Ação de Consignação em Pagamento e o novo CPC

Ação de Consignação em Pagamento e o novo CPC

Devedor se negar ou atrasar o pagamento a seu credor é algo bastante comum de se presenciar, sobretudo em meio à crise econômica que envolve o país. Por outro lado, a situação em que o devedor deseja pagar mas o credor se nega a receber já é um pouco menos comum.

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A ação de consignação em pagamento é utilizada justamente nesse segundo caso.

Prevista como procedimento especial no CPC (Código de Processo Civil), a consignação em pagamento tem espaço não só quando o credor imponha obstáculos ao pagamento, mas também nas hipóteses em que há dúvidas acerca de quem realmente é o credor.

Como isso poderia ocorrer na prática? Vamos a um exemplo.

Joaquim vendeu seu carro para José. Pelo contrato ficou estabelecido o dia 20 para o pagamento dos valores. Estabeleceram ainda que José deveria levar o dinheiro à casa de Joaquim e que o atraso acarretaria multa de 10% sobre o valor total da venda.

No dia 20 José foi até a casa de Joaquim realizar o pagamento, mas Joaquim se recusou a receber.

Aqui surge a possibilidade da ação de consignação em pagamento por parte de José. Afinal, o devedor não tem apenas a obrigação de pagar, mas também o direito de pagar.

Imaginem outra situação:

No mesmo caso acima citado, José vai até a casa de Joaquim para realizar o pagamento, mas ao chegar lá é surpreendido com a notícia de que ele havia morrido. Nesse caso, José fica em dúvida quanto a quem ele deve entregar os valores.

Essa é uma outra hipótese de cabimento da ação de consignação em pagamento.

Há, portanto, dois tipos de ação de consignação em pagamento:

– Consignação fundada na recusa em receber (art. 335, I a III do Código Civil)

– Consignação fundada na dúvida sobre a titularidade do crédito (art. 335, IV e V do Código Civil)

Ação de Consignação em Pagamento e o novo CPC

Art. 335. A consignação tem lugar:

I – se o credor não puder, ou, sem justa causa, recusar receber o pagamento, ou dar quitação na devida forma;

II – se o credor não for, nem mandar receber a coisa no lugar, tempo e condição devidos;

III – se o credor for incapaz de receber, for desconhecido, declarado ausente, ou residir em lugar incerto ou de acesso perigoso ou difícil;

IV – se ocorrer dúvida sobre quem deva legitimamente receber o objeto do pagamento;

V – se pender litígio sobre o objeto do pagamento.

Importante destacar que esse rol de hipóteses para a consignação é meramente exemplificativo.

 

O que pode ser consignado?Ação de Consignação em Pagamento e o novo CPC

O art. 334 do Código Civil estabelece que pode ser consignada a “coisa devida”. A legislação, portanto, não veda a consignação de outros bens diferentes de dinheiro.

De igual modo, o art. 539, caput do CPC assim estabelece:

Art. 539.  Nos casos previstos em lei, poderá o devedor ou terceiro requerer, com efeito de pagamento, a consignação da quantia ou da coisa devida.

Deixando evidente, que, via de regra, qualquer bem pode ser objeto de consignação, até mesmo um bem imóvel. Nesse caso é possível, consignar, por exemplo, as chaves da imóvel.

Por óbvio, as obrigações negativas e de fazer não pode ser objeto de consignação.

 

Procedimento Ação de Consignação em Pagamento e o novo CPC

A consignação em pagamento possui rito especial determinado pelo CPC, regulado em seus artigos 539 e seguintes.

O procedimento é diferente para cada espécie de consignação.

Antes de tratar acerca do procedimento judicial, vamos discutir brevemente acerca do procedimento extrajudicial.

 

Consignação Extrajudicial

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A consignação extrajudicial é uma ferramenta interessante ao devedor que pretende desobrigar-se em relação ao credor, pois não há necessidade de propositura de ação judicial, nem mesmo contratação de advogado.

Contudo, não se aplica a todas as espécies de consignação, é necessário o cumprimento de determinados requisitos para sua utilização.

Segundo Neves (2017), os requisitos são os seguintes:

– a prestação deve ser pecuniária

– existência de estabelecimento bancário oficial ou particular na localidade onde se deve fazer o pagamento

– conhecimento do endereço do credor

– credor conhecido, certo, capaz e solvente

Esses requisitos encontram-se implicitamente determinados no art. 539 do CPC. A consignação fundada na dúvida sobre a titularidade do crédito não pode ser objeto de consignação extrajudicial.

