliz.

Grande abraço a todos.

 

[1] http://www.cvs.saude.sp.gov.br/apresentacao.asp?te_codigo=2




A autonomia universitária e o núcleo de prática jurídica

Todo estudante de direito deve conhecer bem o que é o núcleo de práticas, pois é nesse espaço que acontecem os primeiros contatos com uma clientela real. É nesse espaço que pela primeira vez o acadêmico estará à frente, sob a orientação dos seus professores (advogados), de um processo judicial de verdade.

O papel dos núcleo é propiciar ao acadêmico uma vivência real das atividades inerentes à profissão que pretende galgar, entre elas a advocacia. Na verdade os núcleos, de uma maneira geral, priorizam o estágio da advocacia, vez que as outras carreiras do direito costumam estar presentes no chamado estágio simulado, normalmente realizado em sala de aula.

Não há uma diretriz legal específica e obrigatória de como o estágio deve se dar em todos os seus aspectos. Há uma regulamento geral constante da Resolução CNE/CES N° 9 de 2014, e a universidade deve organizar no projeto pedagógico do curso a concepção e composição das atividades de estágio curricular supervisionado, suas diferentes formas e condições de realização, bem como a forma de implantação e a estrutura do Núcleo de Prática Jurídica.

Há neste ponto a chamada autonomia universitária, que tem seu fundamento no art. 207 da Constituição Federal de 1988 (CF/88) e alcança universidades privadas e públicas.

Art. 207. As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.

Apesar da clara definição legal acerca dessa temática, esses núcleos foram objeto de discussão judicial, tendo em vista lei estadual do Rio Grande do Norte que obrigava à Universidade Estadual do estado a manutenção de plantão do núcleo de prática jurídica para atendimento à população hipossuficiente nos finais de semana e feriado, conforme art. 1º da Lei estadual 8865/2006 RN.

O Supremo Tribunal Federal analisou a questão em sede de ADI e declarou a inconstitucionalidade da referida lei potiguar, por ferir autonomia universitária.

Decisão aplaudida pela comunidade acadêmica já que o estágio supervisionado, conforme dicção legal (Lei 11788/2008), é ato educativo escolar desenvolvido no ambiente de trabalho, que visa à preparação para o trabalho produtivo de educandos que estejam frequentando o ensino regular em instituições de educação superior. E não visam precipuamente a cobertura do atendimento que cabe precipuamente a outras organizações estatais, in casu, a defensoria pública.

Conforme ficou assentado na decisão do STF, o estado não pode amenizar a deficiência da sua defensoria pública com a imposição de medidas que contrariem a CF/88. É necessário o fortalecimento dessas instituições consagradas como funções essenciais à justiça pelo constituinte.

Grande abraço a todos.




Cláusula de não restabelecimento

DIREITO EMPRESARIAL. ABUSIVIDADE DA VIGÊNCIA POR PRAZO INDETERMINADO DE CLÁUSULA DE NÃO CONCORRÊNCIA.

É abusiva a vigência, por prazo indeterminado, da cláusula de “não restabelecimento” (art. 1.147 do CC), também denominada “cláusula de não concorrência” *

*Parte da ementa de julgado do STJ inserto no Informativo 554

No caso supracitado o STJ foi provocado a se manifestar acerca da legalidade de disposição contratual de “não restabelecimento” por prazo indeterminado em contrato de trespasse. No caso em comento, o STJ decidiu pela abusividade desta cláusula com a consequente aplicação do prazo geral de 05 anos.

Abaixo, algumas considerações para melhor entendimento sobre o assunto:

A cláusula de “não restabelecimento”, também chamada pela doutrina de “cláusula de não concorrência” ou “cláusula de interdição da concorrência” tem seu lugar no momento da formalização do contrato de trespasse.

O contrato de trespasse, de maneira sucinta, nada mais é que o contrato para alienação do estabelecimento empresarial, ou seja, sua venda.

Ao adquirir um estabelecimento empresarial é normal e compreensível que o novo proprietário não queira ter como seu concorrente direto e imediato o antigo proprietário do estabelecimento empresarial. Isto porque, via de regra, a clientela acompanharia o antigo empresário, e tal hipótese violaria o princípio da boa-fé objetiva, disposto no art. 422 do Código Civil Brasileiro.

Nesta linha, o art. 1.147 do Código Civil regulamentou a cláusula de não concorrência, que é, na verdade, a impossibilidade do alienante fazer concorrência ao adquirente do estabelecimento empresarial, senão vejamos:

Art. 1.147. Não havendo autorização expressa, o alienante do estabelecimento não pode fazer concorrência ao adquirente, nos cinco anos subseqüentes à transferência.

Esta cláusula tem como finalidade maior evitar que o adquirente experimente prejuízos, oriundos da clientela desviada pelo alienante, numa clara concorrência desleal.

Importante destacar que o contrato de trespasse pode autorizar a concorrência, conforme dicção do mesmo artigo 1.147 do Código Civil, desde que seja ato de vontade livre dos contratantes.

Noutro giro, a referida cláusula também não autoriza o estabelecimento de prazo indeterminado para o restabelecimento do antigo proprietário, ou seja, não pode o novo proprietário impor ao antigo, por cláusula contratual, a impossibilidade de voltar a exercer atividade empresarial (por prazo indeterminado) naquela área de concorrência.

Isso porque o objetivo da norma é afastar a deslealdade no trato concorrencial e não limitar definitivamente a capacidade de novamente exercer atividade empresarial no mesmo ramo pelo proprietário alienante.

Nesse entendimento é que o STJ determinou, no caso concreto, a aplicação do prazo geral de 05 anos, tendo em vista a abusiva cláusula que impede o alienante de se restabelecer comercialmente.

Grande abraço a todos.




Adoção do nascituro

Há pouco tempo deparei-me com uma notícia* muito estranha:

“Grávida do 3º filho anuncia em rede social doação de bebê em MT Diarista disse que não tem condições financeiras de criar outro filho. Conselho Tutelar informou que irá tomar providências no caso.(…)”

No caso, a diarista fez o anúncio em um grupo dedicado à venda de produtos usados.

Situação estarrecedora, mas que acaba passando de maneira até natural aos olhos dos leitores, tendo em vista tantas outras atrocidades que cotidianamente vemos estampadas nos jornais.

A situação desta grávida me leva a trazer duas questões para o debate:

– Há a possibilidade de destituição do poder familiar sobre nascituro?

– Há a possibilidade de adoção do nascituro?

Essas minhas indagações me ocorrem em vista do fato noticiado. Uma mãe que trata o filho concebido como se fosse coisa, passível de ser objeto da prestação de um contrato de doação, talvez não tenha, de fato, condições de assumir o poder familiar.

É lógico que esta doação imaginada pela mãe não possui fundamento jurídico, já que, a única hipótese para a definitiva entrega de uma criança a família, que não a biológica, seria através do instituto da adoção.

E nesse ponto, gostaria de tecer alguns comentário:

A adoção é instituto regulado pelo Código Civil Brasileiro e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, cujo fundamento primordial é o “melhor interesse da criança”. A adoção visa propiciar ao infante a convivência em um lar com o mínimo de estrutura para seu pleno e saudável desenvolvimento físico e mental.

O procedimento para adoção é complexo e envolve diversas fases reguladas por lei, inclusive um estágio de convivência em que a nova família e o adotando, com o acompanhamento psicossocial de equipe especializada, permanecerão por um período juntos, com o objetivo de estreitar laços e verificar a viabilidade daquela adoção.

Nesta seara, muitas pontos controvertidos já foram levantados pela doutrina e pela jurisprudência, como, por exemplo:

– A adoção por casais homoafetivos (casais formados por pessoas do mesmo sexo). Questão pacificada por boa parte da doutrina e jurisprudência que atestam pela possibilidade, visando sempre o bem estar da criança e adolescente;

– A adoção à brasileira – caso em que determinada pessoa simplesmente declara ao registrar a criança ser pai ou mãe, mesmo sabendo não ser. Tal situação fica no anonimato e em muitos casos nunca chega a ser descoberto, apesar de constituir crime.

Há muitas outras situações que envolvem a adoção, mas gostaria de dar enfoque às posições doutrinárias quanto à adoção do nascituro.

Inicialmente, é de bom tom destacar que nascituro é aquele que tem vida intra-uterina, já foi concebido, mas ainda não nasceu.

Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvaldo (2012, pág. 1047), apresenta de forma bastante lúcida duas posições acerca da adoção do nascituro:

Posição defendida por Silmara Juny A. Chinelato e Almeida:

“Professa a possibilidade de adoção de nascituro ao argumento de que o ordenamento jurídico reconhece a tutela jurídica dos seus interesses. Enfatiza que, a partir da leitura do texto legal, conferindo proteção aos direitos do nascituro, não se pode negar a possibilidade, afinal, “quem afirma direitos e obrigações afirma personalidade, sendo a capacidade de direito e o status atributos da personalidade””

Posição defendida por Maria Berenice Dias

“defende a impossibilidade de adoção do nascituro, afirmando ser necessário para a adoção o cumprimento de um estágio de convivência entre o adotante e o adotado, o que se revela “incompatível em relação a um ser enclausurado no corpo feminino”

Ambos os posicionamentos doutrinários possuem sólidos fundamentos jurídicos, entretanto, na minha singela análise, a conclusão de Silmara Chinelato é aquela que melhor se adequa ao princípio do melhor interesse da criança.