Na prática, o devedor, após receber a recusa do credor, encaminha-se até uma agência bancária, preferencialmente oficial, onde efetua o depósito consignado (existem procedimentos próprios nas agências bancárias).

Após o depósito, deverá enviar correspondência ao credor (com aviso de recebimento) cientificando-o dos valores que encontram-se à sua disposição, determinando o prazo de 10 dias para sua manifestação.

Passado o referido prazo sem manifestação por parte do credor, ocorrerá a liberação do devedor, ou seja, a presunção nesse caso, é de que o credor tenha aceitado o pagamento. Os valores ficarão depositados no estabelecimento bancário à sua disposição.

Por outro lado, havendo recusa por parte do credor, manifestada por escrito ao estabelecimento bancário, poderá ser proposta, dentro de 1 (um) mês, a ação de consignação, instruindo-se a inicial com a prova do depósito e da recusa.

Não proposta a ação nesse prazo, ficará sem efeito o depósito, podendo levantá-lo o depositante.

 

É possível ingressar com a ação de consignação mesmo ultrapassado esse prazo de 30 dias?

Sim. A propositura da ação dentro do prazo de 30 dias faz com que o devedor não responda pela mora, ou seja, eventuais juros e multa pelo atraso não se aplicarão. Noutro rumo, caso ingresse com a ação após os 30 dias deverá consignar o valor do principal mais juros, correção e multa, se for o caso.

 

Ação de Consignação fundada na recusa em receber

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A ação de consignação em pagamento fundada na recusa em receber deve ser proposta por quem tenha interesse no pagamento e, consequentemente, na desoneração do devedor.

*continua na próxima página…

Via de regra, o próprio devedor é o legitimado ativo para a ação, porém, o Código Civil estabelece em seus arts. 304  a 307 que até mesmo terceiro não interessado pode realizar pagamento em nome do devedor e, portanto, poderia ingressar com a referida ação.

A competência é do foro do lugar do pagamento, conforme regra disposta no art. 540 do CPC. Como o critério adotado nesse caso é o valorativo, estamos diante de competência relativa, podendo ser derrogada.

A petição inicial…

Deve observar os requisitos gerais previstos nos arts. 319 e 320 do CPC sendo que o autor deverá requerer ainda:

– O depósito da quantia ou da coisa devida, a ser efetivado no prazo de 5 (cinco) dias contados do deferimento.

Não efetuado o depósito nesse prazo, o processo será extinto sem resolução de mérito.

Caso o autor já tenha realizado o depósito na forma estabelecida para a consignação extrajudicial não deverá realizar esse pedido, mas apenas juntar prova do depósito e da recusa.

– A citação do réu para levantar o depósito ou oferecer contestação.

O art. 543 do CPC possui observação importante:

Se o objeto da prestação for coisa indeterminada e a escolha couber ao credor, será este citado para exercer o direito dentro de 5 (cinco) dias, se outro prazo não constar de lei ou do contrato, ou para aceitar que o devedor a faça, devendo o juiz, ao despachar a petição inicial, fixar lugar, dia e hora em que se fará a entrega, sob pena de depósito.

 

Feita a citação…

O réu poderá receber e dar quitação, hipótese em que o juiz declarará extinta a obrigação e o condenará ao pagamento de custas e honorários advocatícios, uma vez que deu causa ao ajuizamento da ação.

Havendo contestação, as matérias alegáveis pelo réu estão dispostas no art. 544 do CPC, são elas:

– Não houve recusa ou mora em receber a quantia ou a coisa devida;

– Foi justa a recusa;

– O depósito não se efetuou no prazo ou no lugar do pagamento;

– O depósito não é integral.

Esse rol não é taxativo. O réu pode alegar as matérias preliminares enumeradas no art. 337, do CPC. E, no mérito, qualquer fato extintivo, modificativo ou impeditivo do direito do autor. (Gonçalves, 2017, p. 798).

 

A reconvenção é possível nesse procedimento especial, porém, em algumas situações é dispensável, já que, em alguns casos, é possível ao réu obter na contestação pura o mesmo proveito que obteria na reconvenção.