Afinal, quantas mães passam o período de gestação em meio às drogas ou o álcool, muitas vezes vivendo na rua, ou mesmo já têm o poder familiar de outros filhos destituídos por força de medida judicial.

A criança, após o seu nascimento, poderá ser levada a abrigo junto com outras e somente depois de um longo processo poderá ser adotada por alguma família. Será que é necessário aguardar tanto?

Lógico que essa é uma questão bastante polêmica e aberta a várias interpretações.

Corroborando esse entendimento, Flávio Tartuce (2014):

“Além disso, consigne-se que é possível o reconhecimento do nascituro como filho, conforme preceitua especificamente o art. 1.609, parágrafo único, do CC/2002. Ora, se é possível reconhecê-lo como filho, porque não seria possível adotá-lo? Entendo que haveria um contrassenso se a resposta fosse pela impossibilidade de adoção”

A discussão em torno desse tema, certamente não se esgota em um ou outro posicionamento aqui demonstrado.

Grande abraço a todos!

 

 

*Notícia disponível em: http://g1.globo .com/mato-grosso/noticia/2015/03/gravida-do-3-filho-anuncia-em-rede-social-doacao-de-bebe-em-mt.html




A lei de licitações e os serviços autônomos

O Poder Público, enquanto executor da atividade administrativa, não possui aparato suficiente para o cumprimento de todas as exigências que o interesse público reclama.

Imagine-se, por exemplo, o Estado se organizando para manter ativas várias fábricas de beneficiamento de matérias primas, plantações, indústrias de medicamentos, entre outros. Afinal, são muitas as ações positivas deste ente para acobertar todos os direitos fundamentais do cidadão.

Esta estrutura gigantesca do Estado é impossível de ser criada, por isso mesmo, o Estado se vale da iniciativa privada para consecução das suas funções típicas.

Busca o particular para o fornecimento de gêneros alimentícios para escolas, hospitais, centros penitenciários, etc. Busca o particular para o fornecimento de materiais de escritório para suas repartições administrativas, o fornecimento de combustíveis para os veículos, também adquiridos da iniciativa privada.

Contudo, para contratar o particular para o fornecimento de bens e serviços, o Poder Público deve, obrigatoriamente, observar procedimento que garanta isonomia, transparência e a adequada utilização dos recursos públicos. Este procedimento é denominado LICITAÇÃO.

Segundo Zanella Di Pietro, citando Dromi (2012, pág. 368):

“licitação é o procedimento administrativo pelo qual um ente público, no exercício da função administrativa, abre a todos os interessados, que se sujeitem às condições fixadas no instrumento convocatório, a possibilidade de formularem propostas dentre as quais selecionará e aceitará a mais conveniente para a celebração de contrato.”

Assim, o procedimento licitatório nada mais é que a “ponte” que estabelece a ligação entre o Poder Público e o particular, na seara das contratações públicas, consolidada com a feitura do contrato.

A Administração publica edital demonstrando seu interesse em contratar e explicitando as regras da concorrência. Todos aqueles que desejam firmar a avença, apresentam suas propostas que serão julgadas por critérios objetivamente delineados no instrumento convocatório. Ao final, o autor proposta mais vantajosa (seja pelo preço, seja pela técnica ou ambos combinados) será contratado.

O procedimento retro citado é regulamentado basicamente pelas Leis 8.666/93 (Lei Geral de Licitações e Contratos) e 10.520/2002 (Lei do Pregão).

O parágrafo único do art. 1º da Lei de Licitações dispõe sobre os entes que devem realizar licitação:

“Subordinam-se ao regime desta lei, além dos órgãos da administração direta, os fundos especiais, as autarquias, as fundações públicas, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios.”

Pela inteligência do artigo de lei citado é possível concluir que todos aqueles entes que labutem com a res publica, que gerem recursos públicos devem, obrigatoriamente submeterem-se ao regime de licitações.

Entretanto, essa regra vem ao longo dos tempos sendo cada vez mais relativizada. Como é o caso da Petrobrás, por exemplo. Empresa Pública, mas que não se submete ao regime licitatório na forma da Lei 8.666/93, por exercer atividade em concorrência com os particulares. E o resultado disso já conhecemos bem.

No dia 20/03/2015 o STF publicou notícia acerca de uma decisão que permite ao SENAC a contratação de bens e serviços, sem obediência à Lei de Licitações e Contratos.

O SENAC faz parte dos chamados serviços autônomos, pessoas jurídicas de direito privado, que têm atuação na prestação de serviços de interesse social, entretanto, que utilizam-se de contribuições compulsórias de determinados segmentos da indústria e comércio, ou seja, utilizam-se de recursos públicos.

Data venia, a decisão do Tribunal Excelso não se conforma com as disposições constitucionais atinentes à matéria. Mas esse é assunto para outro post.

Grande abraço a todos!