Explico melhor: Caso o réu alegue na contestação que o depósito não foi integral, ele deverá apresentar qual o valor correto discriminando o cálculo. Nessa hipótese, cabe ao autor da consignatória aceitar a alegação do réu e proceder à complementação da depósito no prazo de 10 dias, salvo se corresponder a prestação cujo inadimplemento acarrete a rescisão do contrato. (neste caso, o processo será extinto pois a obrigação foi satisfeita).

Havendo alegação de insuficiência do depósito, poderá o réu levantar, desde logo, a quantia ou a coisa depositada, com a consequente liberação parcial do autor, prosseguindo o processo quanto à parcela controvertida. (art. 545, §1º do CPC)

Noutro lado, o autor poderá não concordar com as alegações do réu, assim o processo terá o seu curso normal. Na sentença, o juiz poderá reconhecer a insuficiência do depósito e determinar o montante a ser complementado.

Dessa forma, uma possível reconvenção visando a cobrança dos valores que não foram depositados se torna inócua, já que tal objetivo poderá ser obtido no regular caminhar do processo. É o que a doutrina denomina de caráter dúplice.

 

Obs: Nos casos em que o autor concorda com a complementação do depósito e o realiza no prazo estabelecido no art. 545 do CPC, o juiz julgará procedente a consignação, mas condenará o autor aos ônus da sucumbência. Afinal, foi ele quem deu causa ao processo.

Interessante esse exemplo, pois é um dos raros casos em que o autor que sagrou-se vencedor do processo deverá suportar o ônus da sucumbência.

 

Uma vez contestada…

A ação segue o procedimento comum, com observância dos detalhes estabelecidos nos arts. 347 e ss do CPC. (Theodoro Júnior, 2016, p. 84).

 

Sentença…

Via de regra, a sentença terá natureza declaratória para extinção da obrigação. Contudo, havendo sentença que reconheça a insuficiência do depósito ela terá também natureza condenatória quanto ao saldo remanescente.

Conforme preceitua o art. 546 do CPC: julgado procedente o pedido, o juiz declarará extinta a obrigação e condenará o réu ao pagamento de custas e honorários advocatícios.

 

 

Ação de Consignação fundada em dúvida quanto à titularidade do crédito

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Quando a causa da ação de consignação repousa na dúvida quanto a quem seria o titular do crédito, o CPC determina um procedimento um pouco diferente daquele visto anteriormente.

Imaginem a situação em que o devedor se dirige até a residência do credor para pagá-lo. Lá chegando descobre que ele faleceu. O falecido deixou 05 herdeiros e todos eles, individualmente, cobram do devedor o pagamento da obrigação.

Este é um exemplo típico em que haverá dúvidas quanto a quem se deve pagar. Pode ser, por exemplo, que os herdeiros não tenham iniciado o procedimento de inventário.

Nessas hipóteses é possível ao devedor ingressar com a consignação para se ver livre da obrigação.

Ação de Consignação em Pagamento e o novo CPC

Na petição inicial…

Conforme o art. 547 do CPC, o autor deverá requerer o depósito e a citação dos possíveis titulares do crédito para provarem o seu direito.

Feito o depósito…

O juiz determinará a citação dos pretensos credores.

A ideia principal dessa consignação é desonerar o devedor que quer pagar mas tem dúvidas quanto ao credor. O procedimento prevê o depósito da quantia e, logo depois, uma fase para averiguação de quem é o real credor.

 

Feita a citação…

O art. 548 prevê 03 hipóteses possíveis:

– Não comparece pretendente algum ao crédito, o depósito se converte em arrecadação de coisas vagas.

– Comparece apenas um, o juiz decide de plano.

Lógico que nesse caso, o credor que comparece deverá comprovar a sua situação, afastando a dúvida quanto “a quem se deve pagar”.

– Comparece mais de um, o juiz declara efetuado o depósito e extinta a obrigação, continuando o processo a correr unicamente entre os presuntivos credores, observado o procedimento comum.

Nesse último caso, inaugura-se uma nova fase processual, agora sem a participação do devedor. Trata-se de disputa exclusivamente realizada entre os possíveis credores para aferição de quem deve legitimamente receber os valores depositados.

Assim, seguirá o procedimento comum.

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Obs: Pode ocorrer que os credores que se apresentem para reclamar o depósito no processo apresentem contestação, por exemplo, alegando insuficiência do depósito. Neste caso, aplica-se as disposições tratadas no item anterior.

Resolvidas essas pendências passa-se a segunda fase de verificação do credor que terá legitimidade para levantar o depósito, utilizando-se do procedimento comum.

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Grande abraço a todos….

 

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